
Sob a conclamação de “reforma da previdência de Medvedev é genocídio”, protestos se espraiaram por 100 cidades, inclusive a segunda maior do país, São Petersburgo. Moscou reuniu o maior ato
Multidões por toda a Rússia repudiaram no fim de semana o malsinado projeto do primeiro-ministro Dmitri Medvedev que, repetindo uma cantilena em voga no Ocidente inspirada no FMI, quer impingir a ‘reforma da previdência’ para reduzir a idade mínima de aposentadoria dos atuais 55 para 63 anos (mulheres) e de 60 para 65 anos (homens). “Tirem as mãos de nossa aposentadoria!”, bradaram os manifestantes que exigiram, ainda, a realização de um referendo nacional.
O maior ato aconteceu em Moscou, no sábado (28), com 100 mil pessoas atendendo à convocação dos sindicatos, do Partido Comunista da Federação Russa, da Frente de Esquerda, do Komsomol (juventude) e de dezenas de organizações sociais. Uma petição na internet contra o ataque às aposentadorias já obteve 2,9 milhões de assinaturas. 90% da população é contra, segundo uma pesquisa.
Sob as conclamações de “aposentados, sim, oligarcas, não”, “reforma da previdência de Medvedev é genocídio” e “só no caixão vamos ver essa pensão”, as manifestações se espraiaram por mais 100 cidades, inclusive a segunda maior do país, São Petersburgo. No domingo, a chamada ‘oposição liberal’ tentou pegar carona na mobilização contra o assalto à previdência, mas só juntou uns gatos pingados.
Medvedev tentou empurrar o monstrengo enquanto o povo russo supostamente estaria distraído com a Copa do Mundo, mas o estratagema não funcionou e as mobilizações, iniciadas pelas cidades que não eram sede de jogos, agora chegam a Moscou, onde tudo se decide. Na tentativa de abafar os protestos, o plano faz a elevação da idade de aposentadoria por etapas, seis meses a cada ano, o que se concluiria até 2028 para os homens e 2034 para as mulheres.
Ao ver o gigantesco apoio popular, conquistado ao restaurar a soberania da Rússia no mundo, minguar de 80% para 63% após a proposta de “reforma de Medvedev”, o presidente Vladimir Putin, que jamais a respaldou inequivocamente, resolveu colocar as barbas de molho e declarou que “nenhuma das propostas relacionadas com o aumento na idade de aposentadoria o agrada”.
Já os deputados da Rússia Unida têm se exposto ao maior ridículo ao defenderem a indefensável proposta de uma reforma que sequer atende à população cuja estimativa de vida em várias regiões do imenso país que é a Rússia fica abaixo do mínimo proposto,
O que foi denunciado vividamente pelo presidente dos comunistas russos, Genadi Ziuganov: “Quero chamar vossa atenção para o fato de que em 36 regiões da Rússia os homens não vivem até os 65 anos de idade. E na Sibéria, no Extremo Oriente, nas regiões russas do norte, a idade média é de 61 a 62 anos. Isso significa que todos receberão sua aposentadoria no túmulo”.
Ao dizer que “não lhe agrada” o aumento da idade mínima de aposentadoria, Putin também se referiu à justificativa principal usada pelos governos que decidiram resolver a crise arrochando os trabalhadores: a de que hoje, no caso da Rússia, há seis trabalhadores da ativa para cada cinco aposentados, o que irá mudando no sentido de que haverá um déficit crescente, que terá que ser, se não for enfrentado, custeado por outro fundo público.
Mas é bom olhar o que acontece ali de onde partiu a “idéia”. Em primeiro lugar, porque os especuladores e banqueiros estariam preocupados com eventos que acontecerão daqui a 30 ou 40 anos, se o problema deles é hoje: como tirar, para os bancos, mais dinheiro público?
Assim, empalmar o fundo de aposentadorias é a exacerbação do que já é feito, ao cortarem impostos dos ricos, não taxarem bancos e dividendos e ao estabelecerem um teto máximo para desconto para o sistema público de aposentadoria.
Querem forçar o mundo inteiro à situação dos EUA, onde uma parte importante dos aposentados já está sob o famigerado sistema de ‘capitalização’, isto é, ao invés do princípio solidário, em que o trabalho de todos de hoje garante a aposentadoria, todo mundo seria obrigado uma ‘conta individual’, a entregar aos bancos forçadamente suas economias, para que especulem. No caso, essa é a “nova” proposta de Macron para os franceses, e velha para os chilenos, presenteados por Pinochet com assessoria dos Chicago-boys.
Quanto a esse tipo de assalto, as manifestações deste final de semana não poderiam ser mais claras, com palavras de ordem como “não se pode salvar o orçamento do país com as aposentadorias do povo” – um dos pretextos favoritos de Medvedev de porque sua reforma é “inadiável”.
“NÃO AO ACHAQUE!”
Ao que os protestos respondem com “não ao achaque das aposentadorias, sim ao imposto progressivo sobre os ricos” e “nacionalizem a riqueza do país – haverá dinheiro para as aposentadorias”. Foi notada a grande presença de jovens nos atos de repúdio a Medvedev. O que é explicado pela compreensão de que a reforma “priva os jovens do futuro e os veteranos, da vida”. Já começam a surgir vozes mais ríspidas: “renuncia Medvedev” e “abaixo os ministros capitalistas”
Se o primeiro-ministro Medvedev não recuar, ou Putin não intervir, os protestos poderão se radicalizar. Em nome da Frente de Esquerda, Serguey Udaltsov, apresentou a proposta de realização de uma Marcha de milhões de trabalhadores, aposentados, jovens e mulheres em setembro, antes da votação final da lei. Aos sindicatos, foi pedido que discutam uma greve geral em setembro, contra o aumento da idade de aposentadoria.
ANTONIO PIMENTA