
Não é todo dia que o New York Times e o Washington Post, deixando de lado a costumeira hipocrisia sobre a intervenção imperialista, registram que os EUA são “cúmplices de crimes de guerra” – no caso, no Iêmen. Na quinta-feira passada, em editorial o NYT, após assinalar que a Guerra no Iêmen resultara em “incontáveis mortes de civis, muitas atribuídas aos ataques de bombardeio indiscriminado da coalizão”, acrescentou que “sob a lei internacional esses ataques podem ser qualificados como crimes de guerra nos quais os Estados Unidos e a Inglaterra, outra fornecedora de armas, são cúmplices”.
Já segundo o Washington Post, referindo-se ao cerco do porto que é a porta de entrada de quase todo o alimento, remédios e combustível que chega ao esfaimado país, assinalou que “os Estados Unidos, que já têm estado fornecendo aos seus dois aliados inteligência, reabastecimento aéreo e munições, será cúmplice se o resultado for o que as autoridades da ajuda humanitária dizem que pode ser: fome, epidemia e outro sofrimento humano que ultrapassa qualquer coisa que o mundo viu em décadas”. A denúncia da ONU era sobre uma “catástrofe iminente” causada pelo assalto saudita-emirados ao porto de Hodeidah.
Naturalmente, não se trata de que o NYT e o Post, que já bateram tambor para tudo que é guerra de agressão, hajam repentinamente se arrependido do que fizeram na Iugoslávia, Iraque, Líbia e Síria. É que, para pegar Trump, até isso serve – descortinar a “cumplicidade” nos crimes de guerra da Casa Branca, fazer sutil referência à jurisprudência de Nuremberg.
O mais prosaico Wall Street Journal fez praticamente o mesmo, sob outro ângulo. Citando “fontes do Pentágono”, registrou que “os militares dos EUA estão ajudando seus aliados do Golfo a desenvolverem uma lista de alvos”. Supostamente – por favor não riam – “para minimizar o número de baixas civis”.
Na reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU que discutiu o agravamento da crise no Iêmen, a questão da cumplicidade voltou, na forma do veto dos EUA e Inglaterra à resolução apresentada pela Suécia para “congelar as operações militares em Hodeidah”. O enviado especial da ONU ao Iêmen, Martin Griffiths, havia pedido “um pouco mais de tempo” para negociar uma solução, mas as bombas e mísseis vendidos pelos EUA (e fabricados pelo cartel da morte ianque) não podiam esperar.
A ofensiva está em curso há cinco dias, o aeroporto está destruído, mas os iemenitas resistem às tropas dos feudais e aos mercenários. O bombardeio já causou centenas de mortes e a fuga de milhares de civis, tentando escapar dos ataques. Grifiths continua tentando um acordo de último minuto para deter a carnificina – a ONU passaria a controlar o porto. No relato de civis ao canal Ruptly da RT, “os ataques aéreos foram extremamente pesados e violentos, atingindo humanos, árvores e casas – tudo”. “Um monte de gente morreu – crianças e idosos – no bombardeio de Hodeidah pelos sauditas”, denunciou outro.
Se a jurisprudência de Nuremberg – a que considerou como crime máximo, o que condensa todos os outros, a guerra de agressão, fosse reinstalada, estaria sendo aplicada aos governantes dos EUA e seus antecessores na Casa Branca, que deram sinal verde em 2015 para a chacina em curso, e aos skeiks saudita e dos emirados. E, claro, aos executivos-chefes da Lockheed, Raytheon, Boeing, Northrop e outros traficantes de armas de alto coturno.