
O ministro da Economia Bruno Le Maire afirmou: “não aceitaremos sanções extraterritoriais” como as que os Estados Unidos tentam impor ao Irã e ao mundo
Diante das reiteradas ameaças do governo Trump de que as suas novas sanções contra o Irã têm de ser obedecidas também pelas empresas europeias ou serão punidas, a questão tomou conta do noticiário no Velho Continente, com o ministro da Economia da França, Bruno Le Maire, assinalando que “a resposta à decisão americana sobre o Irã é clara: a soberania econômica europeia”.
À “extraterritorialidade” das leis americanas, se soma a imposição de sobretaxas sobre as exportações de aço e alumínio europeias. Em entrevista à Europa-1, Le Maire afirmou que a União Europeia não pode agir como “vassalo dos EUA” no caso do Acordo Internacional Nuclear com o Irã – rompido unilateralmente por Washington. Ele também repudiou que os EUA sejam “o gendarme econômico do mundo”.
“Nós aceitamos sanções extraterritoriais? A resposta é não”. O ministro da Economia francês continuou: “nós aceitamos que os Estados Unidos são o gendarme econômico do planeta? A resposta é não”. Finalmente: “nós aceitamos a vassalização da Europa em assuntos comerciais? A resposta é não”.
Trump havia anunciado “o mais alto nível de sanções” contra o Irã, ao romper e violar o tratado assinado por todos os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, e cujo cumprimento vem sendo atestado pela Agência Internacional de Energia Atômica, sob o mais rígido regime de inspeção já aplicado a um país. Em troca, o Acordo assegura ao Irã o fim das sanções enquanto o tratado for cumprido.
“É urgente passar das palavras para os atos”, afirmou o ministro francês, sobre o enfrentamento da ilegal extraterritorialidade de sanções e leis norte-americanas. Também o chanceler francês Jean-Yves Le Drien denunciou como “inaceitável” a “extraterritorialidade das sanções americanas”. Ele acrescentou que os europeus “não deveriam ter de pagar” pela saída dos EUA de um acordo “para o qual eles mesmos contribuíram”.
O porta-voz do Palácio Elisee, Benjamin Griveaux, já havia dito que a UE estava pronta “a desafiar na Organização Mundial do Comércio” a qualquer medida unilateral [dos EUA] que prejudicasse os interesses das companhias europeias e que “responderia de forma proporcional, de acordo com as regras da organização internacional”.
A discussão também chegou a outros países europeus. Na Alemanha, a capa da revista Der Spiegel apresenta um dedo médio [com o topete de Trump pintado nele] sendo exibido, e os dizeres: “Adeus, Europa”. A primeira-ministra Ângela Merkel, ao mesmo tempo em que diz que se deve “preservar a aliança transatlântica”, assevera também que a Europa “deve tomar seu destino nas próprias mãos” e não depender da “proteção americana”.
A italiana Federica Mogherini, chefe da diplomacia europeia, declarou que a União Europeia está determinada “a agir de acordo com seus interesses de segurança e a proteger seus investimentos econômicos”. Se prevalecerem as sanções de Trump, a Europa perderá bilhões em exportações e investimentos no Irã, com a Airbus, que tem um contrato de 10 bilhões de euros para fornecer aeronaves civis, entre as maiores perdedoras, assim como a petroleira Total (5 bilhões para projetos de gás no campo de South Parks). Perdas análogas esperam a Alemanha, a Grã Bretanha e a Itália, principalmente.
Nesta terça-feira, o chanceler iraniano Mohamad Javad Zarif está em Bruxelas, em seguida a viagem a Moscou e Pequim, em busca de preservar o Acordo Nuclear, o que pressupõe que os contratos assinados com o Irã sejam respeitados e continue sendo negociado o petróleo iraniano com os europeus (entre 2011 e 2016, Washington proibiu a UE de comprar petróleo iraniano). Em telefonema ao presidente iraniano Hassan Rouhani, a primeira-ministra inglesa, Theresa Blair, saudou a disposição do Irã de manter o Acordo. Ela, o presidente francês Macron e Merkel haviam afirmado, em declaração conjunta, que continuavam no Acordo, enquanto o Irã o cumprir.
Como lembrou a chanceler Mogherini, “o levantamento das sanções é uma parte essencial do acordo”. Assim, tem que ser encontrada uma solução para a preservação da parte econômica do Acordo com o Irã, o que pressupõe encarar, pelo lado europeu, a “extraterritorialidade das sanções”. Para o ministro Le Maine, é urgente que a Europa discuta a adoção de ferramentas financeiras “que a tornem independente dos EUA”.
Para começar, deveria ser ampliado e intensificado o mecanismo europeu, criado nos anos 1990, para contornar a lei extraterritorial anti-Cuba, a Helms-Burton, e que viabilizou manter negócios com a Ilha. Também deveria ser criado um novo organismo europeu com poder de sancionar empresas estrangeiras por práticas comerciais, como os EUA já fazem.
Le Maire sugeriu, ainda, uma linha de crédito em euros à disposição das empresas que comercializam com o Irã, para evitar processos sob a cínica alegação de Washington de que, como usou o dólar, seria “violação” das suas sanções.
Há ainda o confronto sobre as sobretaxas nas exportações europeias de aço e alumínio, classificadas por um alto assessor de Macron, ouvido pela Reuters, como “uma arma apontada para a nossa cabeça”. Ele pediu que as empresas europeias sejam isentadas das sobretaxas e das sanções. Cúpula europeia informal nesta quarta e quinta-feira em Sofia, Bulgária, irá decidir sobre a questão. “Não há sinal de divisão entre os europeus. Tudo indica que a posição europeia será firme e unificada”, asseverou.
ANTÔNIO PIMENTA