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Em declarações à agência de notícias Lusa, o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, condenou os atos de vandalização de que foi alvo a estátua do Padre Antonio Vieira, que considerou «ignorância» e «imbecilidade». A vandalização ocorreu na semana passada em Lisboa e foi condenada, ainda, pela Câmara Municipal: “todos os atos de vandalismo contra o patrimônio coletivo da cidade são inadmissíveis”.
O Padre Antonio Vieira, que é um dos precursores da literatura brasileira, com seus célebres sermões, viveu grande parte de sua vida no Brasil, onde defendeu incansavelmente os direitos dos povos indígenas e lutou contra sua escravização, além de ter sido contrário à inquisição e à perseguição aos judeus. Também foi a favor da restauração da independência de Portugal.
«O que foi feito demonstrou não só ignorância como imbecilidade, porque a ignorância pode não ser imbecil. Pode ser uma ignorância bem-intencionada. As pessoas não sabem porque não sabem, nunca puderam saber», observou Rebelo de Sousa.
O chefe de Estado português enfatizou o legado deixado pelo missionário jesuíta do século XVII: «lutou pela independência, foi um grande diplomata, foi um homem progressista para aquela altura, perseguido pelos colonos, portugueses no Brasil, perseguido pela corte, a certa altura, perseguido pela Inquisição. Foi um dos maiores escritores portugueses, foi o maior orador português.”
“Portanto, para a sua época, este homem que era um visionário, ser considerado o exemplo do que se quer destruir e demolir de memória, de testemunho da nossa história, é uma coisa, verdadeiramente, imbecil», reiterou Rebelo de Sousa.
A estátua do padre António Vieira, no Largo Trindade Coelho, em Lisboa, foi vandalizada, na semana passada, com a palavra “descoloniza” pintada a vermelho. A boca, mãos e hábito do clérigo foram tingidas de vermelho e no peito das crianças indígenas, que estão representadas à sua volta, foi pintado um coração.
MACAQUEAÇÃO
O que não passa de uma macaqueação do que tem ocorrido nos EUA contra estátuas de líderes do regime escravista derrotado na Guerra Civil americana sob comando de Abraham Lincoln, em meio à revolta em curso no país contra o persistente racismo, cuja raiz é a escravidão e a segregação que se seguiu. Das estátuas dos generais confederados, alguns desavisados desviaram sua ira contra Cristóvão Colombo e até contra o pai da nação norte-americana, George Washington.
Na Grã Bretanha, contra Winston Churchill que, como se sabe, era imperialista, era colonialista, era aristocrático, mas que encabeçou com o presidente Franklyn Roosevelt e o líder soviético Josef Stalin a derrota do nazifascismo, maior ameaça que já houve contra o futuro da humanidade.
Embora certas estátuas estivessem merecendo há muito tempo seu lugar na lata de lixo da história, como a do rei belga que fez do Congo sua fazenda particular e instituiu a horrenda prática de cortar braços [‘curto’, no cotovelo; ‘longo’, decepando a mão], que até recentemente ocorria na África, cometida por grupos de mercenários e golpistas.
Na invasão do Iraque, uma das primeiras operações de propaganda desencadeadas pelas tropas norte-americanas de ocupação foi a derrubada, mostrada em rede mundial e amplamente comemorada, da estátua do presidente Sadam Hussein.
Mais recentemente, os monumentos aos militares soviéticos que comandaram a libertação dos países do leste europeus do tacão hitlerista vêm sendo demolidos em países a que chegaram ao poder a extrema direita e inclusive nazistas, caso da Ucrânia e da Polônia.
“FAZER HISTÓRIA DIFERENTE”
Marcelo Rebelo de Sousa admitiu que em Portugal existem setores racistas e xenófobos, porém assegura que não é destruindo a história que se luta contra as discriminações, segundo a agência Lusa.
«Há muitas discriminações na sociedade portuguesa a merecerem a atenção e o combate. Mas não penso que seja uma forma inteligente de combater; a de vandalizar ou destruir estátuas. Julgar a história de hoje para o passado é um risco enorme. A maneira de verdadeiramente lutar contra as discriminações, concretamente contra o racismo ou a xenofobia, é criar condições, hoje e para o futuro, que reduzam essas desigualdades. Não é estar a destruir História, é fazer História diferente», concluiu.
Além disso, e reforçando o argumento da imbecilidade, as pichações de “descolonializa” e de “corações” nas crianças indígenas só podem ser referência ao Brasil – onde o grande orador passou grande parte da vida – e que se tornou independente em 1822.