
Entidades do movimento negro de Araraquara se reuniram em ato contra a fala racista do vereador Balda (Novo) sobre a gestão do ex-prefeito de Araraquara, Edinho Silva (PT), foi uma “administração negra”. As entidades e vereadores protocolam denúncia no Comitê de Ética da Câmara Municipal, nesta quarta-feira (28).
Em uma transmissão ao vivo realizada em 22 de maio, Balda (Novo) afirmou que a gestão do ex-prefeito de Araraquara, Edinho Silva (PT), foi uma “administração negra” para justificar a proposta de reajuste salarial para os servidores municipais abaixo das expectativas da categoria.
“Tudo isso porque Araraquara teve uma administração ‘negra’, e isso eu falo de boca cheia porque acompanhei. Foi uma administração ‘negra’ a do ex-prefeito [Edinho Silva], que deixou Araraquara arrasada, aniquilada, quebrada, com um bilhão e noventa e dois milhões de reais em dívidas”, afirmou Balda.
O vereador afirmou que supostas dívidas deixadas pelo ex-prefeito teriam comprometido uma proposta de reajuste melhor para o funcionalismo. “É dívida para todo lado, vocês não têm noção. É dívida no transporte, é pedalada na saúde, são notas sem empenho. As obras… o Orçamento Participativo é a maior mentira do mundo. O dinheiro desapareceu e as obras não foram concluídas. Então, Araraquara está um verdadeiro caos em virtude da pior administração da história“, declarou.
REPÚDIO
O vereador Guilherme Bianco (PCdoB) destacou que a fala proferida pelo vereador Balda é inaceitável. “Utilizar a palavra ‘negra’ como adjetivo pejorativo demonstra uma mentalidade racista enraizada e que expressa na linguagem uma ideologia de origem escravocrata. É chocante e inadmissível que uma figura pública, no cargo de vereador não seja comprometida com a luta antirracista e, sobretudo, não se responsabilize pelas suas atitudes, com notas e falas se jusficando e não dando o devido valor a fala proferida”, disse.
“O que aconteceu foi grave e reflete a ausência de consciência sobre um dos períodos mais graves da história brasileira e dos impactos do racismo, de fala que hoje é relativizada e tratada como natural e sem importância. Isso é digno de uma exemplar punição. A Câmara de Araraquara não pode dar espaço para o racismo em nenhuma de suas expressões”, completou.
Para a presidente da Associação Cultural dos Amigos Afrodescendentes de Araraquara e Região, Alessandra Laurindo, afirmou que a fala do vereador foi racista e irresponsável e destacou que o ato de hoje na Câmara mostrou a força do movimento negro e sua combatividade.
“O ato na Câmara hoje foi muito potente e mostrou a força da comunidade Negra. Mostrou o quão a fala racista e preconceituosa [do vereador Balda] nos atravessou. Diante disso não ficamos inertes. Fomos cobrar da Comissão de Ética a responsabilização do vereador. Ele enquanto figura pública precisa dar exemplo.
Alessandra ressaltou, também, que os manifestantes presentes apresentaram como exigência o Letramento Racial de todos os vereadores como forma de combater e prevenir novos atos racistas. “Estamos atentos. Racismo é crime e não passarão impune”, completou.
A advogada Camila Claudino, secretária-geral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Araraquara, também repudiou as falas do vereador e destacou que “é preciso transformar não só as falas, mas sobretudo as consciências”.
“A fala proferida, infelizmente, evidencia não apenas um equívoco isolado, mas uma manifestação clara do racismo estrutural que ainda permeia de forma silenciosa — porém devastadora — a nossa sociedade. A associação negativa do termo “negro” a elementos pejorativos ou indesejáveis não é fruto do acaso, mas sim reflexo de um imaginário social construído historicamente para inferiorizar identidades negras”, disse.
Camila destacou que falas como estas são reproduzidas e naturalizadas, por vezes de maneira inconsciente, por aqueles que sequer se reconhecem como racistas. “Justamente por isso, é ainda mais perigoso: por estar entranhado nas palavras, nos gestos, nas piadas e nos discursos do cotidiano. Essa naturalização do preconceito é a prova mais evidente de que o racismo no Brasil não é apenas um problema individual, mas sistêmico”.
A discussão iniciou na Câmara no dia anterior quando o vereador Guilherme Bianco (PCdoB) usou o púlpito para denunciar as falas racistas e provocar a Comissão de Ética da Câmara para que tomasse as providências cabíveis. “Quero deixar todo o meu repúdio e dizer que é inaceitável conviver com racismo, com o crime de ódio, entre os pares”, disse.
“Primeiramente, eu queria deixar não só o meu repúdio, a minha revolta contra essa afirmação do vereador, mas também acionar a comissão de ética de Casa. Porque, se é verdade o que o presidente fala que ‘não será tolerado o racismo’ é verdade dizer também que é necessário que a comissão de ética se posicione neste caso”, disse o parlamentar.