A primeira-ministra da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, Emmanuel Macron, propuseram na segunda-feira (18) um pacote de 500 bilhões de euros de estímulo para reativar as economias da União Europeia atingidas pela Covid-19.
“Para apoiar uma recuperação sustentável que restaure e fortaleça o crescimento na UE, a Alemanha e a França apoiam a criação de um ambicioso, temporário e direcionado fundo de estímulo de 500 bilhões de euros que deverá fazer parte do próximo orçamento da União Europeia”, apontou um comunicado conjunto divulgado pelos dois governos.
De acordo com a proposta, para financiar esse estímulo a Comissão Europeia – o órgão executivo da União Europeia – deve usar o peso do bloco para tomar empréstimos dos mercados “em nome da UE”. Esse dinheiro será então transferido para “despesas orçamentárias” dos países europeus e “para os setores e regiões mais afetados”, assinala o texto.
Sob a pandemia que vem varrendo a Europa, a imperiosa necessidade de fechar qualquer atividade não-essencial levou a economia a uma contração sem precedentes nas décadas modernas, com os governos tendo de assumir o apoio aos trabalhadores que tiveram de ficar em casa – inclusive salários – e às empresas, ao mesmo tempo em que tinham de enfrentar o desafio de conter o coronavírus.
Cada país reagiu como pôde, e não faltaram inclusive disputas por máscaras ou respiradores em falta, suspensão da exportação de equipamentos desesperadamente necessários, e até seqüestro de compras da China que faziam escala em algum país europeu antes de chegar ao destino.
Na medida em que a escalada do contágio foi detida, a reativação da economia, sob a nova ‘normalidade’ entrou na ordem do dia na maioria dos países do bloco europeu.
O jornal francês Le Monde considerou a proposta uma “revolução”, já que a Alemanha sempre se opôs a qualquer mutualização de dívidas.
“O fato de o casal franco-alemão ter concordado com as principais linhas de um plano de recuperação financiado por uma dívida comum dos estados europeus, emitida pela União e gasto com o orçamento europeu, é em si uma revolução”, registrou.
“Berlim, que estava contra o vento no final de março contra tudo o que, de uma maneira ou de outra, equivale a reunir a dívida dos europeus, está hoje de acordo em seguir esse caminho. Depois de afastar qualquer cobrança conjunta de dívidas, no Conselho de Chefes de Estado e de Governo em 26 de março, Angela Merkel enviou sinais mostrando que ela havia mudado nos últimos tempos”.
Durante o pronunciamento virtual com Merkel, o presidente francês enfatizou que “estamos propondo fazer transferências reais. Isso é um passo principal”. Os dois líderes disseram que buscarão um “acordo rápido” com outros membros da UE para viabilizar o fundo de recuperação.
“CAMINHO INCOMUM”
Merkel reconheceu que “devido à natureza incomum da crise, estamos escolhendo um caminho incomum”.
É que a falta de solidariedade, num momento tão grave quanto a pandemia, vinha sendo denunciada pelos governos da Itália e da Espanha, que consideraram inteiramente insuficientes as medidas até então anunciadas, e uma ameaça até mesmo à continuidade do bloco.
Recuo que revela como o acirramento do sentimento anti-UE nos países mais atingidos pela pandemia preocupa Berlim. “As circunstâncias atuais podem pôr em perigo a unidade” do bloco europeu, disse Merkel.
“Temos de agir em conjunto, de uma maneira europeia”, acrescentou, apontando que o objetivo “é que a Europa saia mais forte da crise”, afirmou.
“Um passo na direção certa, que a Itália esperava desde o início”, saudou o primeiro-ministro, Giuseppe Conte. Por sua vez, a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, se disse “encantada” com a proposta, que classificou como “construtiva”.
“Esta proposta está em conformidade com a elaborada pela Comissão, que também levará em consideração os pontos de vista de todos os Estados membros e do Parlamento Europeu.”
O plano Merkel/Macron também foi elogiado pela presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde. “As propostas franco-alemãs são ambiciosas, direcionadas e bem-vindas” , afirmou em entrevista a jornais europeus.
Segundo a primeira-ministra alemã, o custo do pacote será proporcional à contribuição de cada país para o Orçamento comunitário e seu pagamento será diluído a longo prazo, provavelmente para depois de 2027.
Dessa forma, a Alemanha deve arcar com 27% dos custos. O dinheiro então será distribuído em forma de dotações para os países mais necessitados, de acordo com Macron.
Ele admitiu que um acordo franco-alemão por si só “não significa um acordo dos 27 Estados-membros”, mas disse esperar que ajudasse no fechamento da proposta em elaboração pela Comissão Europeia. Será preciso superar a resistência de países como a Holanda.
Para a presidente da Comissão Europeia, a proposta “contempla o alcance e o tamanho do desafio econômico que a Europa enfrenta e, com razão, enfatiza a necessidade de trabalhar em uma solução com o orçamento europeu em sua essência”.
Ainda restam muitos detalhes a serem trabalhados, como as condições de endividamento e reembolso, ou mesmo os critérios de alocação desse dinheiro.
SETORES ESTRATÉGICOS
Macron e Merkel também querem, de acordo com o Le Monde, que a Europa adote um instrumento de controle de investimentos, para evitar que empresas de setores estratégicos, como saúde, energia ou defesa, tenham seu comando acionário retirado do velho continente.
Com base nas lições da crise, os dois líderes também pedem a construção de uma Europa da saúde, que possibilite a criação de estoques comuns de máscaras e outros equipamentos médicos, bem como a harmonização dos dados dos vinte e sete.
Como visto sob a Covid-19, nem na hora contabilizar o número de mortes havia um critério único. Em discussão também como evitar que “certos países não europeus se apropriem das vacinas” desenvolvidas pelas empresas europeias.