O ano de 2022 terminará com as famílias brasileiras pagando muito caro pelas refeições. Essa realidade foi apontada pelos números do Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), prévia da inflação de dezembro, apurada pelo IBGE.
De acordo com o indicador, no acumulado de janeiro a dezembro, fazer refeições em casa está 13,53% mais caro e fora do domicílio 7,97%.
No período, os preços dos alimentos acumulam alta de 11,96%, praticamente o dobro do que o registrado pelo índice geral (IPCA-15), que fechou o ano em 5,90%.
Começamos pelo café da manhã que está bem “salgado”. No ano, o Pão francês acumula alta de 18,3%, já a alta do Pão de forma chega a 28,60%. Os avanços nos preços da Manteiga, Margarina e Requeijão chegam a 23,0%, 18,50% e 17,53%, respectivamente. Por sua vez, o preço do Queijo acumula alta de 18,53%, o Presunto (7%) e o da Mortadela, produto que tradicionalmente sempre foi barato, teve um aumento de 4,07% no ano.
Também está caro tomar um Café com Leite, ou para aqueles que não gostam desta mistura, e ficam com apenas o cafezinho. Os preços do leite e do café marcam altas de 25,42% e 17,68%. Mas ambos chegaram a ultrapassar a marca dos 50% de alta durante determinado período do ano – no recorte de 12 meses.
Quem gosta de comer frutas em suas refeições e tomar um suco também pagou caro no ano. As frutas acumulam alta de 30% nos últimos 12 meses. Destaques para as altas dos preços da Maçã (49,77%), Limão (49,12%), Banana (39%), Mamão (37,3%), Tangerina (33,48%) e Melão (31,36%).
Partimos para refeição principal. Dos principais produtos que compõem o popular “prato feito” (PF), a cebola foi o que mais aumentou de um ano para outro, alta de 166%. Mas também pesaram os custos da Batata (29%), Feijão (20%), Ovo (18%), Tomate (9%), Contrafilé (4,6%), Frango (4,4%) e do Arroz (2,6%).
No geral, todos os grupos alimentícios pesquisados pelo IBGE registraram altas no ano. Tubérculos, Raízes e Legumes (37,05%), Frutas (30,03%), Farinhas, Féculas e Massas (22,3%), Leites e Derivados (22,12%), Panificados (20,08%), Enlatados e Conservas (14,93%), Hortaliças e Verduras (12,82%), Bebidas e Infusões (12,54%), Óleos e Gorduras (10,99%), Açúcares e Derivados (10,6%), Aves e Ovos (7,77%), Pescados (5,42%), Cereais, Leguminosas e Oleaginosas (4,82%), Carnes e Peixes Industrializados (3,72%), e Carnes (2,45%).
Em que pese o Brasil ser um dos maiores produtores de alimentos do mundo, os preços internos estão caros porque, além dos problemas de clima que nos atingem em determinados períodos de safras, a cadeia de produção de alimentos está mais dolarizada.
Primeiro, os insumos de produção (rações, fertilizantes, etc.) têm que ser importados – fruto de um grave processo de desindustrialização no Brasil; segundo, os preços dos combustíveis que são produzidos no país sobem acompanhando o dólar e a cotação internacional do barril de petróleo – fazendo que tanto a produção como os serviços de transporte de alimentos fiquem mais caros; e terceiro, com o real desvalorizado frente ao dólar, os produtores buscam extrair maiores ganhos pelas commodities agrícolas – o que gera também uma pressão nos preços internos.
O economista e professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Unesp, José Giacomo Baccarin, lembra que “o real foi uma das moedas que mais perderam valor no mundo em 2020”.
“E isso acirra a transmissão dos preços externos para o mercado interno, porque quanto mais desvalorizada estiver a moeda, mais reais os exportadores vão receber por venda em dólar e mais reais os importadores pagam nas compras em dólar. E, portanto, mais reais o consumidor interno acaba pagando pelos alimentos. Então, temos um problema sério no Brasil. Que está ligado à situação internacional, mas também à nossa política cambial, feita sem intervenção nenhuma e que deixou que esta desvalorização fosse repassada ao consumidor interno”, afirmou o engenheiro agrônomo, em reportagem do Jornal da Unesp.
Baccarin dá um exemplo prático do problema que nos cerca: “Vamos imaginar um produtor brasileiro com uma tonelada de açúcar em estoque. Naquele momento, o preço no mercado internacional seria mil dólares a tonelada. Esse produtor vai cobrar, no mercado interno, o correspondente a mil dólares. Se o câmbio estiver quatro por um, ele vai cobrar R$ 4 mil. Se o câmbio se valorizar, e passar a cinco por um, ele vai cobrar R$ 5 mil. Então, o que ele receber lá fora, repassa aqui dentro. Se o preço lá fora subir, passar de mil dólares para mil e quinhentos dólares, o produtor vai repassar o aumento de preço lá fora aqui dentro”.
“Esse é o problema geral do consumidor brasileiro: nossa grande vinculação aos preços internacionais pelo lado das exportações. Segundo a racionalidade do empresário, não há por que vender aqui dentro mais barato do que vender lá fora”, ressaltou Baccarin.
Também pesou o desmonte iniciado no governo de Temer, mas continuado pela gestão de Bolsonaro, das políticas de estoques reguladores de alimentos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e de fomento à produção de agricultores familiares – setor que é responsável por cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil.
Diante disso, os consumidores brasileiros ficaram desprotegidos das séries de crises e choques que atingem o mercado global, como a gerada pela pandemia de covid-19, a guerra na Europa entre Rússia e Ucrânia e das especulações das bolsas internacionais.
A carestia dos alimentos é cruel com os que vivem na pobreza, porém, ainda mais para os que estão na extrema pobreza. De acordo com dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (PENSSAN), “Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil”, em números absolutos, são mais de 125,2 milhões de brasileiros que sofrem com algum nível de insegurança alimentar, sendo que 33 milhões passam fome. A pesquisa revela, ainda, que a maior proporção de famílias nessa situação está nas regiões Norte e Nordeste do país e aponta que o risco da fome atinge 37,8% dos domicílios onde vivem crianças de até 10 anos.