
Renato Rabelo e Luciana Santos abriram o seminário com a mesa “PCdoB centenário e contemporâneo”
O jornalista e poeta Adalberto Monteiro fez a abertura do seminário realizado sob a inspiração do centenário do Partido Comunista do Brasil, neste fim de semana, com o lema PCdoB centenário e contemporâneo.
O evento, promovido pela Comissão do Centenário e pela Fundação Maurício Grabois, contou cinco mesas, contemplou 16 apresentações históricas, econômicas, geopolíticas e sociais, se estendendo até domingo (15) com atividades presenciais e transmissão ao vivo pelas redes sociais.
Como explicou o secretário de Formação e Propaganda do PCdoB, Adalberto Monteiro, as mesas do seminário permeiam a história do Brasil, mirando o futuro.

Mesa 1
Síntese histórica
O presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, pontuou os grandes momentos da trajetória do Partido Comunista, entrelaçados com a história do Brasil, para revelar a identidade que o mantém atual na luta em defesa do Brasil, da democracia e do socialismo. O dirigente fez isso ao apresentar o documento PCdoB – Um século em defesa do Brasil, da democracia e do socialismo, aprovado em reunião no dia 18 de março de 2022, pela Comissão Política Nacional (CPN).
O documento está alicerçado em outras duas sínteses históricas aprovadas pelo Comitê Central: 50 anos de luta, de 1972, e PCdoB, 90 anos em defesa do Brasil, da democracia e do socialismo, de 2012.
Rabelo demonstra como as histórias do Partido e do país estão entrelaçadas e precisam se cruzar para se entender uma e outra. A síntese da história do PCdoB envolve uma íntima relação com a dinâmica da história nacional, mas também com a dinâmica interna de sua construção.
O presidente da Fundação destacou que, desde 1922, o Partido passou por vários processos de reorganização, atualizando sua estratégia e adequando-a às crises e transformações históricas e ideológicas, sempre mantendo sua coluna vertebral em defesa dos mesmos princípios.

Em 1962, um evento modesto revestiu-se de grande importância histórica, quando o Partido foi reorganizado diante das ameaças que se avizinhavam contra o movimento comunista brasileiro e internacional. Da mesma forma, no início dos anos 1990, diante das “apostasias no seio do movimento comunista”, foi capaz de manter sua identidade em meio ao abalo que outros partidos de esquerda sofriam em sua concepção.
O documento dos cem anos, apresentado por ele, também se soma a isso ao apresentar sínteses orientadoras da construção do Partido como contribuição para os múltiplos desafios da atualidade. É uma homenagem às gerações que construíram o Partido, desde Astrojildo Pereira, Luis Carlos Prestes, João Amazonas, o próprio Renato Rabelo, durante os ciclos progressistas do governo Lula, e, na atualidade, Luciana Santos, a primeira mulher a conduzir o Partido, ocupando a linha de frente da oposição ao bolsonarismo. Sob sua direção, o Partido tomou a iniciativa de construir a Frente Ampla para aglutinar as forças para derrotar os retrocessos.
O documento apresentado por Renato será debatido no final de maio no Comitê Central, quando a Fundação Maurício Grabois encaminhará para publicação.
O combate contra o retrocesso
A presidenta nacional do PCdoB, atual vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, fez sua apresentação demonstrando como os valores defendidos durante toda essa trajetória estão presentes no combate atual contra os retrocessos do Governo Bolsonaro. “Uma saga heroica com os pés no presente e os olhos no futuro”.

Uma trajetória de lutas em que o PCdoB atua sempre aliado a outras forças políticas democráticas. “Soube aprender com erros e renovar-se com lições da história”, observou ela, referindo-se ao modo como o Partido vai superando o sectarismo e aprendendo a unificar as forças progressistas em torno das demandas centrais da classe trabalhadora.
A dirigente também revela em sua manifestação como o Partido Comunista tem chegado ao centenário com um caráter contemporâneo, ao mesmo tempo. Para começar, a celebração do centenário se dá em meio “à intensa luta de classes e extremismo de direita”.
Luciana pontua como Bolsonaro joga para gerar crise institucional, ao questionar as eleições e ameaçar a democracia. Ele é um constante fator desestabilizador do país num momento em que o conflito na Ucrânia expressa a crise de hegemonia imperialista, e serve ao objetivo secundário de atingir a China.
O modo como, em um único mandato, o governo aumento a taxa Selic de 2% para 12%, sem conseguir reduzir a alta inflação, sem reduzir o desemprego e corroer o poder de compra do salário mínimo, são fatores que demonstram a dimensão da luta de classes que se impõe. Segundo a dirigente partidária, convivemos com uma epidemia de fome ignorada pela alienação do presidente. “Uma panela de pressão que pode explodir”, alerta.
Agora, o Partido indica para mais um apoio à pré-candidatura do ex-presidente Lula, atento à preocupação demonstrada nas pesquisas de que a população aponta o emprego, a renda e a saúde como os principais problemas a serem enfrentados. Junto com isso, as pesquisas revelam que Bolsonaro reduz sua rejeição e recupera parte do eleitorado, mesmo diante da maioria que considera a economia o principal problema do país.
Na seguda mesa o Partido Comunista do Brasil avaliou sua trajetória no tempo
O debate resgatou a história dos primórdios do Partido Comunista para avaliar acertos e erros, assim como peculiaridades de cada período, entrelaçadas com os eventos da história nacional.
O PCdoB nos ciclos da história
A mesa realizada no período da manhã de sábado teve como tema O PCdoB nos ciclos da história. Da fundação à atualidade. O escritor e ex-senador da Itália, José Luiz Del Roio, falou sobre a Fundação do Partido. Ele descreveu a personalidade e trajetória fundamental de Astrojildo Pereira, o principal articulador da fundação; os grupos comunistas que realizaram a arregimentação nos estados para a viragem da corrente anarquista para a comunista; e os primeiros anos da atuação partidária.
Mesa 2
Seu relato minucioso da trajetória de Astrojildo revela um esforço e genialidade que foi capaz de alavancar o Partido a um patamar muito acima daquele que teria, não fosse ele. Seu olhar atento ao que acontecia na Rússia e Europa estava além das possibilidades da maioria dos trabalhadores analfabetizados e da precariedade da informação recebida pelos anarquistas.
“Ele escrevia como um louco explicando quem é Lenin, Trotsky, Bukharin, e consegue convencer 76 pessoas de todo o país a montar o partido. Ele queria fazer parte da internacional comunista e mandou o Bernardo Canelas de Paris para Moscou para mostrar que eles existiam, atravessando guerra civil na Rússia”, relata Del Roio.

Ele institui a escola de partido, funda o jornal A Classe Operária, cria a juventude comunista e a revista da Juventude Operária e também funda a central sindical, a CGTB. “O que Astrojildo faz é infernal. Ele que vai na Bolívia, leva livros marxistas a Luis Carlos Prestes e o conduz ao Partido Comunista. Tudo tinha a mãozinha de Astrojildo”.
Em seguida, o professor aposentado da Unicamp e dirigente nacional do PCdoB, filósofo João Quartim de Moraes mostrou que o comunismo chegou ao Brasil antes do marxismo. A construção da corrente revolucionária de matriz marxist, atuou a partir da tradição das lutas brasileiras, das orientações da Internacional Comunista e, a seguir, interpretou o Brasil a partir do marxismo.
A professora e historiadora Marly Vianna afirmou que, numa leitura superficial, erramos muito, mas numa leitura da história do Brasil, da época e da sociedade brasileira, esses pioneiros da fundação do marxismo só têm que ser louvados. “Deram seu sangue e coração para o que havia de melhor na sociedade brasileira”.
Diz-se que o erro era a falta de base teórica, numa sociedade com maioria de analfabetos e com poucas publicações. Mas ela admite que o caráter da revolução brasileira não é enfrentada nos congressos, portanto, não tinham base segura no movimento operário.
Fernando Garcia, historiador e coordenador do Centro de Documentação e Memória — CDM, comentou como as efemérides do 25 de março foram capazes de produzir sínteses históricas fundamentais para a compreensão da história do Partido e orientar seus rumos.
Através destas sínteses é possível distinguir seis etapas da história do PCdoB. Ele comenta a importância dos documentos dos 30 anos, em 1952, publicado em A Classe Operária, de 5 de abril, com um roteiro cronológico para a história do PCB. É um documento que sistematizou as grandes lutas que antecederam à fundação do Partido, quando não havia livros ou revistas sobre isso.
No sábado à tarde foram realizadas mais duas mesas.
A primeira, Reconstrução nacional e a retomada do desenvolvimento soberano, foi conduzida pelo economista Sérgio Barroso e contou com a participação da Professora Leda Paulani, economista da USP, do professor Eduardo Costa Pinto (Economia Política e Economia Brasileira do Instituto de Economia (IE) da UFRJ) e do economista Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES.

A professora Leda Paulani apresentou um histórico da formação econômica do Brasil destacando o caráter submisso da inserção do país na economia mundial. Ela chamou a atenção para a intensa financeirização da economia brasileira. Junto com a finaceirização, nos temos o esfacelamento da indústria”, disse ela.
Mesas 3 e 4
O professor Eduardo Costa Pinto fez uma análise da situação da economia brasileira atual. Ele constatou que a indústria de transformação teve uma redução mas, segundo ele, a parte que ficou é beneficiária de altas taxas de lucro. “Não só de lucro, mas também da massa de lucro”, destacou o economista. Ele relacionou este fato ao apoio que Bolsonaro tem recebido de parte da elite brasileira.

O professor Luciano Coutinho, baseado em sua experiência à frente do BNDES, fez uma radiografia detalhada da indústria brasileira, apontando os setores que mais se desestruturaram. Coutinho citou o exemplo de empresas como a WEG e a Embraer e avaliou que o Brasil pode aproveitar as oportunidades que se abrem com o desarranjo da economia mundial.
No final do dia, na mesa 4, A alternativa socialista, conduzida pela Doutora Mariana Moura, participaram Luís Fernandes, professor da UFRJ e da PUC-RJ, Ana Prestes, cientista política, Secretaria de Relações Internacionais do PCdoB, Elias Jabbour, professor da Uerj e pesquisador, e Carlos Lopes, escritor, jornalista e diretor do jornal Hora do Povo.
Luís Fernandes destacou que as contradições do capitalismo, com a maior concentração do capital, maior desigualdade e aumento da miséria no mundo colocam a necessidade da superação do capitalismo. Ele considera que “as condições para essa superação estão mais difíceis em função do colapso do campo socialista” e apontou que o caráter rentista dos países centrais fazem com que eles percam dinamismo econômico.

O professor Elias Jabbour fez relatos sobre suas pesquisas de 26 anos sobre o socialismo na China. Ele destacou que os milhares de projetos conduzidos simultaneamente por 96 conglomerados estatais chineses e 30 bancos de investimento públicos são uma nova forma de conduzir o país na superação do capitalismo. Ele considera que uma economia com essas características é imparável. ” A China mudou e elevou a capacidade de domínio humano sobre a natureza”, disse ele.
Ana Prestes falou sobre as experiências de socialismo no mundo, particularmente na América Latina. Ela destacou também que a questão do meio ambiente e as ameaças de destruição do planeta não têm solução nos marcos do capitalismo. Para a debatedora, é importante discutir o socialismo com as massas populares no Brasil. Ela acha que pessoas do partido que romperam a “bolha” e que têm maior visibilidade devem fazer essa discussão.
Carlos Lopes fez uma análise das relações de produção predominantes no Brasil. Segundo ele, elas não são apenas relações de produção capitalistas, mas relações de produção capitalistas dependentes, sendo este último aspecto, o de sua subordinação às relações capitalistas dos países imperialistas, o principal.
Ele destacou que isto tem uma decorrência prática.
Existem duas maneiras de abordar o nosso problema, considerando o ângulo que escolhi. Uma, é ressaltar que se as mudanças nacionais e democráticas – isto é, o nacional-desenvolvimentismo – não tiverem uma orientação para o socialismo, poderão regredir, ou, mesmo, inevitavelmente, regredirão; a outra é sublinhar que não existe como chegar ao socialismo, no Brasil – e em países como o Brasil – senão através da luta e realização das mudanças nacionais e democráticas.
Então, diz ele, “a nossa questão é desbravar a vereda para o socialismo no Brasil, considerando que, no nosso caso, a revolução ainda não foi realizada. Portanto, temos que partir da situação anterior ao socialismo”.
Em breve, teremos a mesa final do seminário sobre a construção partidária.
Com informações da Fundação Maurício Grabois e Portal Vermelho