Ex-atacante relembra que Robinho, que havia sido anunciado como reforço do Santos, foi condenado a nove anos de prisão por violência sexual na Itália. “A sociedade tem que parar de aceitar sacanagem como qualquer coisa normal”
Walter Casagrande, ex-atacante e comentarista esportivo da TV Globo, criticou a negociação da diretoria do Santos Futebol Clube com o jogador Robinho, condenado a nove anos de prisão por estupro de uma jovem na Itália.
O ex-jogador se disse “assustado com o que acontece no Brasil” ao relatar a tentativa de contratação do jogador pelo clube paulista, o caso do senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado com R$ 30 mil na cueca e a advertência dada pela Justiça Desportiva à jogadora de vôlei, Carol Solberg, por protestar contra Bolsonaro após uma partida.
“Eu estou assustado com a sociedade brasileira. Não é o apedrejamento do Robinho, é o apedrejamento da moral da sociedade brasileira. Não podem se inverter os valores. O Robinho está condenado a nove anos de prisão por violência sexual na Itália. Recorreu, mas, neste momento, é condenado. Eu fico assustado com o que acontece no Brasil”, disse Casagrande, que foi um dos líderes, junto a Sócrates, da Democracia Corintiana na década de 70 e atualmente lidera o grupo Esporte pela Democracia.
“No Brasil, se solta traficante, o vice-líder é preso com dinheiro na cueca. A Carol Solberg, por se manifestar politicamente, a CBV faz censura e o Santos contrata um jogador que é condenado por estupro. Não vou me calar.
“No Brasil, se solta traficante, o vice-líder é preso com dinheiro na cueca. A Carol Solberg, por se manifestar politicamente, a CBV faz censura e o Santos contrata um jogador que é condenado por estupro. Não vou me calar. Eu sou uma voz, e não vou me calar perante esse tipo de coisa. Não estou preocupado com as consequências de nada que eu falo. Estou falando fatos, não estou inventando nem atacando ninguém. A sociedade tem que parar de aceitar sacanagem como qualquer coisa normal”, completou o comentarista, no “Globo Esporte SP” da última sexta-feira (16).
Já neste sábado (17), Casagrande voltou a se pronunciar sobre o assunto no programa “É de Casa”. Questionado por Patrícia Poeta e Ana Furtado sobre a decisão do clube, Casagrande disse que “não deveria ter acontecido, na verdade, porque não deveria ter começado uma negociação a ponto de ter que os patrocinadores ameaçarem de sair e a opinião pública ter que agir de forma forte para o Santos rescindir o contrato”.
Em seguida, o comentarista argumentou que a polêmica em torno da contratação de Robinho ultrapassava qualquer âmbito esportivo.
“Não era questão de futebol. Era uma questão social, de justiça. Ele não foi expulso porque deu um soco num jogador (…). É uma situação muito grave. Gravíssima. Ele está condenado em primeira instância a nove anos por violência sexual na Itália. Recorreu, vai ter segunda instância, o resultado sai em dezembro, mas tem esse crime, que se agrava com as gravações dos áudios que apareceram numa reportagem muito forte do GE”, analisou.
CONTRATO
A contratação de Robinho foi anunciada pelo atual presidente do Santos, Orlando Rollo, no último final de semana. De imediato, o repúdio ao contrato tomou as redes sociais com torcedores e torcedoras se manifestando contra o retorno do jogador.
Após divulgação pelo Globo Esporte de interceptações telefônicas feitas com autorização judicial, onde o atacante se orgulha de ter participado de um estupro coletivo de uma jovem albanesa, os protestos se intensificaram.
Em janeiro de 2014, em conversa gravada com autorização da Justiça italiana, Robinho afirmou a Jairo Chagas, músico brasileiro que tocou na boate na noite do ocorrido, que “tentou transar” com a jovem albanesa. Ao ser contestado sobre ter praticado sexo oral, Robinho rebateu: “Isso não significa transar”.
Patrocinadores do clube ameaçaram romper os contratos, caso Robinho fizesse parte do elenco do time.
Somente seis dias depois, a diretoria do Santos anunciou a suspensão do contrato com o atacante “para que o jogador possa se concentrar exclusivamente na sua defesa no processo que corre na Itália”.
Conversa
Para fundamentar a acusação de estupro, a polícia italiana grampeou os telefones dos acusados e chegou a instalar escutas no carro utilizado por Robinho na Itália.
Segundo a sentença proferida pela Justiça “os conteúdos dão pleno conhecimento do que aconteceu” na noite do crime.
Em uma delas os acusados Ricardo Falco e Robinho indicam saber da condição da vítima.
Falco e Robinho
Abaixo publicamos os trechos divulgados pelo Globo Esporte:
Em um dos trechos transcritos, os acusados Ricardo Falco e Robinho indicam saber da condição da vítima.
Falco: “Ela se lembra da situação. Ela sabe que todos transaram com ela”.
Robinho: “O (NOME DE AMIGO 1) tenho certeza que gozou dentro dela”.
Falco: “Não acredito. Naquele dia ela não conseguia fazer nada, nem mesmo ficar em pé, ela estava realmente fora de si”.
Robinho: “Sim”.
Para a justiça italiana, as escutas realizadas a partir de janeiro de 2014 são “auto acusatórias”.
Robinho e Jairo
Logo no primeiro mês de monitoramento, por exemplo, uma interceptação mostrou o músico Jairo Chagas, que tocou naquela noite na boate, avisando a Robinho sobre a investigação
Robinho:
“Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”.
“Olha, os caras estão na merda… Ainda bem que existe Deus, porque eu nem toquei aquela garota. Vi (NOME DE AMIGO 2), e os outros foderam ela, eles vão ter problemas, não eu… Lembro que os caras que pegaram ela foram (NOME DE AMIGO 1) e (NOME DE AMIGO 2)…. Eram cinco em cima dela”.
Ainda em janeiro de 2014, o músico e o jogador voltaram a falar sobre o episódio. O diálogo entre os dois transcrito na sentença é o seguinte:
Robinho: “A polícia não pode dizer nada, eu direi que estava com você e depois fui para casa”.
Jairo: “Mas você também transou com a mulher?”
Robinho: “Não, eu tentei. (NOME DE AMIGO 1), (NOME DE AMIGO 2), (NOME DE AMIGO 3)…”
Jairo: “Eu te vi quando colocava o pênis dentro da boca dela”.
Robinho: “Isso não significa transar”.
Em outras conversas apresentadas na sentença de amigos do jogador presentes na boate, o “Amigo 4”, como é identificado no processo, demonstrou preocupação ao saber do início da investigação:
NOME DE AMIGO 4: “Irmão, tive dor de barriga de nervoso, eu me preocupo por você, amigo”.
Robinho: “Telefonei a (NOME DE AMIGO 3), e ele me perguntou se alguém tinha gozado dentro da mulher e se ela engravidou. Eu disse que não sabia, porque me recordo que eu e você não transamos com ela porque o seu pênis não subia, era mole… O problema é que a moça disse que (NOME DE AMIGO 1), (NOME DE AMIGO 2) e (NOME DE AMIGO 3) a pegaram com força”.
Em outra ligação transcrita no processo, esta com (NOME DE AMIGO 3), o jogador ressaltou que “não havia prova de que fizemos alguma coisa”.
Os quatro amigos de Robinho retornaram ao Brasil durante a fase de investigação.
“Infelizmente, existe esse movimento feminista”, diz estuprador em sua defesa
O atacante se manifestou sobre a sentença de condenação a ele e a Ricardo Falco, o outro acusado brasileiro no crime, em primeira instância por violência sexual de grupo contra uma jovem de origem albanesa.
Em entrevista ao UOL, Robinho negou ter tido relação sexual com a jovem, mas que teve o consentimento dela até o momento em que ele teria deixado o local. Ele disse não se lembrar de tudo o que aconteceu na madrugada de 22 de janeiro de 2013 e criticou o que chama de “falta de contexto” nos trechos da conversa divulgados.
“Não tive relação sexual com ela, não. A gente teve relação entre homem e mulher, relações que homem tem com a mulher, mas não chegou a ter nenhuma relação sexual, nenhuma penetração, nada disso”, contou o jogador.
“Quando eu saí, os garotos continuaram lá com consentimento dela. Então, assim: eu estou me defendendo. Os garotos, se fizeram alguma coisa com ela, não posso falar por eles. Eu sei o que eu fiz com ela e com consentimento dela, entendeu? Então, foi isso que aconteceu”.
“Eles traduziram muita coisa fora de contexto. Na verdade, isso faz muito tempo. Em conversas de WhatsApp, a gente fala, mas nunca com falta de respeito, por desrespeitar as mulheres. Eles falaram que homens conversam entre si, que teve relação sexual com a mulher, com consentimento dela, porque ela quis, exatamente isso”.
“Tem coisas que eu nem lembro. Eu tenho certeza que jamais dei um copo de bebida pra ela. Não posso responder pelos meus amigos…”
Em outro trecho da entrevista, Robinho criticou o movimento feminista:
“Infelizmente, existe esse movimento feminista. Muitas mulheres às vezes não são nem mulheres, para falar o português claro. E se levantam contra porque coisas que homens…”
Segundo ele, “seu erro foi não ter sido fiel” à sua esposa. Robinho e Ricardo Falco contestaram a decisão do Tribunal de Milão. A Corte de Apelo de Milão vai iniciar a análise do processo, em segunda instância, no dia 10 de dezembro.