
As chuvas que vêm atingindo Minas Gerais nas últimas semanas resultando em alagamentos e desmoronamentos que já causaram a morte de 25 pessoas também geram preocupação com relação às barragens de rejeitos das mineradoras que exploram desenfreadamente a região.
Levantamento realizado após determinação do Governo Estadual e do Ministério Público de Minas Gerais revelou que 31 barragens de rejeitos possuem risco de desmoronamento no Estado. Dessas, 29 estruturas pertencem à mineradora privatizada Vale. Segundo o relatório, três dessas barragens são consideradas em “risco iminente de rompimento”, ameaçando a população da região.
O risco de rompimento das estruturas causa ainda mais temor às vésperas do aniversário de três anos do desabamento da barragem da mineradora em Brumadinho, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, que matou 270 brasileiros e até hoje segue impune.
Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), as barragens Forquilha III, Sul Superior e B3/B4, todas operadas pela Vale e próximas às cidades de Ouro Preto, Nova Lima e Barão de Cocais que, juntas, têm população estimada em 255 mil pessoas, são as únicas barragens do Brasil em situação de emergência nível 3, quando o rompimento é iminente ou está em curso.
Os três municípios também estão em situação de emergência por conta das chuvas, de acordo com a Defesa Civil de Minas Gerais.

As outras barragens em alerta são da Emicon Mineração e Terraplanagem (2), massa falida de Mundo Mineração (2), CSN (1), ArcelorMittal (1), e Topazio Imperial Mineração (1).
As fortes chuvas que atingem Minas Gerais aumentam os riscos de problemas em barragens como as de rejeitos de mineração. O risco no Estado é ainda maior por conta da alta concentração dessas estruturas e da proximidade delas com centros urbanos.
Segundo a ANM, no entanto, as barragens não estão em situação de emergência por conta das chuvas deste ano. Elas estão nesse nível de alerta desde março de 2019, após o rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho. À época, a empresa disse que a medida foi tomada de forma “preventiva” por terem fatores de segurança abaixo do que determinavam as normas do governo federal.

As três estruturas são barragens a montante, do mesmo tipo da que colapsou em Brumadinho.
Segundo a ANM, elas têm um dano potencial alto, o que significa que o seu rompimento poderia causar prejuízos significativos para as comunidades localizadas ao seu redor.
Em nota, a Vale diz que construiu estruturas para proteger as comunidades próximas às barragens. “Todos os barramentos da empresa nessa situação já têm suas respectivas contenções finalizadas, sendo capazes de reter os rejeitos em caso de necessidade. É o caso da barragem Sul Superior, na mina Gongo Soco, em Barão de Cocais (MG); da B3/B4, na mina Mar Azul, em Nova Lima (MG); e da barragem Forquilha III, na mina Fábrica, em Itabirito (MG)”, diz um trecho da nota da companhia.

Veja a lista das 31 barragens com risco de rompimento informadas pelo governo:
1 Vale S/A – Barragem Sul Inferior (Barão de Cocais) – Nível 1
2 Vale S/A – Barragem Borrachudos II (Itabira) – Nível 1
3 Vale S/A – Barragem Maravilhas II (Itabirito) – Nível 1
4 Vale S/A – Barragem Xingu (Mariana) – Nível 2
5 Vale S/A – Barragem 5 (Nova Lima) – Nível 1
6 Vale S/A – Barragem 5 MAC: Dique Auxiliar da Barragem 5 e Barragem 5 (Nova Lima) – Nível 1
7 Vale S/A – Barragem 6 (Nova Lima) – Nível 1
8 Vale S/A – Barragem 7 (Nova Lima) – Nível 1
9 Vale S/A – Barragem Área IX (Ouro Preto) – Nível 1
10 Minérios Nacional S/A – Barragem Auxiliar B2 (Rio Acima) – Nível 1
11 Vale S/A – Barragem B3/B4 (Nova Lima) – Nível 3
12 Vale S/A – Barragem Campo Grande (Mariana) – Nível 1
13 Vale S/A – Barragem Capitão do Mato (Nova Lima) – Nível 2
14 Arcelormittal Brasil S/A – Barragem de rejeitos (Itatiaiuçu) – Nível 2
15 Vale S/A – Barragem Dicão Leste (Catas Altas) – Nível 1
16 Vale S/A – Barragem Doutor (Ouro Preto) – Nível 1
17 Vale S/A – Barragem Forquilha I (Ouro Preto) – Nível 2
18 Vale S/A – Barragem Forquilha II (Ouro Preto) – Nível 2
19 Vale S/A – Barragem Forquilha III (Ouro Preto) – Nível 3
20 Vale S/A – Barragem Grupo (Ouro Preto) – Nível 2
21 Vale S/A – Barragem Marés II (Belo Vale) – Nível 1
22 Vale S/A – Barragem Norte/Laranjeiras (São Gonçalo do Rio Abaixo) – Nível 1
23 Vale S/A – Barragem Peneirinha (Nova Lima) – Nível 1
24 Vale S/A – Barragem Santana (Itabira) – Nível 1
25 Vale S/A – Barragem Sul Superior (Barão de Cocais) – Nível 3
26 Vale S/A – Barragem Vargem Grande (Nova Lima) – Nível 1
27 Vale S/A – Dique B (Nova Lima) – Nível 1
28 Vale S/A – Dique de Pedra (Ouro Preto) – Nível 1
29 Vale S/A – Dique Paracatu (Catas Altas) – Nível 1
30 Vale S/A – Dique PDE 3 (São Gonçalo do Rio Abaixo) – Nível 1
31 Vale S/A – Barragem Pontal: Sistema Pontal – Dique 2, 3, 4, 5,
TRANSBORDAMENTO
No sábado, o Dique Lisa, da Mina de Pau Branco, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, estrutura que pertence à multinacional francesa Vallourec, transbordou após um talude de uma barragem de rejeitos da mineradora ceder. A BR-040, rodovia que liga Belo Horizonte ao Rio de Janeiro, ficou interditada por 45 horas.
O nível de emergência do dique chegou ao nível 3, iminência de rompimento, mas depois de ações de segurança, ele desceu para o nível 2, em que há menor risco. Os trabalhos foram suspensos na mina e o governo do estado aplicou multa de R$ 288 milhões por danos ambientais.
Outra barragem que está em estado de alerta é a do Carioca, localizada entre Pará de Minas e Conceição do Pará, na Região Centro-Oeste do estado. O reservatório de água é usado por uma fábrica de tecido para gerar energia.
Veja as imagens:
MONITORAMENTO
Segundo o professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Viçosa Eduardo Antônio Gomes Marques diz que a intensidade das chuvas registradas nos últimos dias aumenta os riscos de incidentes em barragens.
“As chuvas, aumentam, sim, a possibilidade de incidentes. Isso acontece especialmente em Minas Gerais porque temos uma quantidade muito grande de barragens próximas a cidades”, explica.
Marques afirma que o risco de rompimento, no entanto, atinge tanto as barragens que estão em nível três de emergência quanto aquelas que estão em níveis inferiores. E defende a necessidade de intensificar o monitoramento das estruturas afetadas pela chuva. Segundo ele, uma das maiores preocupações hoje é o comportamento das paredes naturais de barragens.
“A gente vê que as barragens estão sendo monitoradas, mas uma possibilidade é que a chuva faça os taludes caírem, o que pressionaria as barragens. Isso é perigoso porque as estruturas estão muito perto de cidades e o tempo para evacuação é curto”, diz.
Sobre as três que estão em nível máximo de emergência, Marques confirma que as obras de contenção já foram feitas e que, caso elas tenham sido dimensionadas e executadas da forma correta, um possível rompimento teria impactos reduzidos sobre a população local.
“As obras de contenção foram finalizadas e um rompimento não traria tantos riscos como antes. Mas essa estimativa considera que todas as obras foram feitas e dimensionadas da forma correta. Se isso não aconteceu, é difícil saber os impactos”, afirmou.
O professor de segurança em barragens da Universidade Federal de Itajubá (Unifei) Carlos Barreira Martinez diz que é preciso manter o monitoramento das barragens em nível 3 de emergência e intensificar a atenção sobre outras estruturas que, por conta da chuva, podem representar riscos.
Ele aponta ainda um novo elemento que, segundo ele, deveria ser considerado no cálculo de segurança para barragens: a ocorrência de fenômenos climáticos extremos. Segundo ele, as mudanças climáticas estão alterando o ciclo de chuvas e isso pode trazer impactos sobre as barragens.
“Essas estruturas são feitas considerando um regime pluviométrico que não previa esses eventos extremos tão recorrentes. O que estamos vendo é uma série de chuvas muito intensas num curto espaço de tempo e em regiões muito pontuais. Isso pode trazer impactos que precisam ser dimensionados”, afirmou.
Leia mais: