“O fogo ateado por interesses que destroem, como o que devastou recentemente a Amazônia, não é o do Evangelho. O fogo de Deus é calor que atrai e congrega em unidade. Alimenta-se com a partilha, não com os lucros”, afirmou o papa Francisco na abertura da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica, na manhã do domingo, dia 6, na Basílica de São Pedro, no Vaticano.
Na presença de uma multidão de fiéis, índios da Região Amazônica, que está presente em cinco países da América do Sul e os 185 padres sinodais, 58 do Brasil, o papa denunciou que “muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas”.
Ele também destacou que, diante da devastação, não é possível a passividade e conclamou a todos a reacenderem “o dom no fogo do Espírito”, que “é o oposto de deixar as coisas correr sem se fazer nada”.
O evento intitulado “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral” transcorrerá até o dia 27 deste mês.
CONTRA OS NOVOS COLONIALISMOS
Papa Francisco lembrou que “o fogo de Deus, como no episódio da sarça ardente, arde, mas não consome. É fogo de amor que ilumina, aquece e dá vida; não fogo que alastra e devora”.
“Quando sem amor nem respeito se devoram povos e culturas”, acrescentou, “não é o fogo de Deus. Quantas vezes o dom de Deus foi, não oferecido, mas imposto! Quantas vezes houve colonização em vez de evangelização! Deus nos preserve da ganância dos novos colonialismos”.
A ideia dos “novos colonialismos” a que o papa se referiu, nos remete ao termo neocolonialismo, citado na Conferência de Bandung (Indonésia), de 1955, que deu origem ao Movimento dos Não Alinhados, onde diversos líderes da África e Ásia, cujos países haviam se libertado do jugo colonial – entre eles Sukarno, da Indonésia, Kkruma, de Gana e Nehru, da Índia -, alertaram para uma nova forma de dominação e rapina das riquezas nacionais que seria comandada pela intervenção norte-americana nos países recém libertos. Nesta fase, que Nkruma chamou de “Neocolonialismo, último estágio do Imperialismo”, a dominação, muitas vezes, ao invés de se dar por ocupação com tropas, se faria e se faz através de uma dominação mediada por regimes títeres de dirigentes corrompidos e submissos aos ditames de Washington e países centrais da Europa.
Convidando a “olhar juntos para Jesus Crucificado, para o seu coração aberto por nós”, o papa concluiu: “Muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam pela consolação libertadora do Evangelho, pela carícia de amor da Igreja. Por eles, com eles, caminhemos juntos”.
Aqui no Brasil, onde Bolsonaro negou a ocorrência das vastas queimadas e sua ampliação após sua posse na Presidência, atribuindo as denúncias documentadas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, INPE, a “ONGS estrangeiras”, a preparação para o Sínodo não se deu sem tensões ou atropelos.
PRESSÃO BOLSONARISTA SOBRE A IGREJA
O bispo de Marajó (PA), Dom Evaristo Pascoal Spengler, apresentou duras críticas à espionagem, via Agência Brasileira de Informação (Abin), sobre as atividades da Igreja Católica relacionadas ao Sínodo da Amazônia. “Isso é um retrocesso que só vimos na ditadura militar”, disse o bispo.
Tanto assim, que no dia 30 de setembro lideranças de diferentes religiões e doutrinas se reuniram na Catedral da Sé, em São Paulo, e declararam solidariedade ao encontro do Sínodo. O evento foi organizado pela Frente Inter-Religiosa Dom Paulo Evaristo Arns, composta por integrantes de 12 religiões e doutrinas. O evento contou com a participação do brasileiro Dom Claudio Hummes., relator do encontro internacional entre bispos e o papa.
No evento além de Dom Claudio, que afirmou: “Juntos vamos pensar as grandes causas da humanidade. O Sínodo não é fechado, não é exclusivo, ele é inclusivo. A crise amazônica é grave. Vivemos uma grande crise socioambiental”, outros líderes denunciaram a devastação.
O sheikh Al Bukai, da União Nacional das Entidades Islâmicas, afirmou que “a reunião trata de um suicídio coletivo que o ser humano comete contra a natureza. Eu quero desejar que o Sínodo da Amazônia seja uma luz que ilumine os corações dos governantes”.
O rabino Alexandre Leone reforçou que o encontro no Vaticano seja bem-sucedido. “Neste momento urgente e crucial de tomada de consciência da devastação da natureza da Amazônia e de tantos outros lugares do planeta, a Igreja Católica, o papa Francisco chama o Sínodo para refletir sobre a situação e propor novos caminhos”.
“Nossos orixás estão na natureza, na água, no ar, na terra. Eu peço a manutenção da natureza. Os povos originários são assassinados todos os dias, como a natureza. Que esse Sínodo permita que todos nós mudemos a nossa história”, disse a sacerdotisa do Candomblé, Adriana de Nanã.
Segundo o pastor Ariovaldo Ramos, o Sínodo da Amazônia pode contribuir para um caminho diante da crise ambiental instalada. “Quando o Criador colocou o homem no planeta, nos deu a tarefa de governar o planeta. Falhamos, mas há sempre esperança, o Sínodo é a esperança. Que tenha sucesso”.