No último pronunciamento do ano na TV, Bolsonaro fez questão de fazer o que é de sua praxe: fake news e mentiras
As mentiras de Bolsonaro em discurso transmitido em cadeia nacional de Rádio e TV nesta noite de sexta-feira, 31 de dezembro, foram recebidas com panelaços em diversas cidades brasileiras.
Moradores de São Paulo fizeram um panelaço contra Jair Bolsonaro (PL) na noite desta sexta–feira (31), véspera de Ano Novo, durante pronunciamento em rede nacional de rádio e TV.
O panelaço foi registrado em bairros como República, no Centro, Moema, na Zona Oeste, e Jardim Iris, na Zona Norte da cidade.
No Rio de Janeiro também foi possível ouvir as manifestações.
Belo Horizonte registrou panelaços na noite desta sexta-feira (31/12), quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) realizou o último pronunciamento do ano em rede nacional. Houve registro de protestos em bairros diversos da cidade. Nos bairros Serra e Santo Antônio, na Centro-Sul, moradores batiam panelas e gritavam “genocida”.
Em Brasília, moradores foram às janelas, no Plano Piloto, Sudoeste, Guará e outras regiões administrativas, para apoiar e protestar contra o presidente.
Veja imagens do panelaço desta noite de Ano Novo:
FAKE NEWS
No último pronunciamento do ano na TV, Bolsonaro fez questão de fazer o que é de sua praxe: fake news e mentiras.
Em um momento de crise e com a popularidade lá embaixo, a economia estagnada e fortemente criticado pela condução desastrosa de uma pandemia que já matou quase 620 mil brasileiros, Bolsonaro criou uma narrativa, pintando a situação crítica do país em cores rosas.
Repetiu a mentira de que os governadores e prefeitos foram responsáveis pelas dificuldades econômicas ao tomarem medidas para defender a saúde da população. Quando foi pela ação dos governadores, prefeitos, STF e Congresso que uma tragédia maior não aconteceu, como queria Bolsonaro: contaminar mais gente e mais mortes na pandemia.
Exaltou as vacinas como se não tivesse sido ele quem boicotou e tentou atrasar a vacinação o tempo todo, como agora não quer a vacinação das crianças de 5 a 11 anos autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e recomendada pelos especialistas.
“Encerramos o ano de 2021 com 380 milhões de doses de vacinas distribuídas à população”, disse, escamoteando o fato de que se fosse por ele até hoje não haveria vacinados no país.
Comemorou a conclusão das obras do São Francisco como se fosse uma obra da sua gestão.
Muito criticado por estar na praia numa grande farra, pescando, dançando funk, passeando de jet ski, visitando parques, etc., enquanto crescem as vítimas das cidades alagadas da Bahia e de Minas, ele citou, claro, de longe: “Lembro agora dos nossos irmãos da Bahia e do norte de Minas Gerais, que nesse momento estão sofrendo os efeitos de fortes chuvas na região”. Mas lá na região não quer pisar por enquanto. “Espero não ter que voltar antes” a Brasília, disse a apoiadores esta semana.
Aliás, disse que são “mais de 70 municípios atingidos” na região. É falso. Até quarta-feira (29) eram 260 cidades de Minas e Bahia em situação de emergência. Só na Bahia eram 136 cidades.
Não é à toa que a hashtag #BolsonaroVagabundo ganhou força nas redes sociais e se tornou o assunto do momento no Twitter.
Ele ignorou a miséria da população, atrás de ossos, pés de galinha e catando restos de comida no lixo.
A informalidade atingiu 38,2 milhões de brasileiros e renda dos brasileiros desabou 11,1% no trimestre encerrado em outubro.
Os dados são da pesquisa PNAD Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados na terça-feira (28). Mas Bolsonaro disse que está tudo às mil maravilhas e que seu governo tem “identidade com os mais humildes”.
CORRUPÇÃO
No começo da semana, Bolsonaro declarou que seus opositores deveriam promover panelaço para comemorar “3 anos sem corrupção”. No “pronunciamento” repetiu que “completamos três anos de governo sem corrupção”.
No entanto, nada mais falso. Seu terceiro ano de mandato de Bolsonaro foi marcado por uma série de crises, envolvendo denúncias de corrupção e polêmicas como ataques ao Supremo Tribunal Federal e à democracia, além de uma CPI para investigar as ações e omissões do governo na pandemia.
Ele que já era investigado no Supremo por tentativa de interferência na Polícia Federal, se tornou alvo de cinco novos inquéritos no STF e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Um escândalo envolvendo a compra de vacinas revelado pela CPI da Covid envolveu diretamente Jair Bolsonaro, que, avisado de possíveis irregularidades com a compra da Covaxin, imunizante contra a Covid-19 fabricado na Índia, escondeu as denúncias e não tomou providências, sendo acusado de prevaricação.
O contrato para a compra da vacina – produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech – foi no valor total de R$ 1,6 bilhão, para o fornecimento de 20 milhões de doses.
Graças às investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito, que Bolsonaro tentou impedir sua instalação, as denúncias de ilegalidades vieram a público e o governo acabou sendo forçado a suspender o contrato.
Em depoimento à CPI, o servidor do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda, denunciou que foi pressionado pela cúpula do ministério a liberar um adiantamento irregular de US$ 45 milhões para a Precisa Medicamentos – empresa que intermediava as negociações – a serem depositados numa empresa situada num paraíso fiscal. O que não estava previsto no contrato.
O funcionário de carreira do ministério e seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), chegaram a denunciar o caso em audiência com o presidente da República, que se comprometeu a levar as denúncias para que a Polícia Federal investigasse.
Bolsonaro nunca encaminhou a denúncia à PF para investigar e abafou o caso. Foi pela ação da CPI e do Ministério Público Federal que o pagamento à Precisa não se concretizou.
O Tribunal de Contas da União (TCU) também verificou que a Covaxin foi a vacina mais cara negociada pelo governo federal: R$ 80,70 a unidade, valor quatro vezes maior que a vacina desenvolvida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a AstraZeneca.
A corrupção envolvendo a gestão da pandemia também teve outros exemplos dentro do governo, como no caso da tentativa de suborno da empresa Davati Medical Supply na venda de vacinas.
RACHADINHA
A trajetória política dos integrantes do clã Bolsonaro está associada ainda ao caso da “rachadinha”, prática criminosa que consiste no repasse, por parte de um servidor público ou prestador de serviços da administração, de parte de sua remuneração a políticos e assessores.
O filho do presidente, Flávio Bolsonaro, foi apontado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro como chefe de uma organização criminosa que atuou em seu gabinete no período em que foi deputado da Assembleia Legislativa do estado (Alerj). Entre 2003 e 2018, ele cumpriu quatro mandatos parlamentares consecutivos.
A estimativa é que cerca de R$ 2,3 milhões tenham sido movimentados em um esquema de “rachadinha”, no qual funcionários do então deputado devolviam parte do salário que recebiam na Alerj. O dinheiro, segundo a investigação, era lavado com aplicação em uma loja de chocolates no Rio da qual o senador é sócio e em imóveis.
Em dezembro de 2019, a loja foi alvo de busca e apreensão na investigação sobre essas movimentações suspeitas por parte de ex-assessores, dentre eles o ex-policial militar Fabrício Queiroz – pessoa da intimidade da família Bolsonaro.
Fabrício Queiroz, que trabalhou como assessor de Flávio Bolsonaro, é apontado pelo MP como operador do esquema. Ele empregava funcionários fantasmas e exigia parte do salário (ou mesmo a integralidade dele) de volta.
A investigação envolvendo o filho do presidente começou após o então Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras, hoje UIF, ou Unidade de Inteligência Financeira), órgão que atua na prevenção e combate à lavagem de dinheiro, identificar diversas transações suspeitas feitas por Queiroz no período em que atuou como assessor de Flávio.
Bolsonaro também usou o governo para blindar Flávio, promovendo o desmonte da estrutura dos órgãos de controle, como o próprio Coaf e a Receita Federal, com o intuito de impedir o avanço das investigações, além de fazer pressões políticas em diversas frentes e não se empenhar na aprovação de projetos de enfrentamento à criminalidade.
Jair Bolsonaro também contrariou orientações das autoridades internacionais de saúde: promoveu e participou de aglomerações, criticou o uso de máscara e recomendou remédios cuja ineficácia contra a doença já foi comprovada.