Avaliação tem relação com grampo que registrou Ribeiro relatando à filha que o chefe do Executivo disse, em telefonema, ter “pressentimento” de que seriam realizadas buscas contra o aliado
A Polícia Federal se baseou em fortes indícios de que o trio seu uniu para cometer crimes no MEC (Ministério da Educação). Foi com base nisso que a PF lastreou pedido à Justiça, que autorizasse mandados de busca e apreensão na investigação sobre o chamado “gabinete paralelo” instalado na pasta durante a gestão Milton Ribeiro.
A PF apontou que indícios “levam a crer” que o aliado de Jair Bolsonaro (PL) e os pastores Gilmar dos Santos e Arilton Moura “cooptaram prefeitos para satisfazer interesses pessoais”.
Em representação, o delegado Bruno Calandrini, responsável pela condução do inquérito, afirmou que depoimentos tomados de prefeitos, como o de Laerte Dourado, de Jaupaci (GO), “vão no mínimo na esteira do que foi ventilado sobre a cooptação de autoridades públicas por pastores que nada tem a ver com a Administração Pública federal”.
O delegado ainda relatou que, no contexto das apurações, o “respeito eclesiástico” manifestado entre os investigados “se confunde com atos oficiais, o que traz verossimilhança às suspeitas de privilégios e torna no mínimo possível que a cooptação e aferição de vantagens pessoais tenha ocorrido”.
“RELACIONAMENTO ECLESIÁSTICO”
A indicação se deu em razão de o pastor Gilmar dos Santos afirmar, em depoimento à Polícia Federal, que tem “relacionamento eclesiástico” com Ribeiro, negando ter arregimentado prefeitos para favorecimento em processos de liberação de recursos públicos federais.
“A relação de respeito eclesiástico manifestado pelos oitivados é no mínimo duvidosa, pois o que tem a ver tal proximidade litúrgica com a habitual participação e constantes encontros dos mesmos em eventos oficiais ou não oficiais com o ex-ministro quando este representava o Ministério da Educação [?]”, afirmou Calandrini.
Nesse contexto, o delegado argumentou pela realização de buscas para aprofundamento das investigações.
IMPRENSA ABRIU OS OLHOS DE AUTORIDADES
Calandrini disse que reportagens sobre o caso, como a revelação do Estadão sobre solicitação de propina em ouro e o áudio do ex-ministro Milton Ribeiro divulgado pela Folha de S.Paulo, fazia a PF crer na “convergência de indícios graves e que apontam para eventual artimanha criminosa para angariar recursos da pasta de maior relevância cívica do governo federal”.
“O pastor Gilmar é presidente da Convenção Nacional das Igrejas e ministros das Assembleias de Deus no Brasil – Coniemad e Arilton Moura ocupa o cargo de secretário-geral, portanto a aproximação dos mesmos nos eventos oficiais do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento Educacional) e MEC supostamente tinha o condão de apresentá-los ao público com prestígio junto ao então ministro da Educação e isso, por si só, já basta para passar a ideia de que realmente era possível se conseguir alguma benesse na pasta da Educação através dos mesmos”, registra o delegado no documento, assinado em 4 de abril.
A representação chegou a ser encaminhada ao gabinete da ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), vez que o inquérito sobre o “gabinete paralelo” instalado no MEC estava em vias de ser remetido para a Justiça Federal do Distrito Federal (1ª instância) após a demissão de Milton do Ministério da Educação, dia 28 de março.
‘ATRIBUIÇÃO POLICIAL’
No documento, o delegado Calandrini chega a mencionar a renúncia do aliado do presidente Jair Bolsonaro, argumentando que a “atribuição policial não se confunde com a competência da Justiça”.
O presidente do inquérito apontou que não havia nulidade na continuação das diligências que já haviam sido planejadas antes mesmo da saída de Ribeiro do governo federal.
Quando a ministra Cármen Lúcia remeteu o inquérito para a primeira instância, a representação pelos mandados de busca e apreensão também foi enviada à 15ª Vara Federal da Justiça do DF.
O Ministério Público Federal concordou com a representação policial e, dia 17 de maio, o juiz Renato Borelli expediu os mandados de busca contra os investigados, além de autorizar interceptações telefônicas, e a obtenção, pelos investigadores, dos extratos telefônicos e dos relatórios de inteligência financeira dos quatro principais investigados – Ribeiro, Gilmar, Arilton e Luciano – no período de janeiro de 2020 a abril de 2022.
O magistrado afastou e proibiu os pastores e o advogado de frequentarem as instalações do Congresso Nacional, do MEC ou do FNDE, de participarem de eventos da pasta e de entrarem em contato com servidores do ministério e parlamentares.
RELATÓRIO DA CGU
Foi somente após o abastecimento do inquérito com relatório da CGU (Controladoria-Geral da União), que a Polícia Federal representou pelas prisões preventivas de Ribeiro e dos pastores sob suspeita. O documento foi encaminhado à Justiça dia 13 de junho.
Os mandados foram cumpridos na última quarta-feira (22), no âmbito da Operação Acesso Pago. Milton Ribeiro e os outros quatro presos da ofensiva não chegaram a ficar detidos por 24 horas – foram beneficiados por decisão do desembargador Ney Bello, do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), a pedido da defesa do ex-ministro da Educação.
O caso foi agora devolvido ao STF, que vai decidir sobre o futuro das investigações. O inquérito foi enviado à Corte Suprema após o Ministério Público Federal ver possível “interferência indevida” de Jair Bolsonaro (PL) nas apurações.
A avaliação tem relação com grampo que registrou Ribeiro relatando à filha que o chefe do Executivo disse, em telefonema, ter “pressentimento” de que seriam realizadas buscas contra o aliado.
M. V.