
Com a economia em deterioração, Bolsonaro liberou o saque de até R$ 500,00 por cada conta ativa e inativa do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e do PIS-Pasep. Uma medida fraca e pontual que não reanimará de forma consistente nem o consumo, nem a produção e nem o investimento. Michel Temer já tinha feito isso, liberando 44 bilhões das contas inativas, e o país continuou afundando.
O anúncio foi feito na quarta-feira (24) em pomposo evento que reuniu, além de Bolsonaro e seu vice Mourão, a equipe econômica e os presidentes da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil.
Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, o governo estava apresentando medidas “estruturais” e até “revolucionárias”, afinal de contas, “nós somos liberais progressistas”, disse ele. Que informou também que esse plano de esvaziar os recursos manejados pela CEF para investimentos em habitação estava sendo planejado mesmo antes da posse de Bolsonaro.
Essa medida de enfraquecer os recursos da habitação piora ainda mais a taxa de investimento, que é a menor taxa de dos últimos 50 anos no primeiro trimestre de 2019. A produção industrial, o comércio e o setor de serviços caíram em relação ao ano passado e o desemprego aumentou nos primeiros meses do governo Bolsonaro.
A previsão do governo, segundo disseram, é injetar R$ 42 bilhões, sendo R$ 30 bilhões previstos para este ano (R$ 28 bilhões deverão ter origem nos saques do FGTS e R$ 2 bilhões do PIS-Pasep) e outros R$ 12 bilhões no ano que vem.
Com as previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano abaixo de 1%, mais precisamente 0,8%, o governo disse no evento que os saques do FGTS vão impulsionar a economia algo em torno de “0,35 por cento ou 0,35 ponto percentual”, segundo se enrolou o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, ao anunciar a estimativa.
Quer dizer, se depender de Guedes&Cia, não vai haver investimentos, o PIB vai continuar medíocre e a taxa de desemprego continuará nas alturas, já que, no mesmo evento, foi anunciado que a medida vai gerar 2,9 milhões de empregos em dez anos. Dez anos! Quando em maio deste ano, segundo o IBGE, 28,5 milhões de brasileiros amargavam a tragédia do desemprego.
EFEITO PONTUAL
Diversos analistas de instituições financeiras, ouvidos pelo G1, avaliam que o efeito desta medida será pontual.
“Eu acho que o impacto será diminuto”, declarou o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. “Considerando o tamanho do PIB de consumo das famílias e que uma parte vai para pagar dívidas, o impacto segue sendo ainda em torno de 0,1 ponto percentual (em 2019)”.
Para o economista-chefe da Necton, André Perfeito, o potencial dos recursos liberados seria de 0,4 ponto percentual no PIB. Mas ele estima que, desse valor, o impacto efetivo será menor, de 0,1 ponto. “Não é todo mundo que vai sacar e usar isso em consumo propriamente”, diz o analista, acrescentando que “é uma medida que, do ponto de vista da atividade de curto prazo, talvez tenha um efeito mais modesto do que o esperado”.
O analista da Necton citou como exemplo a liberação dos saques do FGTS no governo Temer, que “não foi favorável no sentido de dar um efeito mais forte na economia. Tem um efeito que é pontual”.
Para a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, “é um impacto de curto prazo que não muda a trajetória de crescimento, apenas estimula transitoriamente a economia. A gente não vai ver empresário contratar e aumentar planta por causa de um impulso temporário. É uma medida de curto prazo para elevar temporariamente a demanda e não a capacidade produtiva”, disse.
HABITAÇÃO
Atualmente, há cerca de 260 milhões de contas ativas e inativas no FGTS. Desse total, cerca de 211 milhões (80%) têm saldo de até R$ 500. Os saques do FGTS começarão em setembro e os do PIS-Pasep começam em agosto.
Representantes do ramo da Construção Civil alertaram para o esvaziamento dos recursos do FGTS que, além de oferecer proteção ao trabalhador, financia obras de habitação, saneamento e infraestrutura.
Segundo o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (SindusCon-CE), André Montenegro, a medida pode acabar desvirtuando o objetivo do Fundo e destaca que sem os recursos do crédito imobiliário do FGTS, parte das construtoras poderá começar a sentir os efeitos da crise econômica no futuro próximo.
“Hoje, o maior financiador da construção civil é o FGTS, mas se o Fundo é usado para impulsionar o consumo, a medida acaba com a construção civil. Um setor que movimenta o Brasil, gerando empregos de forma dinâmica e rápida. Impulsionar o consumo traz um impacto pontual, como foi com Temer, que teve impacto, mas acabou logo em seguida”, disse Montenegro.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil da Região Oeste do Estado de São Paulo (SindusCon-OESP), Aurélio Luiz de Oliveira Júnior, afirma que a medida trará efeitos devastadores para o segmento da construção civil, pois há sérios riscos de ela esvaziar a fonte de recursos para o setor.
“Anualmente, o fluxo de entradas e saídas do Fundo costuma ser de aproximadamente R$ 100 bilhões. Um saque da ordem de R$ 30 bilhões, valor estimado pelo governo, certamente vai comprometer o financiamento da construção por meio do FGTS. Além do mais, nenhuma entidade representativa da construção civil foi chamada para opinar sobre a questão”, afirma o presidente do Sinduscon OESP. Na terça-feira (23), em busca de apoio, Oliveira Júnior entregou à presidente da Câmara Municipal de Araçatuba (SP), Tieza Marques de Oliveira (PSDB), um manifesto da entidade contrário à proposta do governo de liberação do FGTS.
Segundo dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), para cada R$ 100 mil sacados em FGTS, uma moradia popular pode deixar de ser construída. Se forem sacados R$ 30 bilhões (estimativa do Governo Federal), serão 300 mil casas a menos.