O relatório apresentado na quinta-feira (12) pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) na Comissão Especial da Previdência fala por si mesmo. Além de manter a absurda elevação da idade mínima para aposentadoria, o próprio governo admite que, com as modificações introduzidas pelos parlamentares, vão continuar sendo retirados R$ 913,4 bilhões da Previdência Social em dez anos para transferir esses recursos ao sistema financeiro.
Mesmo com as mudanças arrancadas pelo bom trabalho feito pela oposição dentro e fora do Congresso, o golpe de Paulo Guedes e Bolsonaro na Previdência segue sendo desumano, desastroso, além de cruel com os trabalhadores e com a economia do país. Vão ser retirados bilhões da população para esterilizar esses recursos na especulação financeira.
E, para poder desviar dinheiro para saciar os bancos, o relator propõe uma saída no mínimo cínica para o rombo que eles querem criar na Previdência: cobrir o roubo com recursos dos próprios trabalhadores.
Samuel Moreira propôs a transferência de 40% de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para a Previdência Social. Além de retirar os recursos que são destinados ao pagamento do seguro desemprego e aos financiamentos do BNDES, ele propôs elevar em cinco pontos percentuais a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições financeiras.
O aumento da idade mínima significa, para a maioria dos trabalhadores, estabelecer a morte como limite para o trabalho. Em relação às regras atuais, as mulheres terão que trabalhar mais 7 anos e os homens mais 5 anos para poderem se aposentar pelo teto.
Ou, como disse o deputado Pompeo de Matos (PDT-RS), na reunião da comissão desta quinta-feira (13). “O que eles querem é que a aposentadoria fique pela hora da morte”, denunciou o parlamentar.
Pelo que ficou mantido no relatório, seria proibida a aposentadoria antes dos 62 anos para as mulheres e 65 anos para os homens.
E, não é só isso. Haverá, a cada quatro anos, um aumento automático dessa idade mínima, de acordo com o aumento da expectativa de vida, tornando a vida – o seu prolongamento – uma maldição.
Além da idade mínima – isto é, da proibição da aposentadoria por tempo de contribuição – será exigido do trabalhador 20 anos de contribuição para homens e 15 anos para mulheres. Repetindo, somente para frisar: a aposentadoria por tempo de contribuição seria proibida, mas, do trabalhador que chegasse à idade mínima, seria exigido tempo mínimo de contribuição.
Mesmo com a redução de 20 para 15 anos de contribuição mínima para mulheres poderem se aposentar, a proposta é uma injustiça sem tamanho com os mais pobres que terão que trabalhar mais e receber menos.
O valor da aposentadoria será rebaixado para apenas 60% da média das contribuições do trabalhador. Para receber 100% da média das contribuições o trabalhador teria que ter, além de 65 anos (ou 62, no caso das mulheres), nada menos que 40 anos de contribuição. O que significa isso? Significa promover a cova no cemitério a lugar mais provável para a aposentadoria dos trabalhadores
O próprio governo divulgou recentemente alguns dados – é certo que, depois de muita pressão por parte dos deputados – revelando que 80% dos recursos que vão ser retirados da Previdência Social para os bancos vão sair dos aposentados e pensionistas mais pobres.
E quando apareceram esses cálculos, a área econômica do governo chegou ao número de R$ 1.236,5 trilhão. Ou seja, o que deixou de ser retirado com as mudanças do relatório, segundo o próprio governo, foram somente R$ 322 bilhões.
É certo que o enterro do desastro sistema de capitalização, que Paulo Guedes queria impor ao país, significa uma vitória importante, já que ela representava a destruição da Previdência pública e a entrega das aposentadorias para arapucas especulativas. Além disso, o modelo fracassou em praticamente todos os países onde foi implantado.
No Chile, país que vivenciou o inferno da capitalização, os aposentados caíram na miséria, os índices de suicídio entre idosos explodiu e o povo está nas ruas para enterrar o modelo.
As outras medidas que foram retiradas da proposta original do Planalto eram tão escandalosas que o próprio governo havia deixado escapar que eram propostas para serem negociadas.
A redução do Benefício de Prestação Continuada, a aposentadoria rural, apesar de manter a idade atual, aumentou o tempo mínimo para 20 anos para homens, e o recuo na perseguição dos professores faziam parte desses absurdos. Sem dúvida que, mesmo já esperados, esses avanços foram importantes, mas, nitidamente, insuficientes.
Impedir a desconstitucionalização das regras previdenciárias também foram importantes.
O que o país precisa para sair da grave crise em que se encontra são aposentadorias maiores, salários melhores, mais empregos, mais consumo das famílias e aumento da produção industrial. Cortando aposentadorias, o governo está indo na contramão do desenvolvimento. Ele está, na verdade, agravando a crise econômica em que o país está submerso.
Com a greve desta sexta-feira, dia 14 de junho, o povo dá mostras de que está determinado a enterrar o estrago que Bolsonaro quer fazer na Previdência.
Vejam como ficaram as propostas
Idade mínima para trabalhador urbano
Proposta do governo: a idade mínima de 62 anos para mulheres e de 65 anos para homens após o período de transição, com tempo mínimo de contribuição de 20 anos para ambos os sexos.
Relatório: idades mínimas mantidas, com tempo de contribuição de 20 anos para homens e 15 anos para as mulheres.
Regra de transição
Proposta do governo: no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que abrange os trabalhadores do setor privado, a PEC prevê três regras de transição para o setor privado: sistema de pontos por tempo de contribuição e por idade, aposentadoria por tempo de contribuição para quem tem pelo menos 35 anos de contribuição (homens) e 30 anos (mulheres) e pedágio de 50% sobre o tempo faltante pelas regras atuais, desde que restem menos de dois anos para a aposentadoria.
Para o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), dos servidores públicos, o texto estipula um sistema de pontuação que permitiria a aposentadoria a partir dos 61 anos para homens e 56 anos para mulheres. A partir de 2022, as idades mínimas subiriam para 62 anos (homens) e 57 anos (mulheres). Nesse caso, no entanto, os servidores receberiam um valor mais baixo. Os trabalhadores públicos que entraram até 2003 precisariam trabalhar até 65 anos (homens) e 62 anos (mulheres) para terem direito à integralidade (último salário da ativa) e paridade (mesmos reajustes salariais dos ativos).
Relatório: o texto acrescentou uma regra de transição que valerá tanto para o serviço público como para a iniciativa privada. Os trabalhadores a mais de dois anos da aposentadoria terão um pedágio de 100% sobre o tempo faltante para terem direito ao benefício. No caso dos servidores públicos que entraram antes de 2003, o pedágio dará direito à integralidade e à paridade.
Aposentadoria rural
Proposta do governo: idade mínima de 60 anos para a aposentadoria de homens e mulheres, com 20 anos de tempo de contribuição para ambos os sexos.
Relatório: mantidas as regras atuais, com 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, incluindo garimpeiros e pescadores artesanais. Apenas o tempo mínimo de contribuição para homens sobe para 20 anos, com a manutenção de 15 anos para mulheres.
Professores
Proposta do governo: idade mínima de 60 anos de idade para a aposentadoria de homens e mulheres, com 30 anos de tempo de contribuição.
Relatório: idade mínima de 57 anos para mulheres e 60 anos para homens, com definição de novos critérios por lei complementar. Regra vale para professores do ensino infantil, fundamental e médio.
Capitalização
Proposta do governo: Constituição viria com autorização para lei complementar que instituirá o regime de capitalização.
Relatório: proposta retirada.
Benefício de Prestação Continuada (BPC)
Proposta do governo: idosos de baixa renda receberiam R$ 400 a partir dos 60 anos, alcançando um salário mínimo somente a partir dos 70.
Relatório: proposta retirada, com manutenção de um salário mínimo para idosos pobres a partir dos 65 anos.
Abono salarial
Proposta do governo: pagamento restrito aos trabalhadores formais que ganham um salário mínimo, contra dois salários mínimos pagos atualmente.
Relatório: pagamento aos trabalhadores de baixa renda (até R$ 1.364,43 em valores atuais).
Pensão por morte
Proposta do governo: pensão por morte começaria em 60% do salário de contribuição, aumentando 10 pontos percentuais por dependente até chegar a 100% para cinco ou mais dependentes. Retirada da pensão de 100% para dependentes com deficiências intelectuais ou mentais. Apenas dependentes com deficiências físicas receberiam o valor máximo.
Relatório: mantém nova fórmula de cálculo, mas garante pensão de pelo menos um salário mínimo para beneficiários sem outra fonte de renda. Pagamento de 100% para beneficiários com dependentes inválidos (deficiência física, intelectual ou mental) e para dependentes de policiais e agentes penitenciários da União mortos em serviço.
Salário-família e auxílio-reclusão
Proposta do governo: pagamento restrito a beneficiários com renda de um salário mínimo.
Relatório: pagamento a pessoas de baixa renda (até R$ 1.364,43 em valores atuais).
Reajuste de benefícios
Proposta do governo: eliminava trecho da Constituição que preservava a reposição das perdas da inflação.
Relatório: manutenção do reajuste dos benefícios pela inflação.
Estados e municípios
Proposta do governo: PEC valeria automaticamente para servidores dos estados e dos municípios, sem necessidade de aprovação pelos Legislativos locais.
Relatório: retirada de estados e municípios da PEC, com a possibilidade de reinclusão dos governos locais por meio de emenda na comissão especial ou no Plenário da Câmara.
Incorporação de adicionais
Proposta do governo: PEC não aborda assunto.
Relatório: extensão aos estados e municípios da proibição de incorporar adicionais por cargo de confiança ou em comissão ao salário dos servidores, vedação que existe em nível federal.
Acúmulo de benefícios
Proposta do governo: limite para acúmulo de benefícios a 100% do benefício de maior valor, somado a um percentual da soma dos demais, começando em adicional de 80% para um salário mínimo e caindo para 0% acima de benefícios de mais de quatro salários mínimos. Médicos, professores, aposentadorias do RPPS ou das Forças Armadas ficam fora do limite por terem exceções estabelecidas em lei.
Relatório: altera para 10% adicional para benefícios acima de quatro salários mínimos, mantendo os demais pontos.
Encargos trabalhistas
Proposta do governo: possibilidade de incidir desconto para a Previdência sobre vale alimentação, vale transporte e outros benefícios trabalhistas.
Relatório: proposta retirada.
Aposentadoria de juízes
Proposta do governo: PEC não abordava assunto.
Relatório: retirada da Constituição da possibilidade de pena disciplinar de aposentadoria compulsória para juízes.
Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT)
Proposta do governo: PEC não abordava assunto.
Relatório: repasse de 40% das receitas do FAT para a Previdência Social, atualmente esses recursos vão para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Tributo para bancos
Proposta do governo: PEC não abordava assunto.
Relatório: elevar de 15% para 20% a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) das instituições financeiras, retomando a alíquota que vigorou de 2016 a 2018.