Bolsonaro perdeu o foro privilegiado ao ser derrotado na eleição presidencial
A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, enviou para a primeira instância oito pedidos de investigação contra Jair Bolsonaro por falas golpistas e racistas. O foro privilegiado acabou junto com o mandato presidencial. Luiz Fux e Edson Fachin também enviaram pedidos para outras instâncias.
A decisão sobre a abertura dos inquéritos caberá aos juizados de primeira instância. Bolsonaro é alvo de 16 pedidos de investigação no STF.
Cármen Lúcia explicou que já é consolidado o entendimento da Corte “de ser inaceitável em qualquer situação, à luz da Constituição da República, a incidência da regra de foro especial por prerrogativa da função para quem já não seja titular da função pública que o determinava”.
Em cinco dos sete processos, Jair Bolsonaro é acusado de estimular atos antidemocráticos em falas e ataques feitos contra os ministros do STF no dia 7 de setembro de 2021.
Na ocasião, Bolsonaro falou que o ministro Alexandre de Moraes não podia continuar “no poder exercendo cargos importantes” por estar investigando os ataques contra a democracia e a milícia digital.
“Acabou o tempo dele. Sai, Alexandre de Moraes. Deixa de ser canalha”, continuou Jair.
“Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá”, disse. No dia seguinte, apavorado com a reação de todo o país em defesa da democracia, Bolsonaro publicou uma carta, escrita pelo ex-presidente Michel Temer, pedindo desculpas.
Os pedidos de inquérito foram apresentados por partidos da então oposição e pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.
Outro caso que foi enviado para a primeira instância é o da fala racista de Jair Bolsonaro, em maio de 2022. Ele falou para um apoiador negro, que o esperou na frente do Palácio do Alvorada, que pesava “mais de sete arrobas”.
Arroba é a medida usada para pesar gado. Cada arroba equivale a cerca de 15 quilos.
Essa não foi a primeira vez que Jair Bolsonaro usou a medida arroba para falar de um negro, igualando-o a animais como o gado.
Em 2017, enquanto fazia uma palestra no Clube Hebraica, no Rio, ele contou sobre uma visita a um quilombo e disse que “o afrodescendente mais leve lá pesava 7 arrobas. Não fazem nada, eu acho que nem pra procriador servem mais”.
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, apontou que “‘arrobas’ e ‘procriador’ são termos utilizados para se referir a animais irracionais, a bichos e, portanto, eu penso que equiparar pessoas negras a bichos, eu considero, em tese, para fins de recebimento de denúncia, um elemento plausível de violação do artigo 20 da lei de crime racial”.
O último processo que foi transferido pela ministra Cármen Lúcia para a primeira instância se refere à participação de Jair Bolsonaro e seu ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, na motociata realizada nos Estados Unidos, no ano passado, na presença do foragido Allan dos Santos.
Allan dos Santos tem um mandado de prisão expedido pelo STF por ter organizado a milícia digital que ataca a democracia, mas está nos Estados Unidos para não ser preso.
Segundo o processo movido pelo deputado Alencar Santana (PT-SP) contra Bolsonaro e Torres, eles incorreram em prevaricação por terem se encontrado e não denunciado o criminoso foragido.
Sobre o assunto foram enviadas as petições 10363 e 10364, que haviam sido apensadas, apresentadas pela deputada federal Sâmia Bomfim e pelo deputado federal Orlando Silva a partir de suposta declaração racista de Bolsonaro a um homem negro que seria seu apoiador.
FUX e FACHIN
Outras ações contra Bolsonaro foram enviadas pelo STF para outras instâncias da Justiça.
A PET 9804 foi remetida pelo ministro Edson Fachin ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), para encaminhamento posterior a uma das varas criminais da Justiça do DF. É a queixa-crime do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) em que denuncia Jair Bolsonaro pela prática do crime de difamação em razão de publicação em redes sociais, em julho de 2021, que teria atribuído ao senador a negociação de vacinas Covaxin sem licitação, no contexto da pandemia da covid-19.
Uma outra é por injúria. O ministro Luiz Fux também determinou a remessa da PET 8352 ao TJDFT. Na queixa-crime, a ex-presidente da República, Dilma Rousseff, afirma que Bolsonaro ofendeu sua honra ao publicar vídeo no Twitter depreciando os trabalhos da Comissão da Verdade e praticando o crime de injúria.