O Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou, na última quarta-feira (6), a mudança na Constituição que permite a contratação de servidores públicos via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), derrubando a estabilidade dos servidores públicos do atual regime jurídico único (RJU).
A alteração foi feita durante a Reforma Administrativa de 1998, no governo de Fernando Henrique Cardoso, que retirou a obrigação do regime jurídico único para os servidores da União, estados, Distrito Federal e municípios. Após contestação apresentada pelos partidos PT, PDT, PCdoB e PSB, em 2000, a mudança foi suspensa em 2007.
Agora, com a validação do STF, a “flexibilização” do regime de contratação dos servidores volta a valer. Com isso, mudam-se as regras para os futuros servidores de todas as áreas que não são carreiras de Estado, e o modelo de contratação passa a ser definido pelos governos federal, estaduais e municipais, devendo passar por alteração nas leis que regem cada categoria.
A decisão do Supremo gerou reação de diversas entidades, que se manifestaram alertando para os riscos dessa mudança. Para Sérgio Ronaldo, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), a medida “é drástica para os serviços públicos no país”.
“Abre portas para que governos, governadores e prefeitos possam contratar [via CLT]. Para nós, o ideal e o óbvio é através do regime jurídico único. Não é possível tratar a mesma situação de forma diferenciada. Isso começa a precarizar condições de trabalho, precarizar remuneração, precarizar direitos. E essa decisão do STF permite essa situação”, diz o dirigente.
Jucélia Vargas, a presidente da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam), destaca que a mudança pode afetar também o concurso público para o funcionalismo, “porque o concurso público serve exatamente para cumprir a exigência dos regimes jurídicos únicos, em que todos os servidores daquele município, daquele estado são contratados. Com essa decisão, se não eram feitos concursos antes, agora serão menos ainda. Vão criar leis de contratação a torto e a direito”.
A decisão do STF atinge a estabilidade do servidor público, “uma das principais garantias do regime jurídico único”, ressalta o Sindicato dos Servidores do Judiciário do Estado de Pernambuco (Sindjud-PE). “É a estabilidade dos servidores, que visa a proteção de influências políticas e de pressões externas. Esse regime permite que possamos cumprir nossas funções de maneira independente, colocando o interesse público acima de interesses particulares. O fim dessa proteção pode levar à politização dos cargos, uma vez que gestores podem optar por substituir servidores de acordo com conveniências pessoais ou políticas, o que, em última análise, compromete a continuidade e a qualidade do serviço público”, afirma.
O Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal (SindEnfermeiro-DF) também emitiu nota repudiando a decisão do STF. “Essa decisão, além de ser um retrocesso histórico, ataca diretamente as bases do serviço público e os direitos dos trabalhadores, especialmente nas áreas essenciais como saúde, educação e segurança, que dependem de um funcionalismo estável, capacitado e comprometido com a população. A abertura para a contratação via CLT cria um ambiente de volatilidade e falta de continuidade nas políticas públicas. O mais grave é que ações como essas fortalecem o discurso neoliberal de Estado Mínimo, que, em última instância, prioriza o lucro sobre os serviços públicos, abrindo caminho para as privatizações de serviços do Estado previstos na Constituição”, afirma a nota.
Na votação, o ministro Gilmar Mendes divergiu da relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, que havia votado pela inconstitucionalidade da mudança. O entendimento de Gilmar Mendes pela validade da mudança acabou prevalecendo, sendo acompanhado pelos ministros Nunes Marques, Flavio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e o presidente Luís Roberto Barroso. Votaram pela inconstitucionalidade, além da relatora, os ministros Edson Fachin e Luiz Fux.