
Desde janeiro a Associação das Empresas de Energia Elétrica (Aelec) vinha alertando para a “falta histórica de investimentos na rede”
Apesar dos aumentos descomunais nos preços das tarifas de energia elétrica na Espanha, a completa falta de compromisso com investimentos na produção e distribuição foi a responsável pelo apagão que tomou a Península Ibérica e 15 países europeus nesta segunda-feira (28).
Em alerta emitido no mês de janeiro, a Associação das Empresas de Energia Elétrica (Aelec) criticou a “falta histórica de investimentos na rede”, apontando que entre 2015 e 2020, 32% das inversões previstas não foram executados, ao contrário das tarifas que apresentaram um “crescimento significativo”.
CORTE NOS INVESTIMENTOS NA RREDE ELÉTRICA DOMINADA POR FUNDOS ABUTRES
Em um país em que este setor estratégico se encontra controlado por um oligopólio que une grandes empresas e fundos de “investimento” (abutres), a escuridão foi sentida dos prédios às ruas, dos transportes às comunicações.
O blecaute começou por volta das 12h30 na Espanha (hora local), quando o consumo era de cerca de 25.184 megawatts. De repente, caiu para 12.425 megawatts. A situação degringolou, com a situação somente voltando a se normalizar a partir da uma e meia da manhã, mesmo assim sem que todos fossem contemplados com o retorno da energia.
A Rede Elétrica Espanhola (REE), encarregada da manutenção, tem uma composição 20% pública e 80% privada, distribuída entre diferentes fundos como a famigerada BlackRock com 4,64%, ou acionistas como Amancio Ortega (empresário dono da rede de roupas Zara) que possui 5%.
Minada por interesses privados é esta REE que “informou” ter ativado a restauração do fornecimento de eletricidade e que continua analisando as causas da catástrofe – na verdade, gerada pela falta de investimento.
O próprio presidente espanhol, Pedro Sánchez, apareceu no final da tarde de segunda para tergiversar, dizendo que até o momento não se descartava “qualquer hipótese” sobre as causas do que havia jogado seu país às escuras.
Conforme os técnicos, um apagão dessa magnitude é causado por um desequilíbrio entre a geração e o consumo de energia elétrica. Quando isso ocorre, a frequência de transmissão elétrica muda e algumas proteções são acionadas para evitar danos aos equipamentos. Se isso acontecer em cadeia, o consumo e a geração ficam ainda mais desequilibrados e podem resultar em um apagão. Foi o que ocorreu.
Numa publicação de 2021, alguns estados membros da União Europeia alertavam para os riscos da guerra entre a Ucrânia e a Rússia desembocar em um “apagão global”, o que vinha sendo apontado pelo governo espanhol como um risco mínimo para o país. Foi dito e repetido que a interconexão com o resto da Europa era débil, o que reduziria possíveis incidências, e por outro lado existiriam reservas de energia suficientes para evitar um apagão de longa duração. Toda a alegação, conforme foi comprovado, era uma mentira.
Caso o problema tenha sido localizado na França – como sustentam algumas fontes -, os mecanismos de desconexão na península não funcionaram corretamente. E mesmo que o problema tivesse sido encontrado na Espanha, não funcionaram nem os mecanismos de isolamento de falhas elétricas, nem as reservas de energia.
“Se a empresa que administra um setor estratégico é tão essencial para a vida de todos como a distribuição de energia elétrica, a pergunta que devemos nos fazer é: a gestão que a REE faz é para favorecer o serviço que deve prestar à população ou para otimizar os lucros de seus acionistas? A REE manteve os mecanismos de direção da rede adequadamente? Ativou os protocolos necessários para acionar a reconfiguração de rede necessária em caso de falha? Se um blecaute era tão improvável na Península, o que deu errado desta vez? E se isso acontecer novamente, o que mudaria?”, questionou o site Rede Internacional, fazendo ecoar indagações colhidas nas reportagens. “Por enquanto, todas essas perguntas permanecem sem resposta devido à falta de transparência da REE e do governo espanhol, que ainda não comunicou a causa da falha”, denunciou o site.
Paira entre os espanhóis uma séria dúvida sobre como um setor tão estratégico para suas vidas, que diz respeito ao seu cotidiano pessoal, de empresas e indústrias, possa continuar sendo gerido em função de interesses de interesses rentistas e especulativos, que sobrepõem o lucro aos da coletividade.