
Das crianças brasileiras retidas, quatro estão em Chicago e seis em Houston.
Encerrado o prazo de 30 dias dado pelo juiz Dana Sabraw para que o governo dos EUA reintegrasse todas as crianças separadas dos pais imigrantes na fronteira sul, sob a xenófoba e imoral política de ‘tolerância zero’, o regime reconheceu que 711 crianças continuam sem ser entregues aos seus pais, ou seja, seguem sob sequestro de Trump. 10 dessas crianças são brasileiras. Das 711, há 431 cujos pais já haviam sido deportados dos EUA – sem terem sequer podido se despedir delas.
Agora a União Americana das Liberdades Civis (ACLU), principal entidade de direitos civis do país, e que conseguiu na justiça a ordem de reunir as famílias separadas, corre contra o relógio para barrar a decisão do regime Trump de deportar imediatamente todas as famílias que foi obrigado a reunificar, meta oficializada no início da semana. A ACLU estimou em 900 os pais ameaçados de deportação imediata.
Conforme os números apresentados ao juiz Sabraw na quinta-feira (26), 1.820 crianças de cinco anos ou mais foram reunidas aos pais detidos em prisões para imigrantes. Apenas 378 das crianças de cinco anos ou mais foram libertadas por completo, seja devolvidas aos pais liberados da custódia, ou a outro membro da família ou amigo que mora nos EUA. A patrulha da fronteira de Trump havia, ao todo, sequestrado 2.551 crianças. Para as crianças menores de cinco anos, o prazo limite havia sido o dia 14.
Para manter essas 711 crianças nos cativeiros a que pomposamente chama de abrigos, o governo Trump deliberou considerar “inelegíveis” à reunificação suas famílias, alegando desde que já deportou o pai ou a mãe, até supostos “antecedentes criminais” deles – às vezes uma multa de trânsito ou número incorreto de inscrição na seguridade – ou “doenças transmissíveis”. Das crianças brasileiras retidas, quatro estão em Chicago e seis em Houston.
Dificilmente sequestro em massa de crianças, inclusive bebês, por um governo poderia merecer outra qualificação que não seja crime contra a Humanidade. O repúdio interno e internacional forçou o regime Trump a recuar, mas nem por isso perderam a empáfia e o cinismo. Em teleconferência de imprensa, um esbirro da Gestapo da fronteira de Trump, após reclamar da “quantidade excessiva de recursos gastos” na reunificação das famílias, acrescentou que os pais que foram deportados sem seus filhos “o fizeram depois de terem tido a oportunidade de ter esse filho acompanhando-os a caminho de casa”.
E, explicitando toda a desumanidade que move esse governo ignóbil, declarou que “não podemos forçar um pai a aceitar a criança com ele”. O mesmo débil mental, ao ser perguntado como o ICE (sigla em inglês da agência de imigração e alfândega) localizaria esses pais para que os filhos lhes fossem devolvidos, atreveu-se a responder: “eles foram deportados. Não rastreamos os indivíduos depois de terem sido deportados para países estrangeiros”.
Em suma, tentam imputar às vítimas indefesas os crimes que eles próprios, a soldo de Trump, cometeram. Mas as histórias coletadas pelos advogados da ACLU e os inúmeros relatos da mídia permitem um desmentido cabal: uma mãe analfabeta foi informada de que a assinatura de um formulário do governo “a levaria a se reunir com seu filho de 16 anos” e, logo em seguida, descobriu que “acabara de supostamente renunciar a seus direitos de vê-lo novamente”.
Em outro caso, funcionários da imigração disseram a uma mãe que declarou seu desejo de pedir asilo que “requerer asilo levaria de seis a oito meses e que ela não veria a filha durante esse período”. A entidade denunciou também que os pais eram levados para salas “com 30 a 50 outras pessoas” e obrigados a preencher formulários “com apenas alguns minutos para decidir se deixariam ou não seus filhos nos Estados Unidos”.
“Um pai que foi informado de que o único caminho para sua filha, que enfrentava perigo mortal na Guatemala, permanecer nos Estados Unidos era assinar ‘este documento’. Ele não teve a oportunidade de revisar o documento ou fazer perguntas. Ele não tinha ideia de que, ao assiná-lo, concordou com a partida voluntária e renunciou ao seu direito de se reunir com ela. Tudo durou um minuto”, conforme a ACLU.
Uma crueldade completa, praticada com frieza, para aterrorizar latinos, criminalizar a imigração ilegal, inviabilizar o direito de asilo, servir de moeda de troca para aprovar a verba para o muro na fronteira e instigar o ódio a fim de obter ganhos eleitorais em novembro. Brutalização poucas vezes vista de crianças, em um país que ousa dar aulas de direitos humanos, hipocritamente, ao planeta inteiro.
Como no relato da CNN, sobre um menino de 11 anos, recém reintegrado à mãe: “mal conseguia falar durante toda a entrevista, apenas algumas vezes balançando a cabeça para responder perguntas simples – sim ou não. Olhava para frente parecendo se concentrar para não chorar. Sua mãe repetidamente disse para ele falar conosco, mas ele não podia”. Jose Dolores Munoz, um salvadorenho que se reuniu com a filha de sete anos na semana passada, após quase dois meses separados, relatou ao Guardian como a confusão e o medo perduram. “Sua filha chora quando ele sai de casa porque ela acha que ele não vai voltar. ‘Ela está com medo’, disse Munoz em espanhol. ‘Ontem eu a deixei chorando, ela está me dizendo: ‘Você não vai voltar. Você está mentindo. Você está me deixando”.
A.P.