NATHANIEL BRAIA*
“Nosso desafio é avançarmos juntos com inovação, na busca de igualdade e em favor do benefício mútuo para os nossos povos”, destacou Hu Guo, vice-presidente do jornal chinês Diário do Povo ao falar para 64 jornalistas de 13 países no Fórum de Cooperação de Mídia China-América Latina e Caribe
“Já estamos há dez anos do lançamento das ideias mestras em torno da união de esforços por um futuro compartilhado entre os povos da América Latina e Caribe e da China”, declarou Hu Guo, vice-presidente do Diário do Povo, que veio ao Brasil especialmente para participar do Fórum de Cooperação de Mídia China-América Latina e Caribe.
“O que almejamos é a construção de uma comunidade de futuro compartilhado entre os nossos países”, prosseguiu a diretora do Diário do Povo em sua participação no Fórum que se realiza de 15 a 18 deste mês no Rio de Janeiro.
O Fórum, que resultou de um trabalho conjunto do Diário do Povo e do Monitor Mercantil, reuniu no Rio 64 jornalistas do Brasil e de outros 12 países.
“Nestes dez anos avançamos juntos com benefício mútuo, busca da igualdade e da inovação. O que visamos é contribuir para uma vida melhor para os povos de ambas as regiões e em favor do progresso da humanidade”.
“Buscamos fazer com que as mídias da América Latina e Caribe e da China sejam participantes, cada vez mais, desta cooperação”, conclamou a jornalista chinesa, na cerimônia de abertura da exposição de fotos que retrata aspectos diversos de manifestações concretas da amizade entre os povos da China e da nossa região. “A abertura desta exposição testemunha os resultados do desenvolvimento da nossa amizade e visa fortalecer esta cooperação também no terreno da mídia. As fotos aqui apresentadas têm um forte poder de comunicar elementos desta amizade que estamos construindo. São documentos que dão vida a esta construção e transcendem aquilo que pode ser expresso apenas em palavras. Trata-se de uma cooperação que não esconde a realidade de diferentes sistemas e culturas que prezamos e consideramos em uma demonstração de respeito mútuo”.
“Essa exposição mostra o avanço em várias áreas, entre elas o crescimento da confiança política, intercâmbio cultural, desenvolvimento econômico, progresso social e cooperação entre as mídias de nossos países, em busca de uma vida melhor”, enfatizou Hu Guo.
O diretor do veículo anfitrião do Fórum, Marcos de Oliveira, do Monitor Mercantil, saudou os jornalistas no jantar de boas vindas do dia 15, afirmando que “a parceria e a amizade entre os povos da América Latina e Caribe e da China apresenta crescimento ano após ano. Quando falamos de América Latina e Caribe, falamos de vários países com características, populações e histórias diferentes mas com vários pontos em comum. Somos todos integrantes do que hoje se chama de Sul Global, em busca de um mundo mais justo economicamente, socialmente e ambientalmente. Um mundo multipolar, com oportunidades para todos”.
Ele destacou ainda “a grande responsabilidade na colaboração para alcançarmos esse desenvolvimento que cabe a nós, da mídia”.
Ao falar na abertura do Fórum de Cooperação, Marcos enfatizou que, “de acordo com a CEPAL. A América Latina e o Caribe representam 7,3% do PIB e 8% da população global, o PIB per capita em 2023 foi de 18.500 dólares, abaixo da média mundial que é 20.271 dólares e com grande heterogeneidade entre os países que integram a região”.
“Historicamente, o potencial da América Latina e do Caribe não conseguiu ser implementado, em boa parte por relações desiguais com os países desenvolvidos. Observemos que apesar de abrigar 79% da população mundial, os países do Sul Global detêm e processam apenas 31% da riqueza do Planeta”, prosseguiu Marcos.
O diretor do Monitor Mercantil ressaltou que há bases reais para avançarmos em nossa relação com a China: “Há muito que nos une, países da América Latina e Caribe, com a China. Talvez um dos mais fortes traços desta unidade seja a resistência a sermos dominados, a busca por liberdade e por um mundo mais justo”.
“Os países sul-americanos e caribenhos buscam estabelecer com a China relações justas, em que todas as partes saiam ganhando. Para que isso ocorra cada país deve levar em conta suas realidades”, alertou.
“Uma das coisas que podemos aprender com a China é um crescimento resultante da determinação de implantar um projeto nacional”.
A preocupação com relação a uma cooperação com a China que contribua para a superação de desigualdades entre as duas regiões teve presença constante no intenso debate que evoluiu nestes dias.
Exemplo disso foi o pronunciamento do colunista do jornal mexicano La Jornada, Miguel Angel Velázquez.
“Os meios de comunicação da América Latina seguem o modelo norte-americano e estão predominantemente nas mãos de empresários vinculados a este modelo e, portanto, na sua maioria, infelizmente, não refletem os interesses reais dos povos da região. Aliás estão longe desta preocupação”, denunciou Miguel.
“Esses empresários estão distantes dos povos, não fazem jornalismo de verdade, fazem negócios. Isso leva, infelizmente a um subjugamento dos jornalistas a estes interesses econômicos muito particulares”, prosseguiu enfatizando que “estamos diante do desafio de fazer um jornalismo que informe às pessoas, em vez de defender os negócios dos empresários desta mídia predominante”.
“Então o desafio que temos é o de adotar como causa transformar o nosso ofício em algo que sirva às nossas sociedades. No México nós temos jornais que se dedicam a construir prisões e defendem a proliferação de prisões, outros se dedicam a possuir hospitais e defendem a medicina privada em contraposição à saúde pública”.
“São poucos, assim como o La Jornada, que defendem os interesses das maiorias. Esta é uma mídia que interessa aos nossos povos onde o interesse central não é o de fazer negócios, mas o de informar. Estampar a verdade. Devemos desenvolver uma mídia que faça jornalismo com causa, não com interesses particulares”, declara o colunista do La Jornada.
Ele colocou claro qual a raiz dessa situação: “Isso tem por base sistemas locais de dominação. É o que ocorre com os bancos. Por exemplo, o Santander, que é um banco europeu, tem os lucros maiores em todo o mundo precisamente no México. Ou seja, alimentamos a banca estrangeira em nosso país. Então, nas lutas anti-hegemônicas nós temos que tomar a palavra. Esta é a síntese de nossa luta por liberdade, pois só com desenvolvimento próprio pode haver liberdade e só com liberdade pode haver desenvolvimento”.
“Aqui devemos ressaltar que o interesse dos nossos povos é se libertarem do hegemonismo norte-americano mas com a decisão de não cairmos em nenhum outro tipo de condicionamento hegemonista, assim que temos o dever de deixar claro, de nossa parte, o nosso interesse nesta relação com os chineses ou com qualquer outro: nos interessa a cooperação e não a dominação sob nenhum aspecto”.
“Mas é importante entender que o estabelecimento de relações de cooperação e descartar qualquer relação de dominação, tem que partir de nossos povos, de nossos governos, tem que ser uma decisão nossa acima de tudo. Tem que partir de nós a determinação de que chega, não mais dominação de nenhum tipo”.
“Nosso papel neste processo é o de formar uma plataforma midiática que integre os interesses das nossas nações. Temos que, neste sentido, combater aquelas forças e elementos de poder que se colocam não como defesa dos interesses dos povos, mas de salvaguardas do neoliberalismo”.
“Ao mesmo tempo, devemos estar atentos para o desencadeamento nos Estados Unidos de uma guerra comercial injusta contra a China. Trump acaba de dizer que, caso ganhe as eleições, não irá permitir que os carros chineses fabricados no México, com tecnologia chinesa e mão de obra mexicana, entrem nos Estados Unidos”, finalizou o mexicano.
Mateo Gille, diretor da revista uruguaia Caras y Caretas, que participou da mesa de debate sob o tema “Reforçar as Ligações Industriasi e Fomentar a Cooperação Econômica”, se pronunciou no mesmo sentido de Miguel: “Os nossos países padecem da carência de industrialização, nas relações comerciais, na maioria das vezes, exportamos matéria-prima e importamos produtos com muito maior valor agregado”.
“Isso não é casual”, denunciou Mateo, “ao longo de décadas, os Estados Unidos contribuíram decisivamente para este condicionamento”.
“O surgimento da busca de um mundo multipolar é um enfrentamento dessa ideologia e dessa realidade que nos chama ao confronto contra um hegemonismo unipolar que resulta das ações norte-americanas”.
“É assim, que só faz sentido estabelecer relações com a China para romper este condicionamento. Um futuro compartilhado entre a China e os povos da América Latina e Caribe vai depender de termos esta compreensão e atuarmos com base no respeito mútuo entre os nossos povos”, deixou claro o jornalista uruguaio.
A jornalista Victoria Ginzberg, vice-diretora do argentino Página 12, enfatizou a necessidade do desenvolvimento de uma nova consciência no trabalho midiático para contribuir ao avanço das relações dos nossos países com a China.
“Quando falamos em almejarmos um futuro compartilhado entre nossas nações e a contribuição dos jornalistas para isso, percebo que há muito trabalho pela frente”, destacou Victoria ao participar da mesa de debates “Aprofundar os Intercâmbios Culturais e Fomentar a Comunicação entre os povos”.
“Se faz necessário o desenvolvimento de uma consciência da necessidade de uma interação com base no histórico e na realidade dos nossos povos”, destacou a representante do Página 12.
“O fato é que estamos ainda estamos longe deste desenvolvimento, dessa consciência. A pergunta é: quanta gente sabe, aqui, em nossa região, sobre a realidade da China e quantos na China entendem realmente do que acontece na América Latina e Caribe?”.
“Precisamos construir um relato baseado nas nossas experiências e não na reprodução de narrativas que tratam de nos impor com a construção de preconceitos com base em interesses adversos”, prosseguiu.
“Digo isso com a percepção de que já avançamos muito. De que, apesar de estamos longe geograficamente, cresce o interesse de uns pelos outros. Hoje é inegável que aquilo que acontece lá repercute aqui e, cada vez mais, o que acontece aqui repercute na China”, disse a argentina.
Entre os jornalistas chineses que participaram do debate, destacamos o relato de Ke Rongyi, diretor do Centro de Novas Mídias, do site China Daily, que falou do crescimento da capacidade de divulgação da mídia chinesa.
“Temos tido a crescente preocupação de contar a história e a atualidade da China para os países da América Latina e Caribe. Neste sentido, reforçamos o trabalho do nosso portal China Daily em português e espanhol”, enfatizou o diretor do portal chinês.
“O China Daily foi criado em 1981 por pessoas e dentro da concepção dos que fazem o Diário do Povo. Temos o gene do Diário do Povo estando com o foco no trabalho através da internet”, relatou o jornalista Ke.
“Para tratar da atualidade política da China, já contamos com 500 milhões de usuários fruto deste esforço de divulgar nosso trabalho de reportagem sobre a Nova Era de Transformação que nosso país vive. Também temos colaborado em documentários com crescente penetração pública” expôs o jornalista chinês.
O diretor da agência de notícias Xinhua para a América Latina, Jiang Yan, foi buscar nas descobertas arqueológicas na América Central uma história focando nas coincidências entre o desenrolar das lendas de dois povos para ilustrar o anseio pelo encontro de civilizações: “Em abril de 2021, a Agência de Notícias Xinhua produziu e transmitiu o programa”Xinhua All-Media Headlines (Panoramas da Xinhua em todas as Mídias): ‘Sanxingdui’ dialoga com ‘Maia’ – Compartilhando Beleza no Tempo e no Espaço'”.
“Li Xinwei, pesquisador da Academia Chinesa de Ciências Sociais, conheceu as ruínas maias e liderou a equipe arqueológica conjunta China-Honduras. Obtivemos uma grande quantidade de materiais fotográficos preciosos, relatamos em profundidade as semelhanças entre a antiga civilização Shu e a civilização Maia”.
“Compreendemos a semelhança das estrelas na mesma latitude e o significado semelhante da árvore sagrada de bronze e a árvore sagrada da sumaúma, e destacamos a cosmologia espiritual e outros aspectos de ambas as civilizações. A “compreensão tácita” do mundo através do tempo e do espaço discute o significado de referência da aplicação da tecnologia arqueológica em Sanxingdui para a escavação e proteção de relíquias culturais Maias. e espera encontrar perspectivas comuns dos intercâmbios arqueológicos China-América Latina para promover a aprendizagem mútua entre as civilizações.”, .
O Fórum teve a participação de Guiomar Prates, diretora do portal Vermelho. “A parceria que se descortina entre a América Latina e Caribe por um lado e a China por outro é da maior importância e não devemos perder a oportunidade de fortalecê-la”, conclamou Guiomar..
Ela também pontuou que “vivemos em um contexto em que os países em desenvolvimento têm sido relegados a produtores de matéria-prima enquanto que os chamados desenvolvidos ofertam produtos com maior valor agregado. Cabe superar esta lógica, movimento fundamental para partirmos para uma nova globalização onde a busca é vencer a pobreza e as desigualdades”.
“Vemos que a China busca atuar com respeito aos países com os quais estabelece parceria e o nosso trabalho é contribuir para o desenvolvimento deste respeito mútuo fruto de um conhecimento cada vez maior entre nós”, reconheceu a diretora do portal Vermelho.
“Temos que garantir o crescimento de uma mídia que atue no sentido de combater as fake news e que faça reportagens com referência nos fatos e deixe de lado os preconceitos que ainda prevalecem com relação à China e seu potencial”, concluiu Guiomar.
*Reportagem de Nathaniel Braia, editor de Internacional do jornal Hora do Povo, que participou do Fórum no Rio
**Matéria produzida com colaboração da agência de notícias chinesa Xinhua e do jornal Monitor Mercantil