
O ministro relator foi contundente em seu voto contra todos os réus por tentativa de abolição do Estado de Direito e tentativa golpe de Estado
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrou nesta segunda-feira (9) o seu voto pedindo a condenação de todos os 8 réus e afirmou que o ex-presidente Jair Bolsonaro liderou a organização criminosa com o objetivo de se manter no poder mesmo após a derrota nas urnas em 2022.
“O réu Jair Messias Bolsonaro deu sequência a essa estratégia golpista estruturada pela organização criminosa, sob a sua liderança, para já colocar em dúvida o resultado das futuras eleições, sempre com a finalidade de obstruir o funcionamento da Justiça Eleitoral, atentar contra o Poder Judiciário e garantir a manutenção do seu grupo político no poder, independentemente dos resultados das eleições vindouras”, disse Moraes.
O ministro relembrou o 7 de Setembro de 2021 como um marco na escalada golpista. Na ocasião, Bolsonaro discursou em Brasília e em São Paulo, fazendo graves ameaças ao STF. “Isso não é conversa de bar (…). Isso é o presidente da República no 7 de Setembro, a data da independência do Brasil, instigando milhares de pessoas contra o Supremo, contra o Judiciário, e especificamente contra um ministro do STF”, destacou Moraes.
Outro episódio foi a reunião convocada por Bolsonaro em 18 de julho de 2022 com embaixadores estrangeiros, no Palácio da Alvorada, para desacreditar o sistema eletrônico de votação. Moraes foi duro: “Essa reunião eu diria que talvez entre para a história como um dos momentos de maior entreguismo nacional (…). Os últimos acontecimentos demonstram que esta reunião foi só preparatório para uma tentativa de retorno à posição de colônia brasileira, só que não mais de Portugal”, disse relator.
O ministro afirmou que a estratégia não se restringiu ao período eleitoral de 2022, mas vinha sendo construída desde meados de 2021 até os atos de 8 de janeiro de 2023. O objetivo, segundo ele, era criar um ambiente de instabilidade institucional que justificasse medidas de exceção, como a decretação de estado de sítio e a prisão de ministros do Supremo.
O relator detalhou ainda a utilização da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) na criação da chamada “Abin paralela”, voltada a monitorar adversários políticos e difundir desinformação. “Não é razoável achar normal um general do Exército, general quatro estrelas, ministro do GSI, ter uma agenda com anotações golpistas, preparando a execução de atos para deslegitimar as eleições, o Judiciário e para se perpetuar no poder”, criticou, em referência ao general Augusto Heleno.
“No Brasil, todas as vezes que as Forças Armadas atenderam o chamamento de um grupo político que se diz representante do povo, nós tivemos um golpe, um estado de exceção, uma ditadura. Aqui já se mostrava claramente o andamento dos atos executórios do golpe de Estado, em unidade de designios com Augusto Heleno, eu repito, cuja figura naquela live serve exatamente para dar credibilidade, seja às Forças Armadas, seja ao discurso de que as Forças Armadas iriam acolher o chamamento do povo. O mesmo discurso, e aqui na linha temporal tudo se junta”, afirmou.
Segundo Moraes, a partir de 2021 o grupo iniciou uma ofensiva contra o sistema eleitoral, buscando desacreditar as urnas eletrônicas e colocar a população contra o Judiciário. “A organização criminosa iniciou a consumação desses atos executórios com a finalidade de perpetuação no poder, seja mediante um controle do Judiciário e do TSE, seja desrespeitando as regras da democracia e as eleições que ocorreriam em 2022”, prosseguiu o ministro.
Moraes também aproveitou seu voto para rechaçar alegações de que seria suspeito ou impedido de julgar o caso por ter sido alvo de ataques pessoais. “Todos os advogados e advogadas sabem que qualquer juiz que seja ameaçado, coagido, até agredido no curso do processo por quem está sendo investigado, ele não se torna suspeito ou impedido. (…) O Código de Processo Penal é claro: qualquer fato superveniente ligado ao processo que tente coagir ou destruir a Justiça, que ofenda o magistrado, não é causa de suspeição ou impedimento.”
O relator também rejeitou os argumentos de Bolsonaro de que discutia apenas “considerandos” ou hipóteses constitucionais com militares. “Não existe previsão constitucional para decretação de estado de sítio, estado de defesa ou GLO no caso de derrota eleitoral. Não existe. Chame-se como quiser. Aqui era uma minuta de golpe de Estado”, declarou. E ironizou: “Quem pretende dar um golpe, dá um golpe, como se pretendeu aqui e se tentou, não conversando com o Legislativo ou com conselheiros da República, mas conversando e pedindo a lealdade e o apoio dos comandantes das Forças Armadas”.