LEJEUNE MIRHAN * e NATHANIEL BRAIA**
A Juventude Sanaud (Juventude Palestina no Brasil) condenou a recepção festiva e “sorridente” por parte do presidente Jair Bolsonaro a Beatrix Von Storch, “expoente do partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha, um partido xenófobo, racista, antissemita e islamofóbico”.
Na sua declaração de 1º de agosto, a juventude palestina (filiada à Federação Árabe Palestina do Brasil – Fepal) destaca que Beatrix, uma das lideranças do partido Alternative für Deutschland (AfD, Alternativa para a Alemanha) mantém a ideologia de seu avô, um dos líderes nazistas que, como ministro das Finanças da Alemanha no período hitlerista “liderou o confisco de bens dos judeus enviados para os campos de concentração e extermínio nazistas”.
AFRONTA E GENOCÍDIO
A juventude palestina destaca que este encontro acontece em um momento em que há um genocídio em curso que já ceifou em meio à pandemia da Covid mais de 550 mil brasileiros. Acrescentamos que a declaração ocorre também diante da maior afronta que a comunidade árabe brasileira já sofreu ao longo de toda a sua história de imigração e formação em nosso país.
A deputada Beatrix Von Storch já declarou, entre outros absurdos, que a polícia alemã deveria se dirigir à fronteira do seu país e atirar nos refugiados sírios que tentam entrar no território nacional alemão sejam eles homens, mulheres ou crianças. Essa barbárie seria a forma de defender a “condição cristã da Alemanha” contra as “hordas de homens bárbaros, muçulmanos e estupradores”.
ISLAMISMO COMO ‘INIMIGO’
Em um pronunciamento ao Parlamento Europeu, a deputada sublinhou que “o terror islâmico e o islamismo são inimigos da Alemanha, Israel e Europa. A influência do lobby do Islã na Europa deve acabar”.
Vale ressaltar que o AfD busca reabilitar termos como Volkish (para designar o povo alemão de suposta supremacia ariana). Um dos seus principais dirigentes Alexander Gauland, co-presidente do AfD, já foi criticado por declarar que os alemães deveriam ter “orgulho” de seus soldados em ambas as guerras mundiais.
A vigilância sobre o AfD foi determinada após agressões a membros de coletividades de imigrantes com base em motivação racial como o massacre em Hanau que deixou 11 mortos e a uma sinagoga na cidade alemã de Halle.A chanceler Angela Merkel alertou que o racismo “envenena a sociedade alemã”.
Muitos líderes políticos alemães se pronunciaram após o massacre. Entre eles, a dirigente da União Democrata Cristã, Annegret Kramp-Karrenbauer, que se declarou “chocada e triste” e que a “violência dirigida pelo extremismo de ultradireita não deve ser deixado à solta, devemos nos unir contra ele”.
CONEXÕES COM O NAZISMO
Em meio aos encontros não apenas com o presidente, mas ainda com o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, Eduardo Bolsonaro e com a presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Bia Kicis, a deputada alemã declarou que “para enfrentar com êxito a esquerda, os conservadores [leia-se nazistas] também precisam se conectar melhor internacionalmente”.
Recentemente a pesquisadora da Unicamp sobre o recrudescimento das manifestações neonazistas, Adriana Dias, acaba de publicar carta de apreço e louvor por parte de Bolsonaro aos sites neonazistas no Brasil que estão em expansão alimentados por esta ideologia que hoje infecta o planalto.
“NAZISMO NÃO!”, BRADA OMAR AZIZ, PRESIDENTE DA CPI DA COVID
O senador Omar Aziz, durante a abertura de uma das sessões da CPI da Covid, que preside, denunciou que tem sido chamado de palestino, por aqueles que agora tentam difamá-lo mas que a sua ascendência palestina lhe é motivo de orgulho, ao contrário do presidente Bolsonaro, que “se encontrou com uma deputada nazista” e bradou: “Nazismo não!”. Destacou que a sociedade brasileira repudia e não aceita e acrescentou: “O presidente recebe uma deputada nazista afrontando a Constituição brasileira, afrontando a nossa democracia, afrontando o Holocausto”.
“Afrontando o Exército brasileiro”, concordou o vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). “E afrontando o Exército brasileiro que lutou contra o nazismo”, corroborou Aziz.
A questão está colocada: a comunidade árabe como um todo não deve silenciar diante da maior afronta a esta. Ela vem logo depois de outra afronta, a frustrada tentativa de transferência da embaixada do Brasil para a Jerusalém cujo setor árabe palestino está sob ocupação, forte repressão, profanação da mesquita Al Aqsa e contínuas ameaças de confisco de residências, como na assediada Sheikh Jarrah. A transferência só não ocorreu devido à mobilização da comunidade árabe brasileira e o repúdio dos países árabes.
Se podemos considerar que este encontro teve alguma virtude, foi a de escancarar o caráter e a identidade nazista, antissemita e islamofóbicado bolsonarismo, razões estas mais do que suficientes para que árabes e judeus se ponham em alerta e se mobilizem junto com toda a sociedade brasileira contra uma nefasta corrente que merece repúdio declarado em sua insana cruzada contra as instituições, à Constituição de 1988, ao sistema eleitoral, enfim, à democracia e, por outro lado, que a cada dia mais revela o seu apreço pela tortura, pela morte e pelos atos mais odientos da ditadura, a exemplo dos atos pelo retorno domalsinado AI5.
* Sociólogo, professor universitário (aposentado), escritor e analista internacional;
** Jornalista e editor internacional do HP