
Um erro cometido pela Justiça do Paraná resultou em um grave constrangimento ao jornalista Leonardo Sakamoto, colunista do portal UOL. Ele foi abordado por duas vezes por policiais militares em São Paulo devido a um mandado de prisão que, na verdade, não era direcionado a ele.
A ordem judicial, expedida por uma vara criminal do Paraná em 3 de junho, tinha como alvo uma mulher. No entanto, ao ser registrada no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP), o CPF vinculado ao documento foi, erroneamente, o de Sakamoto — que não possui qualquer relação com o processo ou com a pessoa procurada.
Como consequência, o jornalista passou a constar no sistema como foragido da Justiça. Todos os demais dados inseridos no mandado — como foto, número do RG, data e local de nascimento, além da filiação — pertencem à verdadeira destinatária da ordem de prisão.
A ação policial ocorreu durante uma verificação de rotina da Polícia na manhã deste sábado (8), enquanto ele se dirigia para o trabalho, na região central da cidade. Segundo o próprio jornalista, ao consultarem seu documento, os agentes, que apontaram fuzis e pistolas para o seu rosto, identificaram o mandado ativo e anunciaram que ele seria conduzido para esclarecimentos.
A liberação só ocorreu após a polícia perceber que o nome no mandado era de uma mulher e que havia um erro evidente na base de dados — mas o CPF do jornalista continua vinculado ao mandado até agora. “Estou impedido de usar o carro e andar na rua porque corro o risco de ser preso pela PM por um crime com o qual não tenho relação alguma”, diz Sakamoto”.
O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) confirmou a troca e afirmou que houve uma “inconsistência cadastral”. Apesar disso, o órgão ainda não esclareceu o que causou o erro, nem se os autores serão responsabilizados. Também não há previsão para a correção formal do registro.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo disse que “o Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões apresenta um mandado de prisão expedido pelo Poder Judiciário do Paraná em nome de uma mulher, mas com o CPF do jornalista”. A SSP afirmou que “determinou a reconfiguração do sistema policial paulista para bloquear o erro do sistema federal, até que o Poder Judiciário do Paraná ou o CNJ corrijam o erro do lançamento”.
Os advogados do jornalista vão solicitar a correção do número de CPF que consta no mandado de prisão. Além disso, vão pedir que o erro seja comunicado oficialmente às autoridades policiais em todo o território nacional. Também irão ingressar com pedidos de habeas corpus junto aos tribunais do Paraná e de São Paulo, em defesa do colunista.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) se manifestou sobre o caso e em nota e cobrou explicações das autoridades. “O Judiciário e a polícia precisam explicar os procedimentos que foram adotados e como isso aconteceu”, diz o texto. “A alegação de erro não convence, tendo em vista que os números (de CPF) são muito diferentes”, pontuou a presidente da entidade, Katia Brembatti.
Ela destacou que “chama a atenção e causa preocupação o fato de a ação ser direcionada a um jornalista com marcante atuação crítica sobre a atuação policial”. “Sakamoto corre risco nessa situação e esse cenário precisa ser revertido imediatamente”, defendeu Brembatti.
A Associação cobrou das autoridades — em especial do TJPR e do CNJ – Conselho Nacional de Justiça — a apuração rigorosa do ocorrido, a responsabilização dos envolvidos e a imediata correção dos registros nos bancos de dados oficiais.
Jornalista, doutor em Ciência Política, Leonardo Sakamoto é colunista de política do UOL, comentarista do Jornal da Cultura e professor de Jornalismo na PUC-SP. Também preside a ONG Repórter Brasil, conhecida pelo jornalismo combativo. A entidade atua na denúncia de casos de trabalho escravo e outras violações de direitos no país, publicados regularmente em seu site.
O caso da mulher condenada por homicídio passou a tramitar em segredo de Justiça a partir de janeiro de 2024. E Leonardo Sakamoto, embora inocente, ainda é tratado nos sistemas policiais como se tivesse um mandado.