
Horas depois de um tribunal em Gibraltar manter arbitrariamente por mais 30 dias o confisco de um superpetroleiro iraniano, na sexta-feira (19), o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, a força de elite iraniana, anunciou ter confiscado o petroleiro de bandeira britânica Stena Impero no Estreito de Ormuz.
O superpetroleiro iraniano Grace 1 havia sido invadido e tomado por fuzileiros navais britânicos no dia 4 de julho, supostamente por levar petróleo para a Síria, ato denunciado por Teerã como “pirataria” nua e crua.
O governo iraniano vinha fazendo todo o possível, pelas vias diplomáticas, para a liberação do superpetroleiro, com 2,1 milhões de barris de petróleo de carga.
O Stena Impero, de 30.000 toneladas é propriedade de um sueco e opera sob bandeira britânica com destino à Arábia Saudita, conforme a força iraniana desligou o dispositivo de rastreamento, violou as rotas marítimas do Estreito de Ormuz e ignorou os avisos de advertência.
“A razão por trás da detenção do petroleiro britânico é que ele não aderiu às rotas marítimas no Estreito de Ormuz, desativou o sistema de identificação automática (AIS), poluiu as águas internacionais e não prestou atenção às advertências do Irã”, disse a fonte à mídia iraniana.
Outro petroleiro britânico, o Mesdar, sob bandeira da Libéria, após breve inspeção, prosseguiu viagem para o porto de Ras Tanura, na Arábia Saudita, o que foi confirmado pela operadora, a Norbulk Shipping UK, de Glasgow, que declarou que a tripulação estava “a salvo e bem”.
O líder da oposição britânica, Jeremy Corbyn, advertiu contra a escalada e o risco de “um conflito mais profundo”. “A decisão do presidente Trump de acabar com o acordo nuclear com o Irã alimentou o risco de um conflito em grande escala”, denunciou. Corbyn ressaltou que “a reintegração negociada do acordo nuclear através da ONU é essencial para reduzir as tensões e neutralizar a ameaça de guerra no Golfo”.
CINISMO BRITÂNICO
Carl Bildt, o ex-primeiro-ministro sueco e co-presidente do Conselho Europeu de Relações Exteriores, ressaltou o cinismo da posição britânica sobre a captura do Grace 1 no Estreito de Gibraltar.
“A legalidade da apreensão britânica de um petroleiro rumo à Síria com petróleo do Irã me intriga. Ao referir-se às sanções da UE contra a Síria, mas o Irã não é membro da UE. E a UE, como princípio, não impõe suas sanções aos outros. É o que os EUA fazem”, apontou.
Mas o ministro das Relações Exteriores britânico, Jeremy Hunt, que achou muito normal invadir e confiscar um superpetroleiro iraniano no Estreito de Gibraltar, agora assevera que confiscar um petroleiro britânico no Estreito de Ormuz “é inaceitável” e viola a “liberdade de navegação”.
Segundo as autoridades espanholas, que contestam o domínio colonial de Londres sobre Gibraltar, a captura do navio iraniano foi para atender ordens de Washington e a política insana de Trump de impor ao Irã zero de exportação de petróleo e o por de joelhos pela fome.
GATO E RATO EM ORMUZ
Segundo relatos disponíveis, o Impero, que tem 23 tripulantes, foi conduzido até uma base da Guarda Revolucionária do Irã na ilha de Qeshm, ao norte, após abordado por várias embarcações pequenas e um helicóptero.
No início da semana, um petroleiro, com destino aos Emirados, de bandeira panamenha, que chegou a ser dado como “desaparecido”, na verdade havia sido rebocado para um porto iraniano depois de sofrer problemas técnicos.
Na quinta-feira, as tensões no Golfo Pérsico haviam se multiplicado, após anúncio de Washington de que um barco seu de guerra havia abatido um drone iraniano que se aproximara perigosamente. Teerã desmentiu ter perdido qualquer drone e inclusive aventou a hipótese de que os assustados marujos ianques hajam derrubado um drone deles mesmos.
A empresa Stena Bulk asseverou que seu petroleiro Impero estava “em total conformidade com as normas de navegação” e em “águas internacionais” quando foi interceptado. Entre os tripulantes há indianos, russos, letões e filipinos. Pelo estreito de Ormuz, passa 20% do petróleo comercializado no mundo e, diariamente, segundo o The Guardian, entre 15 e 30 navios ingleses. Estes, desde o dia 9, navegando sob “alerta crítico” da Marinha britânica na região.
“BASTA UMA FAÍSCA”
Na quinta-feira, o ministro do Exterior da Rússia, Sergei Lavrov, havia advertido que “a política dos Estados Unidos para o Oriente Médio está criando uma situação perigosa, onde basta uma faísca para acender o fogo” – o que, como visto no dia seguinte, é cada vez mais uma possibilidade bastante real.
“O atual aumento das tensões no Oriente Médio é consequência direta da política convulsa anti-iraniana por parte de Washington e seus aliados. Os Estados Unidos, além de exibirem músculos e lançarem uma campanha para desprestigiar o Irã, agora o tratam como culpado de todos os pecados”, apontou.
Ele acrescentou que, para a Rússia, é preciso garantir a segurança coletiva na zona do Golfo Pérsico, através da resolução escalonada de situações que podem levar a conflito e medidas para construir a confiança. “Buscamos nos associar a estes países na preservação dos acordos multilaterais, pois somente assim se pode normalizar a situação em torno do programa nuclear iraniano”.
Por seu lado o Irã tem buscado assegurar que os países europeus cumpram com sua parte no acordo nuclear, para que seja possível sua preservação. O que significa garantir as importações de petróleo iraniano e relações comerciais normais entre os dois lados. A Rússia acaba de anunciar seu interesse em participar do sistema Instex de transações não-dólar, formalizado por França, Alemanha e Grã Bretanha. As empresas europeias praticamente suspenderam suas transações comerciais com o Irã, sob a ameaça de serem pesadamente atingidas pelas sanções extraterritoriais norte-americanas.
Oferta do chanceler iraniano Mohamad Javad Zarif, de que o Irã antecipe a formalização do mecanismo de inspeções intrusivas da AIEA, o que no acordo estava previsto para 2023, em troca da suspensão das sanções, já foi liminarmente descarta por um porta-voz de Washington.
Quanto à questões dos mísseis, o Irã tem advertido que, se os EUA buscam pôr em discussão os mísseis iranianos, deveriam parar de derramar os seus na região, como nas bilionárias compras de armas norte-americanas pela Aarábia Saudita.
Por enquanto, quem cuida do Golfo Pérsico é o maníaco de guerra John Bolton. Mas Trump revelou que aceitou que o senador republicano Rand Paul realize conversações exploratórias com Teerã.
A.P.