Nesta última terça-feira (10), começou a ser desenhado o esboço de um posicionamento comum entre Mário Bernardini, membro do Conselho Superior de Economia da Fiesp, e representantes de quase uma dezena de entidades de trabalhadores, entre as principais centrais e confederações do país. No encontro, Mário Bernardini apresentou um documento aos trabalhadores, “com prazo necessário para debater e aberto a adendos, sem parcimônia”.
Bernardini declarou que gostou bastante da discussão, corroborou com a opinião dos dirigentes sindicais e enfatizou o quadro de desalento com a estagnação do país há 40 anos de política neoliberal e o contraste com o crescimento de 7,5% nos 20 anos anteriores. Para ele, enquanto o lucro em aplicações financeiras for maior que o investimento na produção, não há como se falar em desenvolvimento econômico. Nas próximas edições do HP, traremos a reportagem completa dos debates da reunião.
Mario Bernardini comunicou aos sindicalistas que recomendaria a realização do encontro com o presidente da Fiesp, Josué Gomes, a quem apresentou o documento que publicamos a seguir. Este seria, então, “com as contribuições dos trabalhadores, a base de uma campanha nacional de esclarecimento da nação sobre urgência de um projeto de desenvolvimento nacional”, sem os entraves do neoliberalismo.
De acordo com Bernardini, o texto “apenas pretende ser um roteiro, sem nenhuma intenção de esgotar o assunto. Está aberto a receber críticas e sugestões para melhorá-lo”.
CARLOS PEREIRA
UM PROJETO PARA O BRASIL
Justificativa
Na segunda metade do século passado e, mais precisamente, entre os anos de 1950 e 1980, o Brasil cresceu à taxa média de 7,1% ao ano, quase o dobro da média mundial. Entretanto, a partir dos anos 80, passamos a crescer, consistentemente, abaixo do mundo, perdendo espaço no PIB mundial, onde nossa participação caiu de 4,3% em 1980, a 2,5%, em 2020.
Não somente crescemos pouco, mas, nas duas décadas conhecidas como perdidas, ou seja, a de 80 a 90, e a de 2010 a 2020, houve queda na renda per capita dos brasileiros. Nestas quatro décadas, passamos de um país conhecido como o “país do futuro” para um país onde um terço da população está abaixo da linha de pobreza, vivendo basicamente de repasses públicos.
Os efeitos colaterais do baixo crescimento são muitos, e podem ser vistos e sentidos, no dia a dia. Os brasileiros tinham, em 1980, uma renda média 60% superior à renda média mundial, enquanto, hoje, estamos abaixo da media mundial. Em resumo, neste período, passamos de um país emergente para um país submergente, que não mais almeja vir a ser um país desenvolvido.
Objetivo
O objetivo do projeto é o bem-estar e a prosperidade da sociedade brasileira que, face ao exposto, passa, obrigatoriamente, pela retomada do crescimento econômico sustentado, a taxas médias maiores da média do crescimento do PIB global, com simultânea redução das desigualdades, distribuição de renda, e nivelamento no acesso às oportunidades.
Meios, instrumentos e metas
Meios: as experiências dos países que tiveram sucesso em seus modelos de desenvolvimento, especialmente no sudeste asiático, e as recentes iniciativas dos principais países desenvolvidos para estimular seu próprio desenvolvimento apontam, ambas, para o resgate do papel do Estado como planejador, coordenador e indutor da atividade econômica.
O Estado deve, além de garantir um ambiente macroeconômico estável, e um ambiente de negócios que estimule o investimento privado, reduzir fortemente a insegurança jurídica, e eliminar as ineficiências sistêmicas que levam o Brasil a acrescentar mais de 30 pontos percentuais a nossos custos, quando comparados com nossos principais concorrentes externos.
Em resumo, é necessário que, após quatro décadas de interregno neoliberal, o Estado retome seu protagonismo como planejador de longo prazo, capaz de propor e implementar as políticas públicas necessárias para a retomada do desenvolvimento sustentado, tendo em vista uma maior autonomia tecnológica e produtiva, dentro do paradigma da transição verde.
Instrumentos: Os preços básicos de nossa economia devem estar alinhados aos de nossos principais concorrentes, para termos as condições mínimas de competir com eles. Juros reais de mercado e um sistema tributário equivalentes à média da OCDE e câmbio competitivo e pouco volátil, são condições obrigatórias para o Brasil poder retomar seu crescimento.
E, como o investimento de hoje é tido como o maior responsável, tanto do aumento da produtividade, quanto do crescimento futuro, será necessário tornar atrativo o investimento privado, hoje em desvantagem face aos investimentos financeiros que, em média, tem menor risco, maior rentabilidade, prazo de retorno mais rápido, e tratamento fiscal mais favorável.
Assim, tratar de forma isonômica todo e qualquer tipo de investimento, e taxar igualmente qualquer tipo de renda, independentemente de sua origem é o ponto de partida para não distorcer a alocação de capital entre os setores da economia. Temos que entender, por mais óbvio que seja, que o custo de capital dos investimentos produtivos, não pode ser superior ao retorno médio das empresas.
Por outro lado, a história mostra que os países que se tornaram ricos, ou que estão no caminho para se tornarem desenvolvidos, tiveram, e tem, na indústria seu principal instrumento para criar empregos de qualidade, desenvolver tecnologia e aumentar sua produtividade, inclusive por ela ter capacidade de transbordar estes efeitos para os demais setores da economia.
Metas: as principais metas, dentro do objetivo de melhorar a prosperidade e a qualidade de vida da sociedade brasileira, serão metas sociais, como emprego formal, renda do trabalho, escolaridade e desempenho escolar, desigualdade de renda, desenvolvimento humano, qualidade nos serviços públicos como saúde, segurança, acesso ao saneamento básico, à internet de banda larga.…
As metas deverão expressar de forma realista, mas ambiciosa, onde estaremos no fim do arco de tempo coberto pelo projeto, que não deverá ser inferior a doze anos. Elas serão acompanhadas através de indicadores ou métricas, comparáveis internacionalmente, com metas intermediárias ao longo do cronograma. Elas serão elencadas e quantificadas no anexo a este documento.