Em 2020, o número de queimadas no estado do Amazonas superou o recorde anterior, de 2005, e passou a ser o maior de toda história, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgados neste domingo (11). Foram registrados 15.700 focos ativos, enquanto em 2005 o acumulado de todo o ano foi de 15.644 casos. O levantamento de focos ativos de incêndio é feito pelo Inpe via satélite desde 1998.
De acordo com o Inpe, o mês de agosto também registrou o maior número de queimadas para um único mês desde o início da série histórica. Segundo a tabela de Monitoramento dos Focos Ativos por Estado foram 8.030 casos de queimadas em todo Amazonas.
Segundo dados do Inpe, a Amazônia é o bioma mais afetado pelas queimadas em 2020. 45,6% dos casos registrados no país durante o ano ocorreram na região. Os dados mostram que, de janeiro a setembro deste ano, o número de focos de queimadas registrados é o maior desde 2010. Naquele ano, foram 102.409 pontos, enquanto em 2020, no mesmo período, 76.030.
Além das queimadas, a Amazônia Legal também registra um aumento significativo no desmatamento. A região teve uma área de 964 km² sob alerta em setembro, a segunda maior em cinco anos.
Atraso no Prevfogo
Em meio a isso, o chefe do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais do Ibama (Prevfogo) pediu exoneração, no sábado (10). O órgão é responsável pela política de combate a incêndios florestais. O Ibama não detalhou os motivos da saída. Em mensagem enviada a colegas, Morais declarou que sua saída se devia a um “motivo de força maior”.
A situação do Ibama durante o governo Bolsonaro piorou muito. Principal órgão federal de proteção da maior floresta tropical do mundo possui atualmente 591 agentes ambientais para enfrentar o avanço do crime ambiental, e isso não só na Amazônia, mas em todo o país.
Dados oficiais do órgão, obtidos pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, revelaram que o atual quadro de agentes é 55% inferior ao que o instituto detinha dez anos atrás.
Além disso, neste ano, com o recorde de queimadas na Amazônia e no Pantanal, os agentes do Ibama chegaram às regiões com quatro meses de atraso. De acordo com uma série de relatórios internos do órgão do Ministério do Meio Ambiente (MMA), as mudanças na lei e uma série de registros burocráticos contribuíram para o atraso dos brigadistas.
Segundo os relatórios, a demora para o envio dos agentes inviabilizou a proteção de territórios indígenas e também expôs localidades do Cerrado.
A autorização para a viagem dos brigadistas recebeu o aval do Ministério da Economia de Bolsonaro apenas em junho, quando foi aprovado o envio de 1.481 profissionais para as áreas de queimadas. O Ibama permite, por lei, a contratação de 2.520, mas o que o governo fez foi reaproveitar os brigadistas que combateram as queimadas na Amazônia em 2019.
Porém, em fevereiro, o governo federal editou a medida provisória 922, que descreve as condições sobre o trabalho temporário no serviço público e impede a recontratação de pessoas que prestaram serviços, a menos que seja precedida de “processo seletivo simplificado de provas ou de provas e títulos”.
Após receber o aval do Ministério da Economia, o Prevfogo ainda precisou esperar até 10 de agosto para a publicação de uma portaria que deu a autorização definitiva para a contratação dos brigadistas.
O Prevfogo encaminhou o pedido para a contratação de brigadistas, o que seria feito sem gastos extras ao governo, ainda em janeiro. No dia 18 de março, o MMA publicou uma portaria estabelecendo período crítico de emergência em relação a incêndios florestais em 17 estados — entre eles, todos os localizados na área da Amazônia Legal e do Pantanal.
No dia 15 de abril, enquanto o ME analisava os contratos para envio dos brigadistas, a Diretoria de Proteção Ambiental (Dipro) do Ibama, à qual o Prevfogo está subordinado, organizou uma videoconferência com a Fundação Nacional do Índio (Funai), relatando que os brigadistas não deveriam chegar aos territórios indígenas antes de junho.
“Ressalto que 2020 é o ano de maior atraso na contratação dos brigadistas, prejudicando todas as atividades de prevenção e inviabilizando a conclusão das queimas prescritas em quase todas as terras indígenas”, afirmou a Dipro.
“Além disso, o presente ano vem se destacando pelas dificuldades de atuação dos órgãos de proteção devido a Covid-19, o aumento dos desmatamentos e as previsões climáticas desfavoráveis. Esses fatores indicam que provavelmente teremos uma das piores temporadas de incêndios florestais já registradas.”
O ofício ainda acrescentou que “dessa forma, solicito o máximo de esforço para aprovar esses Planos de Trabalho, uma vez que são a única oportunidade para implementar as atividades de prevenção e de redução do combustível florestal no Cerrado em tempo hábil”.
Carlos Minc, ex-ministro do Meio Ambiente, destaca que órgãos governamentais fizeram um “jogo de empurra” diante da crise ambiental, desqualificando as previsões feitas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais sobre a dimensão da seca.
“ Todos os governos sérios começam a se planejar no início do ano, conversando com secretarias estaduais de Meio Ambiente e Agricultura, até porque não é de um dia para o outro que os ministérios darão os programas carimbados. Obviamente a pandemia atrapalhou o combate às queimadas, e por isso os brigadistas do ano passado deveriam ser reaproveitados. A medida provisória foi errada”, afirmou.
Bolsonero
Em meio à crise ambiental promovida pelo governo Bolsonaro, um grupo de ativistas do Greenpeace ergueu um estátua do próprio Jair com 4 metros de altura em uma área atingida pelas queimadas no Pantanal e escreveram a mensagem: “Pátria queimada, Brasil”.
Segundo a diretora de programas do Greenpeace Brasil, Tica Minami, o desmonte sistemático da política ambiental brasileira do atual governo, resultou em uma das piores crises ambientais da história do país. “Com essas ações queremos não apenas chamar a atenção para a destruição sem precedentes do patrimônio ambiental dos brasileiros, como também apontar as causas e seus responsáveis. O Brasil está, literalmente, em chamas, graças à política incendiária do atual governo”, explicou.
O governo segue defendendo o desmatamento. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, acompanhado de outras autoridades, fez um sobrevoo de helicóptero, em Corumbá, no Pantanal de Mato Grosso do Sul, para avaliar os impactos das queimadas no bioma, no último dia 3. Salles defendeu ainda o uso do fogo e expansão do agronegócio na região.