O embaixador da Palestina no Brasil Ibrahim Al Zeben condenou a abertura de um escritório da Agência Brasileira de Promoção de Comércio e Investimento (Apex) na Jerusalém ocupada.
“Abrir o escritório é uma provocação premeditada que contradiz o discurso oficial que anuncia a parceria com o mundo árabe”, declarou o embaixador, referindo-se ao ato realizado no domingo, em Jerusalém com a presença do deputado Eduardo Bolsonaro.
“É ofensa à Palestina e aos países árabes após várias visitas simultâneas”, acrescentou o embaixador.
Ele referiu-se ainda à declaração de Eduardo de que este seria “um primeiro passo para a transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém”, uma bajulação a Trump que transferiu a embaixada dos Estados Unidos, contrariando as do restante dos países de todo o mundo.
“As declarações sobre Jerusalém, que acompanharam este ato”, declara Al Zeben, “ignoram por completo a legalidade internacional focando o fundo religioso, dando pé a religiolizar o conflito político-territorial colocando a região e o mundo frente a uma guerra religiosa que representa um retrocesso à Idade Média”.
Al Zeben alertou para a fala do filho de Bolsonaro que justificou a transferência dizendo: “…concluo com a frase bíblica ‘quem abençoar Israel será abençoado e quem amaldiçoar será amaldiçoado’”.
“Reduzir o conflito a interpretações religioso-ideológicas só alimenta o fanatismo”, alertou o embaixador.
“Está atitude prejudica a paz almejada e necessária para a região”, concluiu.
EXTREMISMO E TRAIÇÃO AO BRASIL
A Federação Árabe Palestina do Brasil também condenou a abertura do escritório da Apex em Jerusalém: “abrir o escritório, além de imoral, é ato de traição nacional que vergonhosamente alinha o Brasil ao que há de pior no mundo atual em termos de racismo e genocídio”.
Na nota, assinada pelo presidente Ualid Rabah, a Fepal considera a abertura “irresponsável” pois vai “contra o Direito Internacional, notadamente as resoluções da ONU para a Questão Palestina e para Jerusalém em particular, e que em nada contribuirão para a promoção da paz na região, senão o contrário, levando a mais violência e instabilidade”.
A Fepal alerta também que a medida pode trazer graves prejuízos ao Brasil em termos de comércio com os países árabes o que gera superávit ao país, enquanto privilegia relações com o regime israelense com o qual o Brasil acumula déficit.
Hoje o Brasil tem com o conjunto dos países árabes um superávit comercial em torno de US$ 4,87 bilhões ao ano e um déficit com Israel de US$ 763,97 milhões.
Segue a íntegra da nota da Fepal:
Condenamos nos mais enérgicos termos a inauguração, na Jerusalém ocupada, no último dia 15, de um escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), bem como as declarações feitas no ato pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, segundo as quais este seria o “1º passo para a transferência da embaixada [do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém]”.
Além de uma posição imoral, que vergonhosamente alinha o Brasil ao que há de pior no mundo atual em termos de racismo e genocídio, esta medida e a anunciada são passos irresponsáveis, que atentam contra o Direito Internacional, notadamente as resoluções da ONU para a Questão Palestina e para Jerusalém em particular, e que em nada contribuirão para a promoção da paz na região, senão o contrário, levando a mais violência e instabilidade.
As bravatas de Eduardo Bolsonaro, ademais, significam adesão aos criminosos de guerra Benjamin Netanyahu (acusado de uma infinidade de crimes em seu próprio país) e Donald Trump (sofre acusações cujas gravidades levaram à instalação de um processo de impeachment), ambos rejeitados entre seus povos e no mundo e que abertamente defendem as anexações de Jerusalém e de tudo o mais que resta da Palestina ocupada, e que, ainda, conspiram para que outros países os apoiem nestes e noutros crimes contra o povo palestino, inclusive o de limpeza étnica.
Não bastasse isso, o deputado, do alto de sua olímpica ignorância acerca das relações internacionais e das vantagens econômicas daí derivadas aos povos, ameaça prejudicar a economia brasileira e seu povo, visto as possíveis retaliações comerciais que podem vir em caso de concretização de suas ameaças contra o povo palestino.
São conhecidas as advertências dos países da Liga dos Estados Árabes (22, cuja população é de 416 milhões e com PIB conjunto estimado em 2,7 trilhões de dólares – 11,1 trilhões de reais) e dos que integram a Organização para a Cooperação Islâmica (57 países membros, com população estimada de 1,7 bilhão e PIB na casa dos 14 trilhões de dólares, considerada a paridade do poder de compra, ou 57,5 trilhões de reais, e 5 observadores, entre eles Índia e Rússia, países que, somados, têm mais de 1,5 bilhão de habitantes e um PIB de quase 16 trilhões de dólares pela paridade do poder de compra, ou 65 tilhões de reais), no sentido de congelamento das relações comerciais com o Brasil, ou mesmo reduzir as existentes, caso este adote posições que afetem os direitos dos palestinos, incluídos os afetos à cidade de Jerusalém.
Atualmente, o comércio entre Brasil e países árabes é de 17,7 bilhões de dólares no acumulado do ano, com um saldo comercial favorável ao Brasil de 4,87 bilhões de dólares.
Enquanto isso, a balança comercial do Brasil com Israel é infinitamente inferior e, mais, acumula déficit de 763,97 milhões de dólares (exportamos 347,03 milhões de dólares e importamos 1,1 bilhão de dólares), isto é, dá prejuízo ao nosso país.
Ou seja: com esta política externa desastrada, o Brasil troca um superávit de 4,87 bilhões de dólares, e que pode crescer muito ainda, por um déficit de 763,97 milhões de dólares.
Em outras palavras, entre o superáveit de que arrisca perder e o déficit acumulado, o Brasil paga 5,6 bilhões para apoiar Israel em seu genocídio contra o povo palestino, um povo amigo do Brasil. Considerando os dados de 2018 para o comércio com os países islâmicos, o superávit do Brasil é ainda maior: 11,94 bilhões de dólares. Isto só tem uma qualificação possível: traição nacional, visto que a política exterior em vigor beneficia outro país em detrimento do Brasil.
Quer dizer: além de mergulhar o Brasil no pântano dos crimes de lesa humanidade de Israel (que testa armas, munições e sistemas de vigilância sobre a população civil palestina que vive a ocupação), a visão míope e desastrada de Eduardo Bolsonaro e do atual regime governante no Brasil podem trazer grandes prejuízos econômicos ao país, com consequentes fechamentos de empresas e desemprego. E tudo isso a troco de nada, senão de apoiar um regime condenado pelo mundo, somente salvo por um único veto no Conselho de Segurança da ONU, o dos EUA.
Diante disso, conclamamos ao governo que retorne sua política exterior ao equilíbrio que sempre a pautou, de acatamento ao Direito Internacional e de respeito aos povos, o palestino incluído.
Nada mais pedimos que uma posição brasileira de amizade para com todos os povos, condição que permitirá ao Brasil, inclusive, a privilegiada posição de mediador confiável entre Palestina e Israel com vistas a alcançar-se um acordo de paz justo e definitivo.
Palestina Livre a partir do Brasil, 17 de dezembro de 2019.
Assina UALID RABAH, presidente da FEPAL