“Presa ou livre, continuarei lutando”, declarou a comandante guerrilheira sandinista Dora María Téllez, após mais de quatro horas de enfrentamento ao juiz orteguista Ángel Jancarlos Fernández González.
Dora Téllez, uma das mais destacadas combatentes da vitoriosa luta contra a ditadura sanguinária de Anastasio Somoza, manteve sua altivez diante de um julgamento realizado dentro de uma das celas do cárcere onde é mantida desde 13 de junho de 2021. A comandante denunciou a violação de seus direitos por mais de sete meses de reclusão, privando-a de entrevistas com seus advogados, visitas familiares, leitura, submetendo-a a condições desumanas de isolamento e frio.
“Nem Daniel Ortega, nem Rosario Murillo [esposa do ditador e sua vice] são o Estado da Nicarágua. Esta é uma República, e não uma monarquia”, proclamou diante do inquisidor ditatorial, ressaltando que o Estado da Nicarágua não deve ser confundido com a pessoa de Daniel Ortega.
Ao final das quatro horas de uma corte de farsa, o Juiz do 4º Distrito Penal de Manágua, proferiu uma sentença de “culpabilidade” contra a ex-guerrilheira e a declarou “inabilitada” politicamente.
A organização Unidade de Defesa Jurídica (UDJ), informou que “emite-se um veredicto de culpabilidade contra a presa política Dora María Téllez”.
Sua sentença seria resultado de “minar a integridade nacional” e o “Ministério Público pede 15 anos de prisão mais a inabilitação para o exercício de cargos públicos”, assinala o comunicado da UDJ.
O regime de Ortega, através da procuradoria, usou a acusação de “conspiração” para levar Dora, junto com Ana Margarita Vijil, membros da UNAMOS, ex-Movimento Sandinista de Renovação (MRS), a julgamento.
Ambas foram presas em 13 de junho de 2021, no mesmo dia que a Polícia prendeu toda a diretoria da União Democrática Renovadora (UNAMOS), organização que surgiu após a extinção do partido Movimento de Renovação Sandinista (MRS), grupo que aglutinou sandinistas históricos, intelectuais e ativistas de esquerda, opositores a Ortega.
Desde essa data, Téllez permanece isolada numa cela da chamada Direção de Auxílio Judicial (DAJ), um centro de detenção preventiva para “interrogatórios”, mas onde são praticadas diversas formas de tortura, segundo denúncias dos familiares dos presos políticos e do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos.
A acusação de “conspirar contra a integridade e soberania nacional”, é a mesma aplicada a mais de 56 pessoas entre ativistas, feministas, líderes universitários, jornalistas e dirigentes políticos, em base a uma lei aprovada pelo orteguismo em Dezembro de 2020 contra opositores. Esse foi o mesmo instrumento aplicado para prender também nada menos de sete pré-candidatos presidenciais, apenas meses antes da eleição de fachada de novembro último.
A Comandante Téllez foi uma das principais guerrilheiras na luta da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) contra a ditadura de Anastasio Somoza nos anos 70. Ela comandou importantes operações de guerrilha, como a ocupação do Congresso Nacional em agosto de 1978 – que conseguiu a libertação de mais de 50 presos políticos do somozismo – e a ocupação sandinista da cidade de León, a primeira a declarar o triunfo sandinista em 1979. No governo revolucionário foi Ministra de Saúde. Téllez saiu da FSLN em 1995, questionando às práticas reacionárias do setor orteguista dentro do partido, e fundou o MRS.
Hoje, Téllez é uma dos 173 presos políticos do regime Ortega-Murillo.