“Subestimamos os efeitos nocivos e devastadores sobre o que isso [bets e cassinos] causa à população brasileira”, disse a presidente do PT e também deputada federal. STF vai realizar audiência pública
A deputada Gleisi Hoffmann (PR), presidente nacional do PT, disse que o governo federal precisa fazer uma “avaliação crítica” dos resultados da regulamentação das bets e cassinos onlines e disse que os “efeitos nocivos e devastadores” das apostas sobre os brasileiros foram “subestimados”.
Liberadas no governo Michel Temer, as chamadas bets foram regulamentadas pelo governo Lula, por iniciativa do Ministério da Fazenda, de Fernando Haddad.
“Subestimamos os efeitos nocivos e devastadores sobre o que isso causa à população brasileira. É como se a gente tivesse aberto as portas do inferno, não tínhamos noção do que isso poderia causar”, disse Gleisi.
“Principalmente essa ação muito ofensiva das casas de jogos e o uso de publicidade extrema”, explicou.
“Precisamos fazer alguma coisa neste ano, temos que ter noção do que causamos, a nossa responsabilidade, e o que pode ser feito”
A regulamentação feita estabeleceu que as publicidades devem ter somente uma restrição de idade, o que com a internet e contratação de “influenciadores”, não é obstáculo nenhum.
“Precisamos fazer alguma coisa neste ano, temos que ter noção do que causamos, a nossa responsabilidade, e o que pode ser feito. Isso também é responsabilidade do Congresso”, avalia a dirigente do PT.
Gleisi Hoffmann apresentou uma proposta para vetar “ações de comunicação, de publicidade e de marketing” de cassinos online.
Segundo o Banco Central, somente no mês de agosto de 2024, 24 milhões de brasileiros gastaram R$ 20,8 bilhões com as casas de apostas. Esse cálculo abrange somente as transferências que foram feitas via PIX.
O estudo feito pelo BC mostra que beneficiários do Bolsa Família colocaram R$ 3 bilhões via PIX em sites de apostas, revelando como esse tipo de atividade atinge também as famílias mais necessitadas.
Já a Confederação Nacional do Comércio (CNC) mostra que 1,3 milhão de brasileiros entraram na inadimplência no primeiro semestre de 2024 por conta dos cassinos online. Um relatório da XP Investimentos estima que no ano de 2023 R$ 120 bilhões foram gastos com casas de apostas, valor que é próximo de 1% do PIB do país.
A ONG Fiquem Sabendo revelou que as casas de apostas fizeram um poderoso lobby, especialmente no Ministério da Fazenda, para conseguir a regulamentação. Foram feitas 78 reuniões com o governo federal em 2023, sendo que 67 foram com a Fazenda.
O próprio presidente Lula falou, na terça-feira (24), que “estamos percebendo no Brasil o endividamento das pessoas mais pobres tentando ganhar dinheiro, fazendo aposta. É um problema que vamos ter que regular, senão daqui a pouco vamos ter cassino funcionando dentro da cozinha de cada casa”.
O senador Omar Aziz (PSD-AM) acionou Procuradoria-Geral da República (PGR) para que os cassinos online sejam suspensos. Aziz afirmou que é preciso enfrentar “a grave ameaça que os jogos digitais de apostas, os conhecidos ‘bets’, vêm causando ao povo brasileiro, em especial aos jovens e famílias que estão sendo afetados por essa prática descontrolada”.
Para além da publicidade e dos gastos descontrolados das famílias brasileiras com apostas, as bets estão envolvidas em escândalos de lavagem de dinheiro. O caso mais famoso envolveu o cantor Gusttavo Lima e a influencer Deolane Bezerra, que tiveram ordens de prisão expedidas pela Justiça.
GRUPO DE TRABALHO
A gravidade do assunto fez o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) anunciar nesta sexta-feira (27) a criação de um Grupo de Trabalho para analisar o uso de recursos do cartão Bolsa Família com apostas online (bets).
Segundo a Agência Brasil, para funcionar, grupo vai atuar em parceria com a Rede Federal de Fiscalização do Bolsa Família e Cadastro Único com objetivo de apresentar uma proposta, até o dia 2 de outubro, de restrição ao desvirtuamento do propósito do programa. Ministério da Fazenda, Ministério da Saúde e Casa Civil também vão trabalhar na ação de forma integrada.
Em nota, o MDS reafirmou que os programas sociais de transferências de renda foram criados para garantir a segurança alimentar e atender às necessidades básicas das famílias, das pessoas em situação de vulnerabilidade.
“A prioridade sempre será combater a fome e promover a dignidade para quem mais precisa”, destacou o ministério. “O foco do MDS permanece firme em garantir que o Bolsa Família continue sendo um instrumento eficaz de combate à pobreza e à insegurança alimentar”.
STF CONVOCA AUDIÊNCIA
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), convocou uma audiência pública para discutir o tema, que poderá ser decidido pela Corte, uma vez que foram apresentadas Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).
A audiência será realizada no dia 11 de novembro, às 10h.
Fux convidou para participar os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, e do Banco Central, Roberto Campos Neto, além do procurador-geral da República, Paulo Gonet, do advogado-geral da União, Jorge Messias, e dos ministros da Saúde, Nísia Trindade, dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, e da Igualdade Racial, Anielle Franco.
A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), tal com o Instituto Brasileiro do Jogo Legal (IJL), o Grupo Mulheres do Brasil e o Educafro, também foram convidados a participar.