200 lideranças lançam campanha mundial pela libertação do deputado palestino Marwan Barghouti

O líder palestino Marwan Barghouti, que desconheceu o tribunal de ocupação israelense, faz o V da vitória da causa palestina ao ser conduzido à sala da corte pela polícia de Israel (Arquivo)

Diante das denúncias apresentadas por seu filho Aarab, de tortura cometidas contra o mais popular líder palestino, que Israel mantém há 23 anos sob custódia, destacadas personalidades internacionais acabam de lançar a campanha pela libertação de Marwan Barghouti

“Expressamos nossa profunda preocupação com a contínua prisão de Marwan Barghouti, os maus-tratos violentos aos quais ele é submetido e a negação de seus direitos legais enquanto encarcerado”, diz a carta aberta publicada nesta quarta-feira (dia 3), apelando aos povos que se manifestem e às Nações Unidas e ainda governos para que tomem todas as medidas necessárias à sua libertação.

A carta tem assinaturas de personalidades destacadas dos mais diversos setores profissionais, políticos e artísticos, a exemplo do ator Javier Bardem; da ativista Angela Davis; escritora Margareth Atwood; ator Mark Ruffalo, cantores e compositores Paul Simon e Annie Lennox.

Em outubro, Aarab, filho de Barghouti afirmou que seu pai havia sido brutalmente espancado por carcereiros israelenses durante uma transferência de prisão em setembro, resultando em quatro costelas quebradas, ferimentos na cabeça e perda de consciência por alguns momentos.

Foi neste momento, relata Aarab, que a família de Barghouti resolveu procurar ativistas que já participavam de diversos tipos de ações pelo fim do apartheid e ocupação exercidos pelo regime israelense para lançar a campanha por sua libertação.

“Não é uma ideia sem fundamento dizer que o governo israelense é capaz de assassinar meu pai”, alerta, em um vídeo, divulgado pela Al Jazeera, o filho de Barghouti.

Segundo ele, os israelenses não querem que a voz, capaz de unificar o povo palestino e de ser um real interlocutor para uma solução de paz justa e abrangente, circule e se manifeste livremente.

Em outro vídeo, Aarab conclama os líderes internacionais a elevarem sua voz contra a prisão de Marwan:

“Acabamos de ouvir as perturbadoras notícias trazidas por prisioneiros liberados, que estão no exílio no Egito, sobre os fatos de que meu pai foi agredido pela quarta vez nos últimos dois anos. E isso é uma clara ameaça contra sua vida. Nós já perdemmos 76 palestinos, presos políticos dentro de prisões israelenses e nós não vamos esperar para que meu pai perca sua vida”, inicia o filho de Marwan Barghouti.

“Estamos falando de um figura unificadora, um líder que unifica. Um líder que desfruta da confiança de todo o povo palestino e é exatamente por isso que ele representa uma ameaça para o atual governo de Israel”, pressegue Aarab.

“Eu chamo a todo o mundo, a todos os que escutam essa mensagem que, por favor, se pronunciem sobre o que está acontecendo com Marwan Barghouti. Querem assassná-lo dentro da cadeia. Nada os deterá exceto pela pressão, uma pressão que reúna a comunidade internacional. Uma pressão abraçada pelos povos e pelas organizações que apóiam a Causa Palestina.

“Este é um homem que dedicou sua vida e a tem sacrificado por esta causa!

“Ele já passou 30 anos em prisão, além de mais de sete anos no exílio. Ele é aquele que encabeçou o Documento dos Prisioneiros, que foi a pedra fundamental para a Unidade Palestina. Ele tem sempre tomado iniciativas para unificar o povo palestino e eu penso que a unificação do povo palestino é o caminho para trazermos paz e estabilidade.

“O único caminho para trazer a paz é através da unificação do povo palestino em direção a uma visão política que seja acatada por todos na Palestina e é isso o que precisamos.

“Nõs não devemos permanecer divididos. Ficar espalhados por nosso território.Precisamos de uma visão unificadora que represente os anseios de todos os palestinnos, tanto no interior da Palestina, como em sua diáspora.

“É exatamente isso que meu pai representa.Ele precisa de vocês, a causa dos milhares de presos políticos palestinos precisa de vocês.

“E nós precisamos levantar nossas vozes. Não podemos achar que o genocídio acabou em Gaza, ou que tudo foi superado. É cada vez mais necessária a voz das pessoas, que fale da Palestina, que fale sobre os presos, sobre meu pai e sobre o que ele representa para o povo palestino.

A SAGA DE MARWAN BARGHOUTI

Nascido em 1959 em uma aldeia nos arredores de Ramallah, na Cisjordânia – oito anos antes da ocupação israelense após a Guerra dos Seis Dias – Barghouti ingressou no Fatah e na Organização para a Libertação da Palestina (OLP) aos 15 anos.

Logo tornou-se coordenador do movimento Shabiba (a juventude do Fatah).

Ele vinha de uma família numerosa, profundamente ligada à política palestina tradicionalista, e muitos de seus parentes são ativos na causa nacionalista. Aos 18 anos, Barghouti foi preso, acusado de pegar em armas contra a ocupação, concluiu o ensino médio e aprendeu hebraico na prisão.

Após sua libertação, Barghouti matriculou-se na Universidade de Birzet e tornou-se líder do grêmio estudantil. “Marwan costumava fazer discursos incentivando as pessoas a saírem às ruas para protestar e explicando-lhes contra o que estavam lutando: os assentamentos, as prisões, a destruição”, recordou Said Ghazali, também membro do grêmio estudantil. “Ele é carismático, um bom orador e compreende o poder da sua linguagem corporal quando fala”.

No curso de pós-graduação da Universidade de Birzet (Cisjordânia) concluiu o mestrado em Ciências Políticas e o doutorado na mesma cadeira pela Universidade do Cairo, depois disso tem se dedicado a ensinar os companheiros palestinos presos.

Em 1987, durante a Primeira Intifada, a denominada “Revolução das Pedras”, quando o movimento pela libertação da Palestina adquiriu seu caráter de manifestações de massas, Barghouti emergiu como líder dos protestos na Cisjordânia.

Em 1989, tornou-se o membro mais jovem do Conselho Revolucionário do Fatah, mas logo foi deportado para a Jordânia. Retornando do exílio em 1994, dois anos depois foi eleito deputado para o parlamento palestino, representando Ramallah.

Os Acordos de Oslo, assinados em 1993 por Yitzhak Rabin (que logo seria assassinado por um fanático judeu incitado pela direita antipalestina de Israel, em campanha de difamação encabeçada por Netanyahu) e Yasser Arafat, deram início a uma transferência gradual da autoridade governamental para os palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.

 A política palestina era, então, dominada pelos integrantes da velha guarda, mas também disputada por organizações islâmicas, e correntes políticas diversas (desde os marxistas, a exemplo de Habbash e Hawatme, até os da direita, a exemplo de Gibril, que contestava a liderança de Arafat). Em torno de Arafat estava a velha guarda da Organização para a Libertação da Palestina, que havia retornado com ele do exílio em Túnis. Neste quadro o jovem Barghouti era uma estrela em ascensão de uma geração mais jovem de ativistas que cresceram no ambiente efervescente dos territórios ocupados e da Intifada.

Barghouti acabou por comandar a corrente Tanzim, que contava com milhares de jovens filiados ao Fatah (partido de Arafat). Esta corrente tinha um braço armado, as Brigadas dos Mártires de Al Aqsa, preparada para o recrudescimento da agressão israelense nos territórios.

Foi com a ascensão de Ariel Sharon ao poder, rasgando todos os acordos anteriores entre Israel e Palestina, profanando os locais árabes sagrados, que levou à Segunda Intifada, com os palestinos rebelados contra o carniceiro de Sabra e Shatila. Barghouti teve um papel destacado na Segunda Intifada.

ILEGALIDADE DA PRISÃO E AUSÊNCIA DE PROVAS NO TRIBUNAL

Foi preso pelas tropas de ocupação em 15 de abril de 2002 e somente foi levado a julgamento em 2004.

Ao entrar na sala de julgamento da Corte israelense, ainda algemado, ergueu os braços com o os dedos simbolizando “V” da Vitória e recusou-se à defesa alegando desconhecer o tribunal de ocupação. Foi condenado a cinco prisões perpétuas em suposições contestadas.

Logo no início de sua jornada como prisioneiro, Barghouti ficou em solitária por três anos.

Na prisão coordenou manifestações contra maus tratos e má alimentação e, em 2006, coordenou uma carta aberta denominada Documento dos Prisioneiros, assinado por todas as facções palestinas, incluindo a Hamas e a Jihad Islâmica  

Em entrevista concedida ao jornalista David Issasscharov, do jornal israelense Haaretz, Barghouti, seguindo a posição de Arafar, determinou a condição básica para o fim do conflito Israel-Palestina: “A retirada de Israel para as linhas de 1967 e o estabelecimento de um Estado da Palestina trará o fim do conflito Israel-Palestina”.

Segundo seu filho Aarab, é exatamente por querer manter o conflito, ao invés de um acordo que inclua a criação do Estado da Palestina, que faz com que o governo de Israel o mantenha preso e ameace sua vida. Ao ponto do ministro da Segurança de Israel, o fascista Gvir ter achado necessário visita-lo na prisão para ameaça-lo pessoalmente: “Vocês não vencerão”, disse Gvir ao prisioneiro.

Fica claro que é exatamente o contrário, a força reunida na figura histórica e épica de Marwan Barghouti que levou Gvir a ir importuna-lo em uma prisão ilegal ditada pelas normas que violam as leis internacionais.

A União Interparlamentar, com sede em Genebra expediu relatório questionando a validade dos elementos que embasaram a sentença contra Barghouti:

O extenso relatório questiona desde a condição legal para o tribunal israelense julgar e para as forças israelenses de detê-lo, uma vez que os Acordos de Oslo transferem a jurisdição sobre crimes cometidos por cidadãos palestinos ao sistema legal palestino. Isso fica ainda mais grave considerando o fato de Barghouti ser um deputado eleito pelos palestinos e que, pelas leis palestinas, goza de imunidade parlamentar.

Quanto aos fatos apresentados pela promotoria israelense e admitidos pelo juiz israelense, o autor do relatório, Simeon Foreman, contesta todas as “provas” apresentadas:

“1 – Eu não pude ter acesso ao material de evidências abduzido e que essencialmente conta com documentos apreendidos no escritório de Barghouti. Boulus, o advogado de defesa, declarou que o material apreendido era fundamentalmente pronunciamentos de Barghouti no parlamento palestino e que em nenhum destes documentos havia qualquer implicação do acusado com as questões pelas quais era acusado.  

2- A promotoria chamou cerca de 100 testemunhas. As transcrições das sessões, que me foram entregues em hebraico e que pude consultar com apoio de um tradutor juramentado, senhor Bitar, diz que 96 testemunhas foram ouvidas.

3 – Destas testemunhas, 63 eram investigadores ou indivíduos associados à investigação sobre o senhor Barghouti e que, portanto, não tinham como dar um testemunho imparcial sobre as ações imputadas ao acusado.

4 – Além disso, 12 destas testemunhas eram vítimas ou que viram os ataques a bomba dentro de Israel, mas não tinham nenhuma informação que levasse ao envolvimento pessoal do acusado.

5 – Dos convocados pelo tribunal, 21 estariam em condição de testemunhar algo em relação a Barghouti. Destas, 12 disseram ao tribunal explicitamente que não havia nenhum envolvimento do acusado com os crimes a ele imputados ou que se recusavam a testemunhar diante de um tribunal do qual desconheciam a validade da sua jurisdição.

6 – Isso fez com que até o tribunal israelense admitisse somente envolvimentos indiretos: que Barghouti teria sido informado das ações antes delas acontecerem; de que ele poderia ter financiado algumas destas ações; ou ainda que tivesse ordenado a aquisição de armas para as operações. Mesmo estas afirmações foram contestadas por testemunhas dizendo que o fizeram sob intensa pressão”.

São elementos que demonstram cabalmente que o deputado Marwan Barghouti segue preso sob nenhuma sustentação legal e mais, ele integrava a lista dos palestinos presos que deveriam ser liberados em troca dos prisioneiros israelenses e teve seu nome cortado da lista.

Em suma: a luta pela libertação de Barghouti precisa ganhar corpo e determinada amplitude!

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