Ofício encaminhado ao procurador-geral da República, Augusto Aras, afirma que ação do presidente junto aos embaixadores pode configurar ilícito eleitoral e abuso de poder
Mais de 40 procuradores do Ministério Público Federal de 27 estados e do Distrito Federal assinaram nesta terça-feira (19) um pedido para que o procurador-geral da República, Augusto Aras, abra uma investigação sobre os ataques de Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral feitos na reunião com embaixadores realizada na segunda-feira (18).
O documento foi assinado pelo procurador federal dos direitos do cidadão Carlos Alberto Vilhena, que foi nomeado pelo procurador-geral para a função, e por mais 42 procuradores regionais. Como chefe da PGR, Aras também é o procurador-geral Eleitoral e o responsável por levar processos relacionados às eleições presidenciais ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Os signatários apontaram que a iniciativa de Bolsonaro pode ser caracterizada como uma “afronta e um aviltamento à liberdade democrática” e também pode configurar ilícitos eleitorais decorrentes do abuso de poder. “A conduta do Presidente da República afronta e avilta a liberdade democrática, com claro propósito de desestabilizar e desacreditar o processo e as instituições eleitorais e, nesse contexto, encerra, em tese, a prática de ilícitos eleitorais decorrentes do abuso de poder”, diz o documento.
CAMPANHA DE DESINFORMAÇÃO
O texto afirma ainda que, no pronunciamento desta segunda (18), Bolsonaro “atacou explicitamente o sistema eleitoral brasileiro, proferindo inverdades contra a estrutura do Poder Judiciário Eleitoral e a democracia brasileira, em clara campanha de desinformação, o que semeia a desconfiança em instituições públicas democráticas, bem como na imprensa livre”.
“A desinformação deve ser veementemente combatida, pois cria narrativas paralelas que tentam formar opiniões com base em manipulação, emoção, utilizando, inclusive, artifícios tecnológicos que podem dar uma precisão nunca outrora vista em relação ao perfil das pessoas a serem enganadas”, prossegue o documento.
“O direito à liberdade de expressão abarca também o processo de formação e divulgação das opiniões. A mudança de ideia é uma liberdade das pessoas e como a desinformação trabalha com base nas emoções, ela pode despertar sentimentos de superioridade, raiva ou medo”, destacam os procuradores que assinam o pedido.
Em virtude da greve ameaça à democracia, os procuradores solicitam que a Procuradoria-Geral Eleitoral, “adote todas as providências cabíveis e consideradas necessárias para a completa apuração dos fatos acima narrados, considerando a missão constitucional de proteção da democracia atribuída ao Ministério Público brasileiro”.
Leia aqui a nota dos procuradores na íntegra
SUPROCURADORES TAMBÉM PROTESTARAM
Também nesta terça, 21 subprocuradores da República emitiram nota pública em apoio ao sistema da Justiça Eleitoral. No texto, os subprocuradores afirmam que o cargo de presidente da República “não lhe dá o direito de dizer inverdades, nem de, impunemente, atacar as instituições em esforço para desacreditá-las”. O texto fala ainda que atentar contra as eleições configura diversos crimes.
“Para a garantia da independência da Justiça Eleitoral, a Lei enuncia ser crimes de responsabilidade, entre outros, utilizar o poder federal para impedir a livre execução da lei eleitoral, servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, subverter ou tentar subverter por meios violentos a ordem política e social, incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina e provocar animosidade entre as classes armadas, ou delas contra as instituições civis”, pontuam.
Os subprocuradores destacaram que às Forças Armadas estão sujeitas à Constituição. “O respeito à Constituição e aos Poderes de Estado é dever prioritário das Forças Armadas, que se sujeita incondicionalmente àquela, tanto quanto as demais instituições estatais. O imperativo da obediência à lei impede que se busque a apropriação indevida de atribuições que não lhe são legalmente confiadas”.
TSE E STF REPUDIARAM ATAQUES À JUSTIÇA ELEITORAL
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, se reuniu em videoconferência com Fachin e “reiterou confiança total na higidez do processo eleitoral”. “Em nome do STF, o ministro Fux repudiou que, a cerca de 70 dias das eleições, haja tentativa de se colocar em xeque mediante a comunidade internacional o processo eleitoral e as urnas eletrônicas, que têm garantido a democracia brasileira nas últimas décadas”, informou o STF.
ENTIDADES E PARLAMENTO SE MANIFESTARAM
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também protestou contra os ataques de Bolsonaro à democracia e afirmou que uma democracia forte se faz com “respeito ao contraditório, independentemente do tema”. “A segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocadas em dúvida”, disse.
Mais cedo, um grupo de dez deputados de oposição pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado em razão dos ataques sem provas que fez às urnas eletrônicas e à Justiça Eleitoral em encontro com embaixadores estrangeiros na segunda-feira.
Além dessas iniciativas em defesa da democracia, entidades como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a ABI (Associação Brasileira de Imprensa), o IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil), a AJUFE (Associação dos Juízes Federais), entre outras, também protestaram contra a manifestação de Bolsonaro aos embaixadores.