Cientistas e pesquisadores das mais diversas áreas da ciência condenam os cortes realizados pelo governo Bolsonaro e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O Ministério da Economia provocou um corte drástico em recursos aguardados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) anunciado na última quinta-feira (7). Dos R$ 690 milhões previstos por meio de um projeto de lei, apenas R$ 55,2 milhões foram direcionados para a pasta, representando 92% do total anterior, deixando a ciência e a pesquisa no país ainda mais precarizadas.
Nesse dia, seria votado um projeto de lei pelo Congresso Nacional que previa a verba que garantiria que o CNPq pagasse bolsas de pesquisadores. Porém, o projeto foi modificado e o dinheiro foi retirado pela comissão mista de orçamento do Congresso Nacional a pedido do ministério comandado por Paulo Guedes.
Uma das finalidades do CNPq é manter os grandes cientistas e pesquisadores promissores no Brasil e até atrair para o país estrangeiros com esse perfil para contribuir com o desenvolvimento da ciência nacional. Para tal, havia a previsão de incentivos de R$ 4.100 a R$ 7.000 para a atração de jovens talentos e o pagamento de R$ 12.000 para os pesquisadores visitantes especiais. Todos esses incentivos se encontram ameaçados pelos cortes profundos de verbas anunciados pelo Ministério da Economia.
Para o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, o projeto aprovado no Congresso que retira R$ 690 milhões do MCTI é uma falta de visão importante do futuro do país.
“Qual é o impacto disso no país? É só ver o que está acontecendo nos Estados Unidos, na Europa, na China. Eles estão investindo fortemente em ciência e tecnologia, e estão precisando de cérebros. Então, o Brasil vai se transformar num grande mercado de cérebros, de exportação”, afirmou o físico Luiz Davidovich, ao portal da ABC.
Cortes evidenciam falta de compromisso com o país, diz ANPG
A presidenta da Associação Nacional de Pós Graduandos (ANPG) Flávia Calé, disse que os cortes na pasta de ciência e tecnologia demonstram o descompromisso do governo federal com a pesquisa e o projeto nacional de desenvolvimento do país, com uma política dependente sem qualquer investimento.
“Os cortes do CNPq e mais esse corte da ciência, evidenciam que mesmo com a luta dos pesquisadores da comunidade científica pela liberação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e aprovação no Congresso Nacional em lei pela liberação do FNDCT, encontramos uma barreira muito grande no Ministério da Economia e de um Governo completamente descomprometido com o projeto nacional para o Brasil. Onde constroem o caminho de um Brasil de joelhos para o mundo dependente tecnologicamente e consumidor de tecnologia no mundo. Então é esse lugar que o Bolsonaro e que Paulo Guedes constroem para o Brasil”, afirmou Flávia ao HP.
Ela afirmou que a ANPG tem realizado mobilizações contra os cortes com as mais diversas entidades do meio acadêmico, científico e tecnológico, reafirmando a importância do que é investir na ciência, na valorização dos jovens doutores, que ficam ao relento, sem conseguir desenvolver sua pesquisa e que são necessários para a construção do caminho ao desenvolvimento do país.
“A ANPG tem feito uma agenda de Mobilizações, no dia 15 tem o dia nacional em defesa da ciência contra os cortes, com diversas atividades junto a comunidade científica e no dia 26 de outubro a gente vai construir um dia nacional de paralisação dos pós-graduandos e pós-graduandas pra colocar na ordem do dia e colocar em disputa esse recurso do FNDCT para que sirva a valorização da carreira científica e dos jovens pesquisadores no Brasil, que são trabalhadores da pesquisa fundamentais na construção do caminho para o desenvolvimento, de retomada da economia, de retomada da geração de emprego e é um recurso humano altamente especializado que é necessário para a superação da crise brasileira.
“Por isso é importante também a valorização dos jovens pesquisadores é fundamental, a nossa pauta é também pelo reajuste das bolsas que estão a 8 anos sem reajuste. Universalização das bolsas de pesquisa, das bolsas de estudo para mestrandos e doutorandos e um grande programa nacional voltado aos jovens doutores, um programa de pós-doutorado que garanta ao menos 50 mil bolsas para que esses jovens que se formaram, que são doutores, que não estão encontrando emprego no mercado de trabalho nacional possam ter um alento para conseguir se fixar na carreira científica e para conter a fuga de cérebros que está em franca expansão no Brasil”, ressaltou.
“É necessário mobilizar toda a comunidade científica, a sociedade para esses dois dias nacionais de luta contra os cortes e em defesa da carreira científica no Brasil”, concluiu Flávia Calé.
Cientistas Engajados criticam o negacionismo bolsonarista
Para a coordenadora do movimento Cientistas Engajados, Mariana Moura, afirmou que a ação do governo federal de retirar a verba da ciência e tecnologia é imoral e ilegal. Mesmo com a lei do FNDCT aprovada pelo Congresso Nacional, o governo dá um duro golpe e aplica sua política negacionista de esvaziamento do desenvolvimento da ciência e tecnologia do país.
“A manobra, feita na calada da noite, pelo Ministério da Economia para retirar recursos da Ciência e Inovação além de imoral, é ilegal. O Brasil está perdendo seus cientistas para países que dão melhores condições de pesquisa e esse governo descumpre uma lei aprovada pelo Congresso Nacional, fruto de grande mobilização da comunidade científica, que proíbe o contingenciamento dos recursos do FNDCT. Dinheiro de empresas públicas e privadas, que deveria ir para o desenvolvimento científico do nosso país, e está sendo desviado ilegalmente para rolagem da dívida pública”, declarou Mariana à Hora do Povo.
Para a professora da Universidade de São Paulo (USP), Lygia da Veiga Pereira, o corte de recursos da ciência é um ‘golpe final’ à ciência.
A decisão do governo Bolsonaro, de cortar drasticamente os recursos orçamentários para ciência e tecnologia, não foi exatamente uma surpresa para quem já vinha registrando o pouco caso do governo em relação ao setor.
“A sensação é de golpe final na ciência brasileira”, lamentou a pesquisadora Lygia da Veiga Pereira.
Segundo a professora da USP, “é inacreditável que nesses tempos de pandemia, quando o valor da ciência nunca foi tão óbvio, o governo siga sistematicamente desmontando todo o sistema de pesquisa e desenvolvimento construído durante décadas”.