“É um grupo que ameaça a própria convivência civilizatória em nosso país”, alertou o professor Nilson Araújo durante o ato de eleição da nova diretoria do Sindicato dos Escritores do Estado de São Paulo, à qual foi reeleito presidente.
Dada a importância das declarações, transcrevemos o pronunciamento do professor:
“Nosso sindicato foi fundado na década de setenta pelo escritor Toledo Machado. Ele sempre entendeu que o sindicato não tinha caráter meramente profissional, para defender a categoria apenas desse ponto de vista, por mais que fosse isso sua atividade central. Era um sindicato que participava de todas as lutas políticas que estavam colocadas para o país nos mais diversos momentos. E isso é natural, pois se trata de um sindicato de escritores que, por seu caráter, luta com as ideais. Como travar a luta das ideias se nós não estamos presentes nos momentos mais importantes? E é assim que vamos atuar no momento atual.
Estamos vivendo um momento particularmente difícil da vida nacional. No bojo da crise mais profunda da história contemporânea do país emergiu das profundezas e eclodiu na superfície o ovo da serpente, que chega ao poder, sob a forma de fascismo.
Concordo com o Renato [Renato Rabelo, presidente da Fundação Maurício Gabois, esteve presente e fez uma saudação à nova diretoria. Ver link para repostagem com suas declarações ao final desta matéria] que o regime ainda não é fascista, mas o grupo que está à frente, é um grupo fascista e já começa a ter práticas e ações concretas neste sentido e, se permitirmos, vai implantar a ditadura fascista no país.
Já começam a violentar a democracia, violentar os direitos do nosso povo, a soberania nacional, querem acabar com o patrimônio público e, de um ponto de vista mais geral, é um grupo que ameaça a própria convivência civilizatória em nosso país e o próprio avanço civilizatório, é um grupo obscurantista: para eles, tudo o que foi produzido em termos de ciências naturais, de Copérnico e Galileu até hoje, não existe, porque a terra é plana, é o centro do universo. Para eles, o marxismo enquanto contribuição não existe. Do alto de sua ignorância, acusam pessoas que vieram antes de Marx de serem marxistas e vêm com essa conversa de ‘marxismo cultural’…Quem dera, o ‘marxismo cultural’ tivesse esse peso aqui no Brasil, conforme alegam.
“O fascismo de país dependente representa os interesses do que há de mais podre da oligarquia bélica e financeira dos Estados Unidos”
No geral, o fascismo é a expressão, no terreno político, do domínio da oligarquia financeira nos países centrais, que aí se torna no setor dominante da burguesia. O fascismo de país dependente representa os interesses do que há de mais podre da oligarquia bélica e financeira dos Estados Unidos. Não é nem mesmo o conjunto da oligarquia financeira dos Estados Unidos, é seu setor mais apodrecido que se vê representado no fascismo, neste presidente que lá está.
Já houve várias tentativas dos Estados Unidos de se levantarem da crise que se prolonga, que é uma crise estrutural e que vem vigindo desde os anos 1970. Já houve várias tentativas, da parte deles, cada uma delas retira mais direitos do povo, retira mais soberania, dilapida patrimônio público e a cada tentativa vão radicalizando o que já faziam nas tentativas anteriores.
Mas o Império Americano não conseguiu deter a trajetória de declínio que se mantém desde os anos 1970 e, apesar de ter conseguido derrotar o Japão na luta econômica e, em alguns momentos, a própria União Europeia, com destaque para a Alemanha e, ao mesmo tempo em que China está em ascensão, eles estão em declínio.
Nessa situação o que fazem? É radicalizar ainda mais o que já vinham fazendo desde antes. Isso significa, na prática, buscar recolonizar a periferia do mundo capitalista. Eliminar qualquer resquício de soberania nacional, forçar a entrega de todo o patrimônio público, fazer a periferia rezar na cartilha de medidas traçadas por eles, retirar direitos, escravizar os trabalhadores do mundo inteiro.
Isso não convive com democracia. Essa busca de acabar direitos e de esmagar a soberania dos países periféricos, não convive com a democracia. O que faz, portanto, este grupo protofascista, que está no poder aqui, é seguir a cartilha da indústria bélica e do sistema financeiro dos Estados Unidos.
“Aumenta nossa responsabilidade de articularmos de fato a frente mais ampla possível contra esse grupo para que possamos impedir essa escalada fascista”
Isso significa que aumenta nossa responsabilidade de impedir isso. De articularmos de fato a frente mais ampla possível contra esse grupo para que possamos impedir essa escalada fascista. Uma frente que vai sendo construída, em cima das ações concretas, ao nível dos parlamentos, ao nível das lutas do povo, e na nossa área também, na área cultural.
O nosso sindicato, sempre esteve ao lado de outras forças na luta contra a ditadura. Ali foi uma frente ampla na prática, por mais que não tenha sido formalizada. No terreno da cultura cabe uma frente a mais ampla possível porque o que eles estão fazendo com a cultura é simplesmente deprimente. Acabar com o Ministério da Cultura e colocá-lo sob o Ministério do Turismo mostra como funciona a cabeça deles. A maneira como estão tratando os vários órgãos, instituições, paralisando umas, suprimindo outras, é uma violência que está dentro da lógica e do obscurantismo deles. O que fizeram agora com a categoria dos jornalistas, com a PEC 905, é inadmissível, um ataque contra um dos setores que produz cultura.
A cultura é a criação mais bela, mais profunda, que o ser humano foi capaz de gerar. Isso se expressa nas várias áreas, na da comunicação, desde a poesia, até a área jurídica; as mais diversas. Então, além de defender a democracia, nosso sindicato está na trincheira da defesa da cultura brasileira. E vamos travar todas as lutas que forem necessárias. Já começamos com este manifesto, que realmente expressa essa luta do momento atual”.