O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, determinou que o governo apresente um plano de vacinação contra a Covid-19, no prazo de 30 dias.
O magistrado analisou dois pedidos apresentados pela REDE, PCdoB, PSOL, PT, PSB e Cidadania após o presidente Jair Bolsonaro desautorizar o protocolo assinado pelo Ministério da Saúde com a intenção de adquirir 46 milhões de doses da vacina CoronaVac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan, do governo de São Paulo.
Para Lewandowski, o governo Bolsonaro não pode adotar “critérios políticos, partidários ou ideológicos” na escolha das vacinas contra a Covid-19.
Segundo o ministro, “os impactos positivos que as campanhas de vacinação têm no Brasil e no mundo, contribuindo para conservar a saúde e salvar vidas de milhões de pessoas e, ainda, para minorar os custos dos tratamentos médico-hospitalares”.
De acordo com Lewandowski, em 30 dias o governo deve apresentar “plano compreensivo e detalhado acerca das estratégias que está colocando em prática ou pretende desenvolver para o enfrentamento da pandemia desencadeada pelo novo coronavírus, discriminando ações, programas, projetos e parcerias correspondentes, com a identificação dos respectivos cronogramas e recursos financeiros, de maneira a assegurar a oferta e distribuição tempestiva, universal e gratuita de vacinas, em qualidade e quantidade suficiente para a imunização de toda a população brasileira”.
O ministro define ainda que o governo assegure “a maior cobertura vacinal possível, no limite de suas capacidades operacionais e orçamentárias”.
O governo federal deverá, segundo o ministro do Supremo, atualizar o plano a cada 30 dias até o fim de 2021.
A ação apresentada pela Rede Sustentabilidade pede que o governo “apresente, em 48 horas, planos de aquisição de vacinas que contemplem todas as alternativas viáveis”.
As outras legendas solicitam que o governo Bolsonaro anuncie, em até 30 dias, os planos e programas em relação à vacina contra a Covid-19.
Elas ainda pedem que o governo e o presidente “sejam obrigados a fazer todos os procedimentos administrativos indispensáveis para que a União possa, com a segurança científica, técnica e administrativa necessárias, providenciar a aquisição das vacinas e medicamentos que sejam admitidas e aprovadas pela Agência de Vigilância Sanitária”.
PLANEJAMENTO
Outra questão fundamental para a vacinação acontecer, além da vacina propriamente dita, é a necessidade de planejamento da distribuição e oferta de insumos como seringas e agulhas.
O professor de ciências farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) Marco Antônio Stephano afirma que os governos federal e subnacionais ainda estão muito centrados no debate sobre o desenvolvimento da vacina e não têm se preparado para recebê-la com materiais simples, o que pode ser um gargalo na hora de vacinar a população. “O Brasil já realiza campanhas de vacinação grandes, com cerca de 300 milhões de doses todos os anos, e que não vão parar. Terão de acontecer em paralelo à do coronavírus. Se não houver planejamento, pode faltar o básico: seringa e agulha”, diz Stephano.
Para o professor da USP, com o dobro de doses no Plano Nacional de Imunizações (PNI) e outras iniciativas concorrentes, haverá sobrecarga no mercado de produtos médico-hospitalares.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde (Abimed), Fernando Silveira, denuncia que os fabricantes de agulhas e seringas ainda não receberam nenhuma encomenda ou sinalização por parte de governos ou do SUS, o que pode trazer dificuldades em caso de aumento repentino na demanda.
“As medidas necessárias para que não tenhamos falta de agulhas e seringas passam necessariamente por planejamento. Seria fundamental que os entes federativos, governo federal, estados e municípios iniciassem de imediato um processo de licitação e definição clara das quantidades que serão necessárias, para fazer a vacinação em massa da população brasileira. E para que ela não seja mais uma vez prejudicada ”, explicou Silveira.
O mercado brasileiro de seringas e agulhas, diz Silveira, é dominado pelas fabricantes Becton Dickinson (BD), Saldanha Rodrigues (SR) e Injex. As três, diz Silveira, têm capacidade instalada para produzir 1,5 bilhão de kits ao ano, sendo 1,2 bilhão de unidades a demanda padrão, sem pandemia. “O setor opera com 80% da capacidade, sem muita margem para cobrir mais pedidos de uma hora para outra. Passa da hora de os entes federativos prepararem o setor, com sinalização formal sobre qual será a demanda e o prazo para a entrega dos produtos”, assegurou.
“Com duas doses por pessoa, para imunizar 90% da população, são quase 400 milhões de vacinas a mais”, calcula. Segundo ele, países como Estados Unidos e Canadá já aumentaram a compra de seringas. “Todos sabem que estamos em um ponto de virada, com vacinas na fase três de testes. Nenhum país quer dormir no ponto com coisa tão básica”, afirmou.
O sanitarista e fundador da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Gonzalo Vecina diz que, se o país não conseguir produzir vacinas por meio de transferência tecnológica já no início de 2021, terá de envasar novas quantidades importadas, o que manteria a pressão sobre fabricantes de seringas.
Outro problema é o escalonamento dos grupos a serem vacinados, mas nem isso estaria definido, porque o conselho ao qual caberia tal planejamento foi descontinuado por decreto da presidência ainda no início de 2019. Vecina alerta para outras dificuldades além das seringas, como dificuldades para o armazenamento de vacinas que requerem temperaturas muito negativas. “A escolha por esses produtos seria desastrosa do ponto de vista logístico. Fala-se em gelo seco, mas, com certeza teremos problemas para encontrar quem produza tanto disso.”
Para o presidente da Abimed algumas medidas podem ser tomadas para evitar a falta desses insumos. E elas passam pela abertura de diálogo com o setor produtivo. “O Brasil tem capacidade suficiente para atender a demanda de seringas e agulhas, para a campanha de vacinação. Mas isso precisa ser feito de uma forma coordenada, planejada e com definições muito claras a respeito das quantidades necessárias e do prazo em que essas quantidades passarão a ser necessárias, visando o início da campanha de vacinação”. “A capacidade do Brasil é mais do que suficiente para atender essa demanda, mas para isso é necessário planejamento antecipado e principalmente compromisso dos entes públicos, com a