
O presidente russo Vladimir Putin rechaçou categoricamente, durante o Fórum de São Petersburgo, a acusação feita pela equipe de investigação holandesa-australiana (JIT, na sigla em inglês) de que veio de uma base na Rússia o míssil que derrubou o Boeing 777 da Malasia Airlines sobre o Donbass em julho de 2014, matando todas as 298 pessoas a bordo. “Você está dizendo que não era um míssil do exército russo?”, indagou o editor-em-chefe da Bloomberg, John Micklethwait. “Certamente não”, ressaltou Putin.
O presidente russo reiterou as contestações de Moscou sobre a investigação do caso: exclusão sumária da Rússia da investigação, aparente rejeição das evidências aportadas pela Rússia e o uso das assim-chamadas ‘fontes abertas’, isto é, redes sociais.
Para a Rússia, a investigação foi tendenciosa, o que fica claro pela inclusão da Ucrânia na equipe de investigação, quando, como parte dos combates no leste sublevado pós-golpe em Kiev, podia ser responsável pela derrubada do avião. A investigação também não questionou porque Kiev não suspendera os vôos de passageiros sobre a região conflagrada.
“A menos que haja uma investigação ampla, será muito difícil para nós aceitar as conclusões da comissão que está trabalhando sem nós”, advertiu Putin. Após dizer que se tratou de uma “terrível tragédia”, o presidente russo lembrou como em 2001 o exército ucraniano acidentalmente derrubou um avião de passageiros russo que voltava de Israel, matando todos os 78 passageiros e tripulantes.
Também o ministério da Defesa russo contestou as alegações do JIT e afirmou que os números de série dos fragmentos do míssil indicam se tratar de um míssil dos arsenais ucranianos. Conforme os fragmentos exibidos pelos holandeses, o míssil foi produzido em 1986 na era soviética, mas em 2011 esse tipo foi descomissionado e não era mais usado pelo exército russo.
As “fontes abertas” são uma referência a postagens do site Bellingcat, que foi o primeiro a alegar que o Buk que derrubou o MH17 veio de uma base russa – e que também asseverava que não havia sistemas Buk em posse do exército ucraniano, uma mentira desmascarada pela Rússia. A Ucrânia herdou 20 sistemas antiaéreos Buk da União Soviética e Moscou exibiu fotos de Buks ucranianos posicionados na região nos dias que antecederam a tragédia.
Aparentemente, o JIT também ignorou o estudo e as provas enviadas pelo fabricante do sistema Buk, Almaz-Antey, uma empresa russa, que demonstrou em um experimento em tempo real que o projétil que atingiu o MH17 era de uma geração mais antiga e não mais em operação com os militares russos.O estudo, que analisou o ângulo de impacto dos projéteis na cabine do mal-fadado vôo, mostrou ainda que a mais provável localização do local de lançamento somente poderia estar em território controlado por Kiev. A Rússia também entregou ao JIT dados intocados de radar russo na área, do dia da derrubada, que foram ignorados.
Mas para o JIT, que não diz como prova isso, o sistema Buk veio da 53ª Brigada russa, foi transportado para o leste da Ucrânia, usado para abater o avião da Malasia e em seguida retornou à Rússia. Uma história contada na época pelo Bellingcat mas jamais provada. Moscou reafirma que nenhum sistema antiaéreo russo cruzou a fronteira. O principal ‘investigador’ da Bellingcat se recusou na época a debater suas “conclusões” com o internacionalmente conhecido especialistas de armas do MIT, Theodore Postol.
O chanceler russo, Sergei Lavrov, que entrou em contato com o ministro do Exterior holandês logo após a divulgação do “resultado” do JIT, declarou que Moscou não rejeitaria a cooperação no caso MH17, mas somente se os dados que proveu forem incluídos também. Ele comparou o caso com o escândalo Skripal, em que Londres fez alegações sem base e jogou a culpa sobre Moscou, mas não providenciou qualquer prova.
“Se nossos parceiros decidiram especular sobre este caso, quando se trata da mais séria tragédia humana, a morte de centenas de pessoas, para atingir seus objetivos políticos, eu deixo isso para suas consciências”, afirmou Lavrov.