
O Instituto João Goulart (IPG), representado por seu presidente, João Vicente Goulart, voltou a insistir junto ao Ministério da Defesa do Brasil pela retratação pública da autoridade responsável por inverdade constante na “Ordem do Dia alusiva ao 31 de Março de 1964”, lida em todos os quartéis do país, e publicada no Diário Oficial de 27 de março de 2019.
O objetivo do recurso, segundo João Vicente, filho de Jango, “é a restauração da verdade histórica sobre o episódio de 2 de abril de 1964 – a saber: a nulidade da referida sessão do Congresso Nacional e consequente inexistência de vacância do cargo de Presidente da República”.
“Meu pai estava dentro do Brasil naquele dia e foi destituído do governo por um golpe de Estado”, frisou.
Segundo João Vicente Goulart, “a Ordem do Dia lida nos quartéis não levou em conta decisão tomada pelo Congresso Nacional em 29 de novembro de 2013 e que anulou a sessão de 2 de abril de 1964”.
“A autoridade militar repete a inverdade de que o presidente João Goulart não estava no Brasil naquela data. A declaração ilegal e inverídica da vacância da Presidência da República foi usada como pretexto para os golpistas de 1964”, acrescenta.
A ação do IPG “requer a reconsideração do ato administrativo impugnado pelo Exmo. Ministro de Estado de Defesa, Sr. Fernando Azevedo e Silva, ou, nos termos do § 1o, do art. 56, da Lei 9.784/99, seu envio à autoridade hierarquicamente superior, o Exmo. Sr. Presidente da República Jair Messias Bolsonaro”.

O pedido de retratação pública refere-se ao primeiro parágrafo da Ordem do Dia que, segundo João Vicente Goulart, contém afirmações falsas sobre a presidência de João Goulart. Particularmente, sobre a alegada vacância no cargo de Presidente da República no dia 2 de abril de 1964.
A reação à primeira ação impetrada pelo IPG, que segue abaixo, foi de indeferimento sem nenhuma justificativa por parte do Ministério da Defesa.
“Ao cumprimentá-lo cordialmente, passo a tratar do requerimento de 30 de abril de 2019, encaminhado pelo Senhor, no qual solicita juízo de retratação, com expressa retificação das informações contidas no primeiro parágrafo da “Ordem do Dia alusiva ao 31 de março de 1964”, diz o Ofício no 12772/GM-MD.
“Sobre o assunto, indefiro o pleito contido no item 3 do requerimento supracitado, uma vez que não houve prática de ilegalidade por parte da Administração Pública”, conclui o Ministério da Defesa.
RECURSO CONTRA INDEFERIMENTO
O IPG entrou com um recurso administrativo indicando a completa ausência de fundamentação na afirmação de que “não houve prática de ilegalidade”.
Os interessados no restabelecimento da verdade histórica argumentaram que a recusa é “desprovida de qualquer fundamento ou justificativa que infirme as informações oficiais que embasam o Pedido de Retratação”.
Além disso, a defesa do Instituto João Goulart, constituída pela advogada Camila Gomes de Lima e pelo advogado Cezar Britto, mostrou que o indeferimento e sua justificativa “não atende ao dever constitucional de motivação dos atos administrativos e, assim, não constitui motivação válida à luz do ordenamento jurídico”.
NOVA VERSÃO
Sendo questionado pela forma lacônica com que respondeu ao primeiro recurso, o Ministério da Defesa apresentou uma nova decisão, procurando embasar a decisão anterior.
DIREITO ADMINISTRATIVO. ORDEM DO DIA ALUSIVA AO 31 DE MARÇO DE 1964. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO VISANDO À RETRATAÇÃO DA PARTE EM QUE É CITADA A DECLARAÇÃO VACÂNCIA DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA EM SESSÃO DO CONGRESSO NACIONAL DO DIA 2 DE ABRIL DE 1964. IMPROCEDÊNCIA.
- A questão não demanda a necessidade de retratação pela Administração, porque, além de não se ter descrito fato inverídico, não estamos diante de ato administrativo típico apto a ensejar juízo de autotutela por parte da Administração (art. 53 da Lei 9784/99), vez que desprovido de qualquer conteúdo ou efeito jurídico.
- Não se vislumbra afronta à Lei de Acesso à Informação (Lei no. 12.527/2011), pelo fato de que o texto questionado pelo requerente menciona acontecimento de um fato do ponto de vista histórico, não se tratando de uma informação oficial.
- Entende-se que o requerimento formulado pelo Instituto Presidente João Goulart merece ser indeferido, porquanto não houve prática de ilegalidade por parte da Administração Pública.

CONTESTAÇÃO
Ao contrário do que sustenta este último Parecer, o intenso debate sobre a declaração de vacância da Presidência da República em 1964, e a posterior declaração de nulidade pelo Congresso Nacional em 2013, ilustra a amplitude dos efeitos jurídicos que uma declaração de ente público pode ter.
Afinal, essa mesma questão foi objeto de diferentes pronunciamentos públicos ao longo da história brasileira, cada um deles com consequências das mais importantes, senão vejamos:
(i) A declaração de vacância da Presidência de República serviu de fundamento jurídico para o golpe civil militar de 1964, que constituiu um ruptura com o regime democrático com graves consequências para a história do Brasil.
(ii) A Resolução no 4 de 2013 do Congresso Nacional da República tem por objeto retificar essa declaração, corrigindo uma grande mentira que foi contada oficialmente durante muitos anos: a de que em 2 de abril de 1964 a Presidência da República se encontrava vaga, quando, em realidade o Presidente João Goulart se encontrava em território nacional.
É nítido que declaração de ente público produz efeitos jurídicos. Não é plausível sustentar que a declaração constante na Ordem do Dia teria se exaurido no momento de sua leitura nos quartéis.
A ação apresenta o requerimento para que seja realizado juízo de retratação, com expressa retificação das informações contidas no primeiro parágrafo da “Ordem do Dia alusiva ao 31 de Março de 1964”, a fim de assegurar a observância à RESOLUÇÃO No 4, DE 2013-CN (DOU No 232, sexta-feira, 29 de novembro de 2013):
Seção 1) a respeito da nulidade da “declaração de vacância da Presidência da República efetuada pelo Presidente do Congresso Nacional durante a segunda sessão conjunta de 2 de abril de 1964”.
Por fim os requerentes querem que a Ordem do Dia, devidamente retificada, seja dada igual circulação dentro das Forças Armadas e demais instituições brasileiras às quais foi destinada originalmente. Parecer jurídico do Professor Doutor Rafael Valim sustenta a petição.
Parecer Jurídico do Prof. Dr. Rafael Valim
SÉRGIO CRUZ
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