
O governador do Estado de Buenos Aires, Axel Kicillof, repudiou a decisão do Supremo Tribunal de condenação da ex-presidente Cristina Kirchner impedindo-a de ocupar cargos públicos
Para o governante do principal estado do país, foi “um fim previsto após anos de perversa perseguição política, midiática e judicial”. Kicillof denunciou a montagem de supostos atos de corrupção nunca comprovados. “Esta condenação consolida ainda mais uma verdadeira infâmia. Este é um novo capítulo na longa história de ataques ao peronismo e àqueles que, como ela, ousaram transformar a Argentina em favor das maiorias”, escreveu Kicillof nas redes sociais, após se reunir com Cristina na sede nacional do Partido Justicialista (PJ), na Cidade Autônoma de Buenos Aires.
“Durante o governo de Mauricio Macri, foi montado um sistema ilegal de espionagem, foram fabricados casos e manipuladas provas para perseguir Cristina, a sua família e a seus antigos funcionários. A guerra jurídica e a estigmatização do campo popular tornaram-se políticas de Estado”, afirmou o governador. Ele também apontou o envolvimento de Milei, a quem culpou pelo “clima de ódio, autoritarismo e assédio que se intensificou”. “Tanto Macri como Milei desprezam a democracia com a mesma intensidade com que desprezam a dignidade do povo. E é por isso que estão a celebrar hoje”, afirmou.
“A DEMOCRACIA ESTÁ PROFUNDAMENTE FERIDA”
“Ao longo de todo o processo judicial, os procuradores e os juízes agiram com espírito de revanche, sem a mínima consideração pela verdade ou pela justiça. Deixaram de investigar os fatos: executaram um plano contra Cristina ou, em outras palavras, dada a natureza mafiosa daqueles que a perseguem, uma vendetta. Procuram, na realidade, disciplinar os dirigentes e garantir privilégios econômicos. Hoje, essa democracia está profundamente ferida. E a nossa responsabilidade histórica é defendê-la”, concluiu o governador, que ordenou uma reunião de gabinete de emergência com os seus funcionários mais próximos enquanto as primeiras manifestações ocorriam na capital do Estado, La Plata, que culminaram com a tomada pacífica da Reitoria da Universidade Nacional de LP, uma das maiores do país.
“Esta é a história do peronismo. Esta é a história do movimento que há décadas constrói um país para todos, com autoridade e justiça social. Esta é a história de bombardeios, mortes, desaparecidos e proscrições contra o povo”, tweetou o secretário estadual da Saúde, Nicolás Kreplak, que acrescentou: “A história também mostra que não nos venceram. Sempre peronistas. Sempre com Cristina.”
PREFEITOS REJEITAM O MAFIOSO VEREDICTO
Após uma reunião com o seu gabinete o prefeito de La Plata, Julio Alak, descreveu a ex-presidente como “uma das líderes mais importantes da América Latina” e afirmou que as resoluções que levaram à sua condenação foram “absurdas e arbitrárias”. “Esta decisão injusta e ofensiva foi impulsionada pelas potências econômicas e financeiras como retaliação pela sua firme defesa da unidade latino-americana, dos interesses nacionais e dos direitos sociais do povo argentino”, frisou.
Além dele, prefeitos peronistas de todo o Estado de Buenos Aires manifestaram-se em apoio da rejeição da decisão, que muda o rumo político não só da província, onde a ex-Presidente planejava ser candidata nas próximas eleições, mas de todo o país.
Às manifestações dos representantes políticos se somaram os estudantes das principais universidades. Em Buenos Aires, os campi de Direito, de Economia, de Filosofia e Letras e de Ciências Sociais foram ocupados, enquanto o Centro de Estudantes de Ciências Exatas e Naturais decidiu ocupar a Cidade Universitária e bloquear o acesso às instalações. Os estudantes da Universidade de La Plata também decidiram ocupar o edifício após a proscrição da principal líder da oposição ao governo pro-imperialista de Milei, figura que, neste momento, se encontra em Israel bajulando Netanyahu e seu séquito em vergonhoso apoio ao genocídio do povo palestino.
Por sua vez, a Direção da Associação dos Trabalhadores do Estado (ATE) da Capital Federal decidiu realizar uma greve de 24 horas nesta quarta-feira. A medida foi anunciada antes de o Supremo Tribunal emitir a sua decisão contra Cristina.
Vários outros protestos ocorreram em todo o país nesta quarta-feira, incluindo marchas de aposentados e profissionais de saúde. Além disso, os piquetes continuam nas principais entradas da Cidade de Buenos Aires.
PRESIDENTES E ORGANIZAÇÕES LATINOAMERICANAS APOIAM CRISTINA
O Grupo de Puebla e o Conselho Latino-americano de Justiça e Democracia (Clajud) emitiram um forte comunicado denunciando a perseguição política, parcialidade judicial e uma tentativa de proscrição de uma liderança popular. As informações são do portal argentino C5N.
O documento alerta que a sentença contra Cristina representa “um risco de desdém do direito à defesa e à participação política”, assinalando que a causa judicial está “viciada pela parcialidade e arbitrariedade do tribunal que a proferiu, desde seu início”. Para os signatários, o processo é fruto de uma denúncia impulsionada pelo governo do ex-presidente Macri, com o objetivo de perseguir e condenar uma pessoa inocente. “A denominada Causa Vialidad é uma denúncia promovida por razões políticas, sem provas diretas ou sequer indícios, com violação absoluta dos mais elementares princípios constitucionais, como o que proíbe julgar o mesmo fato duas vezes (ne bis in ídem)”, diz a nota.
“A sentença não será apenas contra CFK, mas contra todo o peronismo, buscando disciplinar militantes e autoridades que promovem a melhoria da qualidade de vida do povo argentino”, alertam.
“EVIDENTE QUE SE CONDENA UMA PESSOA INOCENTE”
O Grupo de Puebla e o Clajud convocam a comunidade internacional a acompanhar de perto o caso, diante da “suspeita conexão entre parte do Poder Judiciário e corporações midiáticas que atacam a democracia e anulam a possibilidade de justiça social”. E concluem: “É evidente que se condena uma pessoa inocente, violando o devido processo próprio de um Estado de Direito. Exigimos justiça!”
Entre os signatários do comunicado estão: José Luis Rodríguez Zapatero (ex-presidente da Espanha), Rafael Correa (ex-presidente do Equador), Ernesto Samper (ex-presidente da Colômbia), Baltasar Garzón (jurista espanhol), Marco Enríquez-Ominami (coordenador do Grupo de Puebla), Carol Proner (jurista brasileira), Eduardo Valdés (deputado argentino), Oriol Junqueras (presidente da Esquerda Republicana), Andrés Arauz (ex-ministro equatoriano), Clara López (senadora da Colômbia) e Irene Montero (ex-ministra espanhola e deputada europeia), entre outros.
Os presidentes de Cuba, Miguel Díaz-Canel, e da Bolívia, Luis Arce, assim como políticos de outros países, também expressaram nesta terça-feira (10/06) seu apoio à Cristina Fernández de Kirchner (CFK), após a Suprema Corte manter a pena contra ela, no que é considerado um golpe político e judicial.
“Reafirmamos nosso apoio inabalável a Cristina Fernández de Kirchner diante deste episódio de judicialização política. Força, querida Cristina”, escreveu Díaz-Canel. Referindo-se ao episódio como “um novo caso de lawfare”.
CONDENAÇÃO DE CRISTINA NÃO É APENAS PROBLEMA DA ARGENTINA
Do Brasil, o Instituto Lula anunciou que se junta ao Grupo de Puebla e ao Conselho Latino-Americano de Justiça e Democracia (CLAJUD) para “alertar a comunidade internacional sobre tentativas de silenciar vozes políticas e deslegitimar líderes que buscam promover a justiça e a igualdade social. A condenação de Cristina Kirchner não é apenas uma questão interna da Argentina: é um alerta a todos os países da região sobre os riscos à democracia e ao Estado de Direito”.
“A construção de teorias jurídicas que buscam responsabilizar Cristina Kirchner pelos atos de seus subordinados, sob uma interpretação questionável do direito administrativo, representa um retrocesso perigoso para a separação de poderes e o Estado de Direito. Tal prática não afeta apenas a ex-presidente, mas também lança uma sombra sobre o funcionamento da democracia na Argentina, ameaçando o equilíbrio de poder e a própria democracia”, afirmou.
“Exigimos que os princípios do devido processo legal sejam respeitados e que a justiça prevaleça , garantindo que a política não seja usada como arma de perseguição”, observou.
Da mesma forma, na Espanha, líderes do partido político Podemos descreveram a condenação da ex-presidente como um golpe e uma guerra suja.
Irene Montero, deputada do Podemos, declarou que “a condenação de Cristina Fernández é uma tentativa de golpe: uma guerra suja, judicial e midiática, para que, ao atingir uma pessoa, toda uma população renuncie a uma vida com direitos”.
“Querem que ela seja presa e afastada da política. As forças democráticas do mundo precisam nos ver do lado dela. Com você, Cristina”, manifestou Montero.