O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, atendeu ao pedido do PV, PSB e Rede e considerou inconstitucional o trecho da legislação que permite a venda de ouro sem necessidade de comprovação de legalidade na extração.
Para Mendes, esses trechos da legislação “não se mostram coerentes com o dever de proteção do meio ambiente”.
O 4º parágrafo do Artigo 39 da Lei 12.844/2013 diz que, no ato da compra de ouro, deve ser presumida “a legalidade do ouro adquirido e a boa-fé da pessoa jurídica adquirente”.
Esse trecho é apontado por especialistas e diversas entidades como um facilitador para o garimpo ilegal, que consegue vender o ouro extraído sem ter que apresentar nenhum documento que comprove a legalidade da atividade.
“As presunções (…) relativas à legalidade do ouro adquirido e à boa-fé do adquirente simplesmente sabotam a efetividade do controle de uma atividade inerentemente poluidora, uma vez que não apenas facilitam, como servem de incentivo à comercialização de ouro originário de garimpo ilegal”, afirmou Gilmar Mendes.
“Não é difícil verificar que a simplificação do processo de compra de ouro permitiu a expansão do comércio ilegal, fortalecendo as atividades de garimpo ilegal, o desmatamento, a contaminação de rios, a violência nas regiões de garimpo, chegando a atingir os povos indígenas das áreas afetadas”, acrescentou.
O ministro do STF explicou que “justamente por ser potencialmente danosa ao meio ambiente, a extração de recursos minerais deve ser precedida de autorização, permissão ou licença do poder público, que orientará a atividade de extração do minério e a necessidade de recuperação da área afetada”.
Mendes aponta que esse trecho é o caso de uma “emenda jabuti”, “emenda parlamentar que não tinha pertinência temática com a Medida Provisória originária”. O relator do PL foi o senador Eunício de Oliveira (MDB-CE).
Para o PV, esse trecho da lei “abre caminho” para que lojas e joalherias “comprem o metal e arquivem as informações fornecidas pelos vendedores (muitas vezes, posseiros e garimpeiros ilegais), sem nenhuma outra providência no sentido de comprovarem essas informações”.
Na avaliação do PSB e da Rede, o dispositivo quebra “princípios da moralidade, transparência, legalidade e eficiência”.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) também emitiu um parecer favorável à declaração de inconstitucionalidade do trecho da legislação.
“Presumir a legalidade da origem do ouro, assim como a boa-fé das Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) adquirentes, representa suprimir estas do rol de instituições sujeitas aos mecanismos de controle” da legislação que combate a lavagem de dinheiro, “sem justificativa plausível, contemplando-se com regramento mais brando setor historicamente marcado por ilicitudes, com grande circulação de dinheiro, com retrocesso legislativo na repressão de ilícito dessa natureza”.
BOLSONARO E O GARIMPO ILEGAL
A discussão sobre o garimpo ilegal tomou mais força depois que foi revelada a situação desumana como viviam os indígenas yanomamis devido às invasões em suas terras por parte do garimpo ilegal. Em janeiro, o governo Lula decretou estado de emergência para que os indígenas fossem atendidos.
Depois de invadirem e degradarem o território, os garimpeiros levam o ouro extraído para ser vendido no mercado legal de minérios.
De acordo com o portal Amazônia Real, os comércios se espalharam pela capital de Roraima, Boa Vista, formando “várias” novas “ruas do Ouro”, onde o comércio de material extraído ilegalmente acontece livremente. Os revendedores adquirem a grama de ouro vindo do garimpo a R$ 175 reais, mas o metal legalizado custa R$ 310 a grama.
O garimpo ilegal também utiliza de autorizações para extração referente a outros locais para comercializar o ouro ilegal. As PLGs (Permissão da Lavra Garimpeira) são emitidas pela Agência Nacional de Mineração (ANM), mas o órgão, demonstrado sob o governo Bolsonaro, não fiscalizava os locais referentes às PLGs.
Jair Bolsonaro e seus ministros já deram diversas declarações apoiando os garimpeiros ilegais e fazendo propostas que os beneficiam. Segundo o ex-presidente, “não é justo criminalizar o garimpeiro”.
Somente em 2022, último ano em que ele esteve na Presidência, o garimpo ilegal cresceu 54% na Terra Indígena Yanomami, enquanto 5.053 hectares foram desmatados pela atividade criminosa no território.