
“No primeiro crime, não há derrubada do governo eleito. No segundo crime, o sujeito passivo é o Executivo. São coisas absolutamente diversas”, explicou o ministro relator do STF no início de sua apresentação
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do processo sobre a tentativa de golpe chefiada por Jair Bolsonaro de 2022/23, afastou, nesta terça-feira (9), todas as preliminares apresentadas pelos advogados de defesa dos réus do núcleo crucial da trama e iniciou a análise do mérito dos crimes cometidos pelos golpistas.
“Todas as provas estão no processo e as defesas tiveram pleno acesso”, afirmou Moraes. O ministro diz que as provas foram solicitadas pelas próprias defesas e entregues pela Polícia Federal. “Do recebimento à fase das alegações finais, foram quatro meses. E nenhuma defesa juntou um único print, uma única gravação pertinente para o processo. São oito equipes de advogados que, por quatro meses, ficaram com essas provas que elas mesmas pediram e não foi juntado nada de pertinente”, continuou.
Moraes detalhou o dois tipos penais constantes na acusação da Procuradoria Geral da República (PGR). O primeiro foi a tentativa de abolição da democracia por parte do então presidente da República, Jair Bolsonaro e de seus comparsas de governo, com objetivo de se perpetuar no poder. O segundo crime apontado pela PGR foi a tentativa de golpe de estado orquestrada pela organização criminosas para derrubar o governo eleito nas eleições de 2022, que deram vitória a Luiz Inácio Lula da Silva.
“No primeiro crime, não há derrubada do governo eleito. No segundo crime, o sujeito passivo é o Executivo. São coisas absolutamente diversas”, continuou Moraes.
Moraes prosseguiu em seu relatório. “O réu Jair Messias Bolsonaro deu sequência a essa estratégia golpista estruturada pela organização criminosa, sob a sua liderança, para já colocar em dúvida o resultado das futuras eleições, sempre com a finalidade de obstruir o funcionamento da Justiça Eleitoral, atentar contra o poder Judiciário e a garantir a manutenção do seu grupo político no poder, independentemente dos resultados das eleições”, disse o ministro.
“Esse julgamento não discute se houve tentativa ou não tentativa de golpe. O que discute é a autoria, se os réus participaram. Não há nenhuma dúvida em todas as condenações de que houve a tentativa de golpe. “Eu li há alguns dias uma das defesas alegando cerceamento, que para poder ter acesso a tudo isso gastou R$ 25 mil. Foi a defesa que pediu. Mas isso mostra que tiveram total acesso ao que pediram e nada de importante foi juntado”, acrescentou Moraes.
“Essa organização criminosa, com divisão de tarefas e hierarquizado, praticou vários atos executórios. Primeiro, atentar contra o Estado Democrático de Direito, pretendendo restringir ou suprimir, mediante grave ameaça, a atuação de um dos Poderes do Estado. Neste caso, o Judiciário. E ainda atos executórios para consumir, por meio de violência ou grave ameaça, um governo legitimamente constituído”, argumentou o ministro.
Após as preliminares, o ministro iniciou a análise do mérito da acusação. Ele continuou descrevendo a atuação da organização criminosa por trás da tentativa de golpe de Estado. “O conjunto é de uma organização criminosa sobre a liderança de Jair Messias Bolsonaro, que atuou durante o período de julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023”, segue.
O processo em curso julga Bolsonaro e outros sete ex-integrantes de seu governo e aliados próximos. Eles são acusados de planejar o chamado “Punhal Verde e Amarelo”, que incluía sequestros e até assassinatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e do próprio Moraes.
A denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) também menciona a “minuta do golpe”, documento que previa instaurar estado de defesa e de sítio para impedir a posse de Lula. Além disso, os acusados respondem por envolvimento nos atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas em Brasília.
Os réus do processo são:
• Jair Bolsonaro – ex-presidente da República
• Alexandre Ramagem – ex-diretor da Abin
• Almir Garnier – ex-comandante da Marinha
• Anderson Torres – ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF
• Augusto Heleno – ex-ministro do GSI
• Paulo Sérgio Nogueira – ex-ministro da Defesa
• Walter Braga Netto – ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice em 2022
• Mauro Cid – ex-ajudante de ordens e delator
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, já pediu a condenação de todos os acusados, com penas que podem ultrapassar 30 anos de prisão. A decisão final caberá à Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Luiz Fux e Flávio Dino.