
A deputada federal Caroline de Toni (PL-SC) apresentou, na quinta-feira (05), um projeto de lei para excluir artigos da Lei do Crime Racial, alterada em 2023 para incluir a injúria racial como forma de racismo, para defender o “humorista” Léo Lins e permitir a continuidade do chamado racismo recreativo.
O Projeto de Lei (PL) 2725/2025 prevê a extinção dos artigos 20-A e 20-C da legislação contra o racismo, sendo que o primeiro item determina o acréscimo de um terço nas penas para os crimes praticados em contexto de descontração, diversão ou recreação.
Já o segundo artigo estabelece que o juiz deve considerar discriminatória qualquer atitude ou tratamento dirigido a uma pessoa ou grupo minoritário que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida. O texto destaca que tal conduta não seria usualmente dirigida a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.
A deputada catarinense, além de propor a revogação dos dois dispositivos, sugere a anistia de pessoas já condenadas ou processadas com base nesses artigos da Lei Antirracismo. Esse é o caso de Léo Lins, citado inclusive na justificativa do projeto como exemplo para a necessidade da medida.
“A utilização da Lei nº 7.716 para punir manifestações humorísticas representa uma perigosa ampliação de sua finalidade original, podendo transformar o Estado em agente censor da arte e do pensamento crítico. O humor, por natureza, explora o absurdo, o exagero e o desconforto”, defende a parlamentar no projeto.
O racismo é apontado por diversos autores, como Clóvis Moura ou Kabengele Munanga, como uma ideologia da classe dominante como “justificativa” e naturalizada da exploração das pessoas negras. O conceito de Racismo Recreativo apresenta-se como uma derivação, uma expressão dessa ideologia.
O professor Adilson Moreira, em livro nomeado exatamente por “Racismo Recreativo”, expõe esta expressão do racismo como uma manifestação disfarçada de humor, piadas ou brincadeiras que perpetuam preconceitos e estereótipos raciais. O objetivo não é provocar o riso, ou chamar a atenção para o problema em forma de denúncia, mas a perpetuação da desigualdade racial e a inferiorização de grupos minoritários, principalmente pessoas negras, utilizadas para justificar diversas hierarquias sociais.
“O humor não é mero produto de ideias que surgem espontaneamente nas cabeças das pessoas. As piadas que elas contam são produtos culturais, são manifestações de sentidos culturais que existem em dada sociedade. Por esse motivo, o humor não pode ser reduzido a algo independente do contexto social no qual existe”, diz o professor no livro.
REAÇÃO
O ator Pedro Cardoso, conhecido por ser o Agostinho, do clássico humorístico “A Grande Família”, defendeu a punição ao criminoso. “Eu tenho dito, faz muito tempo, que o tipo de teatro a que chamam ‘stand-up’ se tornou um ninho no Brasil onde se desenvolveu o ovo da serpente do fascismo”, disse.
“Comediantes com mensagens fascistas valeram-se do ‘stand-up’ e disfarçaram de entretenimento teatral cômico o que era discurso político agressivo”, pontuou Pedro Cardoso.
O humorista baiano, Matheus Buente também se posicionou sobre a proposta da deputada de atenuar as punições contra os racistas. “Esse demônio aqui quer pegar a lei de criminalização do racismo e flexibilizar para que os comediantes tenham mais liberdade de expressão”, disparou, indignado com o que chamou de “corporativismo mascarado”, disse em vídeo nas redes sociais.
O humorista ainda destacou a importância da lei e seus “valores inegociáveis, proteção a grupos historicamente prejudicados… para outras pessoas, inegociáveis são seus privilégios”, acrescentou.
Em entrevista ao Marcelo Tass, o humorista João Pimenta disse que, ao ser perguntado, afirma que se pode falar de tudo, mas não de qualquer forma e sempre arcando com as consequências de sua fala. “Dá para se falar sobre tudo e sobre todo mundo, mas a forma como você vai falar você tem que arcar com as consequências”, disse.
“Maluco o tempo todo privilegiado para caralho, as vezes cresceu num ambiente que tinha dinheiro, numa família boa, com uma pele que é nitidamente aceita pela indústria, aí o cara faz uma piada e tem pela primeira vez seu preconceito, seu privilégio questionado. A gente lida com isso desde que nasce, irmão. Então vai chorar na cama que é um lugar quente”, completou.
A decisão contra Léo Lins, proferida pela Justiça Federal, inclui o pagamento de multa de 1.170 salários mínimos e uma indenização de R$303,6 mil por danos morais coletivos. O processo teve origem em um vídeo do comediante publicado no YouTube, no qual ele faz piadas consideradas discriminatórias.