
Cinco dias após ser preso ilegalmente por Israel depois de submetido a um sequestro político em alto-mar, o ativista brasileiro Thiago Ávila desembarcou nesta sexta-feira (13) no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo. Ele foi capturado pela Marinha israelense em águas internacionais na madrugada da última segunda-feira (9), enquanto integrava uma missão humanitária da Coalizão Flotilha pela Liberdade com destino à Faixa de Gaza, carregando ajuda para civis palestinos.
Ávila e outros 11 ativistas de diferentes nacionalidades estavam a bordo da embarcação “Madleen”, que levava donativos como alimentos, medicamentos, muletas e próteses para crianças amputadas.
“A gente tentou o máximo que a gente pôde levar nossa missão humanitária, com alimentos, medicamentos, muletas, próteses para crianças amputadas, para o lugar onde elas estão mais necessitadas no mundo hoje. A gente foi impedido por um Estado racista, supremacista, que há oito décadas pratica racismo e limpeza étnica”, denunciou.
A interceptação ocorreu em águas internacionais, a mais de 100 quilômetros do destino, configurando uma violação do direito internacional segundo os organizadores da missão. A militante sueca Greta Thunberg, também presente na missão, foi deportada no dia 11. Ativistas da França, Alemanha, Holanda e Turquia também detidos pela ditadura israelense também foram expulsos. Dois membros do grupo, os franceses Pascal Maurieras e Yanis Mhamdi, ainda estão encarcerados na Prisão de Givon, com expectativa de deportação nos próximos dias.
Recebido no Brasil por sua esposa, sua filha de um ano e dezenas de apoiadores que exibiam bandeiras da Palestina e cartazes de solidariedade, Thiago foi saudado ao som de palavras de ordem como: “Livre, livre, livre Palestina, Palestina livre, fora sionistas”.
Na coletiva concedida ainda no aeroporto, Thiago relatou o que vivenciou nos cinco dias sob custódia israelense. Ele se recusou a assinar documentos em hebraico que o incriminavam por uma suposta entrada ilegal no país. Como retaliação, foi colocado em uma cela solitária por dois dias e fez greve de fome e sede como forma de protesto. “Eles ameaçaram me colocar em isolamento total e foi isso que fizeram. Fiquei dois dias lá dentro, sofri um processo de violência, mas não quero falar muito sobre isso porque nada se compara ao que os palestinos enfrentam”, declarou.
Ele vestia o uniforme fornecido pelos israelenses na prisão e descreveu a cela como uma masmorra que aparentava ser muito antiga, embora, segundo ele, tivesse cerca de 80 anos. Mesmo diante das violações, elogiou a atuação da diplomacia brasileira, que classificou como “extremamente solícita”.

Segundo Ávila, o governo israelense tentou utilizar a prisão dos ativistas como peça publicitária. “Israel tentou fazer uma manobra publicitária para vender a impressão de que os ativistas estavam sendo bem recepcionados”, disse. Mas, de fato, o grupo foi pressionado a assinar declarações falsas. “Não assinei nenhum documento. Determinaram meu banimento por cem anos”, afirmou.
Ele acredita que a presença da eurodeputada Rima Hassan impediu uma repressão ainda mais brutal. Mas mesmo assim, enfrentou agressões. “Tudo que eles têm são suas armas, seu ódio, seu exército”, denunciou.
Sobre a política israelense, foi direto: “Benjamin Netanyahu é o inimigo número 1 da humanidade hoje”. E reforçou que sua própria experiência deve ser vista com perspectiva. “A detenção pela qual passei é uma pequena fração do que mais de 10 mil palestinos, hoje encarcerados, passam. Entre essas pessoas, 300 são crianças.”
Ávila cobrou do governo brasileiro uma postura mais firme: “O povo palestino mostrou para o mundo o sistema que a gente vive”, apontando o imperialismo norte-americano como cúmplice, mas enfatizando: “o olhar mais cruel e odioso do colonialismo é o Estado sionista de Israel”. Para ele, o momento exige decisão: “A gente está vivendo um momento decisivo na história da humanidade. Cabe a nós deter esse processo.”
Ao comentar as motivações ideológicas por trás da repressão israelense, Ávila foi taxativo: “No fim das contas, não tem nada a ver com religião, é uma ideologia: o sionismo. Essa ideologia precisa ser desafiada e derrotada a partir da união de todo mundo, juntando todas as ações de rua, com pressões nas redes, missões como Flotilha, marchas por Gaza. Todo mundo tem que estar junto nessa batalha”.
Sobre sua participação na causa palestina, afirmou: “Isso não tem nada a ver com herói. A gente não precisa de heróis, precisa de solidariedade, de amor, de humanidade”. E se definiu apenas como um “aliado do povo palestino”.
O ativista também ressaltou a necessidade de distinguir antissemitismo de antissionismo. “Há judeus em todo o mundo apoiando os palestinos e se opondo ao massacre promovido por Israel”, afirmou. E completou: “O imperialismo britânico e o sionismo destruíram esse sonho de viver em paz”. Ele reiterou que a resposta deve ser coletiva: “A resposta que os opositores de Israel dão é a corrente de solidariedade, afeto, amor e a persistência”.