O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para derrubar o trecho da legislação que permitia a venda de ouro de garimpo através da “presunção de boa-fé”.
O plenário virtual referendou a decisão do ministro Gilmar Mendes, que atendeu aos pedidos do PV, PSB e Rede para que o trecho da lei fosse considerado inconstitucional.
O julgamento, que acontece virtualmente, está em 6 a 0 a favor da mudança na legislação.
Já se posicionaram junto a Gilmar Mendes os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Edson Fachin e Dias Toffoli.
Ainda faltam os votos de Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e dos ministros que foram indicados por Bolsonaro, Kássio Nunes Marques e André Mendonça.
O trecho da legislação que está sendo derrubado permite que ouro extraído de forma ilegal, como em garimpos dentro de Terras Indígenas, seja comercializado nos meios legais, uma vez que “presume-se a legalidade do ouro adquirido” no ato da venda, sem comprovação legal do produto.
Especialistas e organizações ambientalistas apontam que essa “presunção de boa-fé” facilitou o trabalho dos criminosos que extraem ouro ilegalmente em invasões de territórios demarcados.
Para Gilmar Mendes, “as presunções relativas à legalidade do ouro adquirido e boa-fé do adquirente simplesmente sabotam a efetividade do controle de uma atividade inerentemente poluidora”.
“Não é difícil verificar que a simplificação do processo de compra de ouro permitiu a expansão do comércio ilegal, fortalecendo as atividades de garimpo ilegal, o desmatamento, a contaminação de rios, a violência nas regiões de garimpo, chegando a atingir os povos indígenas das áreas afetadas”, apontou Mendes.
O ministro, que já tem o apoio de cinco colegas, afirma que “é preciso que esse consórcio espúrio, formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas, seja o quanto antes paralisado”.
Com a decisão, o Supremo Tribunal Federal determina o prazo de 90 dias para que o governo federal apresente “um novo marco normativo para a fiscalização do comércio do ouro, especialmente quanto à verificação da origem legal do ouro adquirido”.
Além disso, devem ser anunciadas “medidas que inviabilizem a aquisição de ouro extraído de áreas de proteção ambiental e de Terras Indígenas”.
O governo Lula já prepara uma medida provisória (MP) para regular o tema.
O governo de Jair Bolsonaro, quando consultado sobre o assunto, defendeu o trecho da lei, dizendo que os partidos tinham apresentado a ação com “a intenção de criticar e desgastar a imagem da atual gestão, sem qualquer efetiva demonstração de inconstitucionalidade”.
Já a Procuradoria-Geral da República (PGR) defendeu a derrubada do trecho da legislação.
“Presumir a legalidade da origem do ouro, assim como a boa-fé das Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) adquirentes, representa suprimir estas do rol de instituições sujeitas aos mecanismos de controle” da legislação que combate a lavagem de dinheiro, “sem justificativa plausível, contemplando-se com regramento mais brando setor historicamente marcado por ilicitudes, com grande circulação de dinheiro, com retrocesso legislativo na repressão de ilícito dessa natureza”, defendeu.
Em janeiro, o governo Lula decretou situação de emergência depois de ser revelada a situação que seu antecessor deixou os indígenas da Terra Yanomami, em Roraima, por ter permitido invasões do garimpo ilegal. Mais de 500 crianças morreram nos 4 anos de governo Bolsonaro por doenças e fome. Os yanomamis foram encontrados gravemente desnutridos e doentes.
Depois de invadirem e degradarem o território, os garimpeiros levam o ouro extraído para ser vendido no mercado legal de minérios.
O garimpo ilegal chega a utilizar autorizações de extração da Agência Nacional de Mineração (ANM) referente a outros locais para conseguir vender o ouro obtido ilegalmente.
Somente em 2022, último ano em que Bolsonaro esteve na Presidência, o garimpo ilegal cresceu 54% na Terra Indígena Yanomami, enquanto 5.053 hectares foram desmatados pela atividade criminosa no território.