Na última segunda-feira (15) o governo federal fez uma reclamação ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão da Justiça Federal em Pernambuco que suspendeu o trecho de uma medida provisória (MP) que autorizou a União a seguir com o processo de privatização da Eletrobras. A decisão sobre o pedido de liminar deve ser julgado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que despacha em regime de plantão.
O juiz Carlos Kitner, da Justiça Federal em Pernambuco, concedeu uma liminar que suspendeu o Artigo 3º da MP 814, editada por Temer em 29 de dezembro do ano passado, que retirava de uma das leis do setor elétrico a proibição de privatização da Eletrobras e de suas subsidiárias.
Na decisão, Kitner afirma que o governo federal não justificou a urgência de editar uma MP, “no apagar das luzes” do ano passado, “para alterar de forma substancial a configuração do setor elétrico nacional”. Ele argumentou que as leis sobre o setor elétrico não poderiam ser modificadas sem a “imprescindível” participação do Congresso Nacional.
O deputado federal Danilo Cabral (PSB-PE), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Chesf, que ingressou com a ação popular destacou que Temer tinha a “intenção clara de fazer caixa a qualquer custo por meio da desestatização e postergar as obrigações da União Federal perante a Eletrobrás em prejuízo da mesma”.
De fato, o governo está tentando de diversas maneiras se desfazer da Eletrobrás em nome da meta fiscal e do equilíbrio das contas. Tem penalizado a estatal de diversas maneiras, restringindo seu investimento, postergando o pagamento de créditos devidos, organizando planos para fatiar suas distribuidoras e entregar a preços simbólicos, organizando massivos planos de demissão, etc.
Cabral afirmou que espera ainda a deliberação judicial sobre o pedido de liminar para o pagamento imediato de R$ 3,5 bilhões devidos pela União à Eletrobras por despesas com o abastecimento de energia da Região Norte. “Esses recursos deveriam ter sido pagos no fim do ano passado, mas a MP 814 estabeleceu novo prazo – até 2018, sujeito à disponibilidade orçamentária”.
Para ele, “a decisão judicial se soma a um conjunto de manifestações contrárias à venda do setor elétrico. A sociedade, através de pesquisas, majoritariamente é contra a privatização. No Congresso, temos as cinco frentes que reúnem mais da metade dos parlamentares da Casa em defesa das subsidiarias da Eletrobras e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), já disseram que não colocariam a matéria em pauta”.
BANANA
Outro ponto importante levantado por Danilo Cabral é o preço de banana pelo qual o governo pretende privatizar a estatal. “A Eletrobrás é a maior empresa de energia elétrica da América Latina, com valor de mercado estimado em R$ 370 bilhões, dos quais R$ 81 bilhões são relativos somente à Chesf, segundo estudo apresentado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Pernambuco. Como estimar a venda por pouco mais de R$ 10 bilhões?”, destaca.
Isso sem falar nas distribuidoras, que representantes do governo chegaram a dizer que seriam vendidas “por pouco mais de um real”, o que de fato cumpriram porque cobrar R$ 50 mil por cada uma das seis distribuidoras que no conjunto são avaliadas em R$ 10,2 bilhões, é entregar de mão beijada.
O governo defende o preço baseado nas dívidas líquidas das empresas que totalizam R$ 20,8 bilhões. O que não se justifica já que na resolução de venda das empresas, a Eletrobrás deverá assumir as dividas destas distribuidoras e também os direitos e obrigações de responsabilidade das distribuidoras, referentes à Conta de Consumo de Combustíveis e à Conta de Desenvolvimento Energético, incluídos os créditos e débitos que venham a ser posteriormente reconhecidos.
DESMONTE
Além disso, o Plano Diretor de Negócios e Gestão de 2018 a 2022 da Eletrobras prevê um corte de 44,7% nos investimentos em relação plano ao anterior. Assim, o governo e a direção da Eletrobras pretendem forçar ainda mais a privatização da companhia, já o documento deixa como única possibilidade, para o aumento no investimento, a receita das privatizações das hidrelétricas.
O Plano basicamente desmonta a Eletrobrás, e prevê investimentos de R$ 19,7 bilhões entre 2018 e 2022, frente aos R$ 35,766 bilhões previstos no plano 2017 a 2021. A justificativa da Eletrobras para esta redução é que não há investimentos adicionais em distribuição de energia por conta da expectativa de venda das concessionárias.
CONTA
Esta lógica de entregar o patrimônio público em troca de uma imaginária estabilidade financeira nunca funcionou no Brasil nem em lugar nenhum do mundo. A privatização da Eletrobrás só levará a uma maior dependência do país, porque além de tudo energia é um setor estratégico para qualquer nação, e quem vai pagar a conta é o povo.
Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), a suspensão da política de cotas terá como consequência imediata um reajuste na conta de luz que pode variar de 7% a 17%. É bom lembrar que a energia elétrica tem grande impacto na composição do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o que significa que o aumento da tarifa onera todas as cadeias produtivas, afetando mais fortemente os mais pobres.
“AVANÇAR”
O governo federal tem feito muita propaganda de seu programa “Avançar Parcerias”, em que afirma que vai terminar até o fim do ano sete mil obras que estavam paradas. Segundo o governo, o programa foi “criado para fazer a coordenação dos investimentos em infraestrutura por meio de parcerias entre o poder público e a iniciativa privada” que visa o “equilíbrio das contas e da economia”, mas, apesar de toda essa enrolação, a verdade é que este é um grande programa de privatização.
Somente em 2018, eles pretendem privatizar 75 patrimônios, que incluem a Eletrobras, a Casa da Moeda, a Infraero, 13 aeroportos, 10 portos, oito rodovias, direitos de mineração, além da realização de 12 leilões de gás natural e petróleo, entre outros.
A privatização da Eletrobras está no centro do pacote, já que é a maior empresa de energia elétrica da América Latina e a 16ª maior do mundo. O governo já editou três Medidas Provisórias para facilitar a entrega, mas tem enfrentando muita resistência social, de parlamentares e da Justiça.
CAMILA SEVERO