A decisão da procuradora de Justiça do Rio, Soraya Taveira Gaya, de dar parecer pelo foro privilegiado a Flávio Bolsonaro (PSL) e, com isso, transferir a investigação de seus crimes para o Tribunal de Justiça do Rio, revoltou os promotores do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MPRJ) que investigam o caso Queiroz.
Eles não querem que o caso saia da primeira instância. Caberá agora à 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) decidir sobre a questão.
Flávio Bolsonaro alegou que o juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau, da 27ª Vara Criminal, não tem competência para julgar o caso, já que o parlamentar teria direito a foro especial. De acordo com os promotores, ele não tem direito a foro por prerrogativa de função.
“Nem mesmo a peculiaridade de exercícios consecutivos de mandatos eletivos em cargos diversos seria capaz de repristinar a Súmula nº 394 do STF, pois a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça recentemente julgou caso similar, no qual o réu alternou os cargos de Governador e Deputado Federal”, dizem os procuradores.
Foi firmado o entendimento de que, independentemente do novo mandato, pela nova interpretação do STF, a competência passa a ser do Primeiro Grau de Jurisdição, pois “como o foro por prerrogativa de função exige contemporaneidade e pertinência temática entre os fatos em apuração e o exercício da função pública, o término de um determinado mandato acarreta, por si só, a cessação do foro por prerrogativa de função em relação ao ato praticado nesse intervalo” (Questão de Ordem na Ação Penal nº 874, DJ 15/05/2019)’.
Segundo os promotores, ‘no ano de 1999, foi abolida do direito brasileiro a perpetuação do foro por prerrogativa de função após o término do mandato eleitoral’. “Portanto, há pelo menos duas décadas os Deputados Estaduais não são mais julgados originariamente pelos Tribunais de Justiça depois de cessado o exercício da função”. Em suma, como Flávio Bolsonaro não é mais deputado estadual, não pode ter seus crimes conduzidos pelo TJ-RJ.
No dia 3 de maio de 2018 o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que o chamado “foro privilegiado” “aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”.
O parecer da procuradora, que atua na segunda instância, e não faz parte das investigações originárias do caso, é favorável a um pedido de habeas corpus do senador, filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), para que ele seja julgado no TJ e não na primeira instância.
Leia a nota na íntegra:
NOTA DE ESCLARECIMENTO DO GAECC/MPRJ – CASO COAF
O Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MPRJ) se manifestou no sentido de manter a competência da Justiça Estadual do Rio de Janeiro em primeiro grau para o eventual processamento e julgamento do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) no que diz respeito às investigações acerca do Relatório de Informações Financeiras do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
O posicionamento do GAECC/MPRJ fundamenta-se no fato de que, desde o cancelamento da Súmula nº 394 pelo STF, no ano de 1999, foi abolida do direito brasileiro a perpetuação do foro por prerrogativa de função após o término do mandato eleitoral. Portanto, há pelo menos duas décadas os Deputados Estaduais não são mais julgados originariamente pelos Tribunais de Justiça depois de cessado o exercício da função. Pelo processo de mutação constitucional, a interpretação dada por nossas Cortes Superiores para o chamado “foro privilegiado” tornou-se cada vez mais restrita, até que no dia 03 de maio de 2018 o Plenário do STF definiu que “aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”, com exceção dos casos nos quais “após o final da instrução processual” a competência é prorrogada para evitar manobras procrastinatórias que impeçam de proferir sentença o Tribunal que já conheceu as provas (Questão de Ordem na Ação Penal nº 937, DJ 03/05/2018).
Conforme também recentemente publicado, ao negar seguimento à Reclamação Constitucional nº 32.989/RJ proposta pelo próprio FLÁVIO NANTES BOLSONARO, o Ministro Marco Aurélio do STF assentou que “o fato de alcançar-se mandato diverso daquele no curso do qual supostamente praticado o delito não enseja o chamado elevador processual”.
Nem mesmo a peculiaridade de exercícios consecutivos de mandatos eletivos em cargos diversos seria capaz de repristinar a Súmula nº 394 do STF, pois a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça recentemente julgou caso similar, no qual o réu alternou os cargos de Governador e Deputado Federal, firmando o entendimento de que, independentemente do novo mandato, pela nova interpretação do STF a competência passa a ser do Primeiro Grau de Jurisdição, pois “como o foro por prerrogativa de função exige contemporaneidade e pertinência temática entre os fatos em apuração e o exercício da função pública, o término de um determinado mandato acarreta, por si só, a cessação do foro por prerrogativa de função em relação ao ato praticado nesse intervalo” (Questão de Ordem na Ação Penal nº 874, DJ 15/05/2019).
Contudo, em resposta ao habeas corpus impetrado pela defesa do senador, a procuradora de Justiça Soraya Taveira Gaya, no exercício de sua independência funcional e atuando em segunda instância, deu parecer favorável para que o senador tenha foro especial nas apurações do caso. Caberá agora à 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio decidir sobre a questão.