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A investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes está mais próxima de uma conclusão, após, nesta segunda-feira (24), informações terem sido reveladas pelo ex-policial militar Élcio Queiroz, que assinou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal.
Queiroz está preso preventivamente desde março de 2019, acusado de dirigir o carro usado na noite do crime. Mesmo com o acordo, ele permanece preso e confirmou a sua participação, além de apontar outras pessoas como coparticipantes do crime.
As declarações, que foram colhidas no presídio federal de Brasília (DF), levaram à Operação Élpis, da Polícia Federal (PF) em conjunto com o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), que cumpriu um mandado de prisão preventiva contra o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa e sete mandados de busca e apreensão, nesta segunda-feira.
Em seu depoimento, Élcio Queiroz afirmou que Ronnie Lessa – sargento reformado que, assim como ele, está preso desde março de 2019, foi o autor dos disparos que mataram Anderson e Marielle, após a vereadora participar de um evento na Casa das Pretas, no bairro carioca da Lapa.
MACALÉ
De acordo com a delação de Élcio Queiroz, a contratação de Ronnie Lessa para matar Marielle teria sido intermediada por Edimilson Oliveira da Silva, conhecido como Macalé, que era sargento reformado da Polícia Militar e foi executado em novembro de 2021, aos 54 anos.
De acordo com testemunhas, Macalé caminhava pela Avenida Santa Cruz, em Bangu, na Zona Oeste do Rio, em direção ao seu carro, uma BMW, quando foi abordado por homens em um veículo branco. O policial foi atingido por vários disparos e morreu no local. O delator disse ainda que Macalé teria participado das “campanas” feitas para vigiar os passos de Marielle na preparação para o crime. “Inclusive foi através do Edimilson que trouxe… vamos dizer, esse trabalho pra eles; essa missão pra eles foi através do Macalé que chegou até o Ronnie”, disse Queiroz aos investigadores.
MAXWELL
Élcio narrou também a participação de um terceiro indivíduo, o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa.
Conhecido como Suel, o bombeiro fazia “campana” seguindo Marielle e depois do assassinato ainda teria ajudado a esconder armas de Ronnie Lessa e levado o carro utilizado na noite do crime para um desmanche.
O ex-bombeiro já havia sido preso, em junho de 2020, por obstrução de Justiça, acusado de atrapalhar as investigações da morte da vereadora e do motorista, mas cumpria a pena em regime domiciliar.
“Maxwell auxilia no crime tanto antes, na manutenção e guarda do carro, na vigilância da vereadora. Após o crime, ele auxilia os executores a trocar as placas do veículo, auxilia também ao contatar a pessoa que foi responsável por se desfazer do carro. E Maxwell era quem auxiliava na manutenção da família do Élcio. Ele vinha auxiliando os executores a se eximirem da sua participação do crime. Ele solto continuaria a se desfazer de provas, com indícios de movimento do Maxwell em atividades de organização criminosa”, disse o promotor Eduardo Morais.
PACTO DE SILÊNCIO ROMPIDO
“Conseguimos, em um trabalho conjunto com o MP, exaurir e determinar com muita precisão, e com lastro probatório muito importante e firme, como foi aquele dia 14 de março de 2018”, disse o superintendente regional da PF, Leandro Almada da Costa, em entrevista coletiva, no Rio de Janeiro.
O superintendente ainda disse que, “um pacto de silêncio foi rompido” com a delação.
Com a delação, os investigadores descobriram que Ronnie Lessa fez pesquisas sobre o CPF e endereço da vereadora Marielle Franco e sua filha Luyara Franco dois dias antes do crime. Essa pesquisa foi feita de um site privado de pesquisas de crédito.
“Esse fato não tinha sido explorado pela persecução penal, é um fato que foi colhido pelo Ministério Público e trabalhado em conjunto e quando apresentado ao colaborador de fato foi um incentivo a sua colaboração”, disse o delegado da PF, Guilhermo Catramby sobre a negociação para Élcio topar a delação.
PLANEJAMENTO
Segundo a investigação, por aplicativo de mensagem, ao meio dia do dia 14 de março de 2018, Ronnie convida Élcio Queiroz para sua residência, no condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca. O condomínio é o mesmo onde Jair Bolsonaro morava antes de assumir a Presidência da República.
Na casa de Ronnie, Élcio o vê com uma bolsa e em seguida, os dois embarcam no Chevrolet Cobalt prata em direção à Casa das Pretas, na Lapa, onde Marielle participava de um evento com tema “Mulheres negras movendo estruturas”.
Ao chegar no local, Ronnie Lessa passou para o banco de trás, onde se equipou com as armas. Quando a vereadora deixa o evento em um carro dirigido pelo motorista Anderson Gomes e acompanhada de sua assessora Fernanda Chaves, “ambos seguiram, emparelharam e aí nós sabemos o que aconteceu”, disse delegado Catramby.
Por volta das 21h, o carro de Marielle é alvejado com 13 tiros de uma submetralhadora HK MP5. Marielle foi atingida por quatro tiros na cabeça e Anderson, por três. Os dois morreram no local. Fernanda não foi atingida, mas ficou ferida pelos estilhaços.
Após cometerem o crime, ambos tomaram o acesso à Avenida Brasil e seguiram pela Linha Amarela até o Méier. Interfonaram para o irmão de Ronnie, Denis Lessa, entregaram-lhe a bolsa contendo os equipamentos utilizados no crime e pediram que Denis chamasse um táxi para ambos até a Barra da Tijuca. Na Barra, eles embarcam no carro de Ronnie, religaram seus celulares e seguiram para um bar.
“A rota de fuga ele [Élcio] detalha com minúcias. Ambos seguiram o trecho da [Avenida] Leopoldina, pegaram o acesso da Avenida Brasil, dali foram para a Linha Amarela, desceram na última saída da Linha Amarela em direção ao Méier. De lá, pararam o veículo na casa de Ronnie Lessa, interfonaram para o irmão Denis Lessa, entregaram-lhe a bolsa contendo os apetrechos usados no crime”, descreveu o delegado Catramby.
“A partir disso, Ronnie solicita que seu irmão chame um táxi. E aí [temos] nosso elemento de corroboração mais preciso e mais contundente. Conseguimos junto à corporação de táxi o rastreamento dessa corrida de ambos, do Méier até a Barra da Tijuca, local no qual eles embarcam novamente no carro de Ronnie Lessa, ativam seus celulares e seguem então para o [restaurante] Resenha”, completou.
TENTATIVA ANTERIOR
À Polícia Federal e ao MPRJ, Élcio afirmou que Ronnie disse ter tentado cometer o crime meses antes, no final de 2017.
Segundo Élcio, os dois estavam juntos na virada do ano de 2017 para 2018, quando Ronnie, alcoolizado, começou a desabafar e contou que semanas antes ele havia tentado “pegar a mulher que estavam monitorando há alguns meses”.
Na ocasião, Ronnie disse a Élcio que estava acompanhado de Suel e Macalé. Ainda de acordo com o relatado por Élcio na delação, Ronnie contou que a tentativa foi frustrada, porque na hora do cometimento do crime, Suel disse que o carro “deu problema” e “falhou”.
“Contudo, Ronnie acreditava que Maxwell refugou, porque havia ficado com medo de continuar”, diz a delação.
Ronnie narrou, ainda, que nesse dia em que os três foram atrás da “mulher monitorada”, ela estava em um táxi, próximo ao bairro Estácio. Na ocasião, Maxwell estava como motorista, Ronnie com uma submetralhadora MP5 no banco de carona e Edmilson com um fuzil AK47 no banco de trás, “para segurar o trânsito se houvesse necessidade”, conforme o delatado por Élcio.
O promotor Eduardo Morais ainda acrescentou que o assassinato de Marielle foi motivado pelas “causas defendidas” pela vereadora, às quais Ronnie Lessa tinha “ojeriza”. Ele não exclui outras motivações.
“O crime foi praticado por conta, também, das causas defendidas por Marielle. Isso não exclui outras motivações. Não exclui o fato de que Ronnie tinha ojeriza às causas defendidas por ela, isso está na primeira denúncia e permanece”, disse.
MANDANTES
Em outra coletiva de imprensa, mais cedo, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que agora a investigação mudou de patamar e terá como novo foco os mandantes do crime.
“A investigação agora se conclui em relação ao patamar da execução e há elementos para um novo patamar, qual seja investigação dos mandantes do crime. Naturalmente, há aspectos que ainda estão em segredo de Justiça”, declarou o ministro.
“Nas próximas semanas, provavelmente haverá novas operações derivadas desse conjunto de provas colhidas hoje”, acrescentou o ministro. Dino ainda disse que “é indiscutível” o envolvimento das milícias do Rio de Janeiro no caso, “até onde vai isso, as novas etapas vão revelar”.
“Sem dúvida, há a participação de outras pessoas, isso é indiscutível. As investigações mostram a participação das milícias e do crime organizado do Rio de Janeiro no crime”, disse o ministro da Justiça, dizendo que “não há crime perfeito”.
“Os fatos até agora revelados e as novas provas colhidas indicam isto, que há forte vinculação desses homicídios, especialmente o da vereadora Marielle, com atuação das milícias e do crime organizado no Rio de Janeiro. Isto é indiscutível. Até onde vai isso? As novas etapas vão revelar”, completou.