O Supremo Tribunal Federal (STF) formou, em sessão da quarta-feira (27), maioria de seis votos a favor do compartilhamento de informações sigilosas de órgãos de inteligência e controle, entre eles a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), antigo Coaf, a Receita Federal e o Banco Central, com o Ministério Público.
Votaram o relator e presidente do STF, Dias Toffoli, e os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux.
Só Dias Toffoli defendeu, de forma bastante confusa e pendular, a criação de obstáculos para o compartilhamento de dados. Em sua opinião, sem ordem judicial, somente informações genéricas – e, portanto, insuficientes – podem ser repassadas aos investigadores.
A decisão praticamente derruba a liminar que o próprio Dias Toffoli deu a Flávio Bolsonaro, filho do presidente, em julho, paralisando a investigação de seus crimes, bem como qualquer outra que tenha usado informações compartilhadas por esses órgãos.
Na ocasião, em decisão liminar (provisória) que suspendeu todos os processos do país com dados de órgãos de controle, o ministro entendeu que somente dados genéricos – e não os detalhados – poderiam ser compartilhados sem autorização judicial.
Edson Fachin acompanhou a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes no sentido de que todos os dados da Receita possam ser compartilhados com o MP sem autorização judicial. Segundo o ministro, o Supremo já entendeu que isso “não ofende o direito ao sigilo bancário”.
“Entendo viável a irrestrita remessa das informações coletadas pelo fisco, bem como a integralidade do procedimento, sendo desnecessária a prévia autorização judicial”, afirmou.
Sobre o ex-Coaf, o ministro afirmou que as informações podem ser compartilhadas, pois a UIF, órgão que substituiu o Coaf, não tem acesso a dados protegidos por sigilo bancário e fiscal.
O ministro Luís Roberto Barroso votou a favor do compartilhamento de dados da Receita com o Ministério Público. “Não há quebra de sigilo aqui. Há uma transferência de sigilo. O MP tem o dever de preservar esse sigilo, e constitui crime vazar informação”, afirmou.
Com relação à UIF, o ministro disse que o compartilhamento das informações é uma realidade mundial. “Serve para identificar crimes de diferentes naturezas e muito graves”, disse.
Barroso afirmou que, depois de liminar concedida por Toffoli suspendendo processos que continham dados detalhados compartilhados entre o MP e órgãos de controle, a UIF (antigo Coaf) reduziu o número de relatórios produzidos. Para ele, não se deve aplicar nenhuma vedação ao compartilhamento desses dados.
A ministra Rosa Weber votou a favor do uso de todos os dados da Receita pelos órgãos de investigação sem autorização judicial. A ministra afirmou que o ex-Coaf não é objeto do julgamento. “Não engloba o Coaf, atual UIF, órgão público com competência distinta e voltada a finalidades que não se confundam com as da Receita”.
Rosa Weber disse que não vê inconstitucionalidade na previsão de envio pelas autoridades fazendárias “de notícias de eventual prática de crime na forma da representação fiscal para fins penais”.
“É próprio do estado de direito que a descoberta de crimes reverbere nos órgãos de investigação para apuração de possíveis delitos. Trata-se de dever”. A ministra também entendeu que os dados da UIF podem ser compartilhados porque as comunicações não veiculam extratos bancários de correntistas.
O ministro Luiz Fux votou pelo compartilhamento total de dados da Receita e do Coaf com o Ministério Público. “Ainda que se possa extrair da Constituição direito ao sigilo, os direitos fundamentais não são absolutos a ponto de tutelar atos ilícitos. O direito não serve à proteção de iniquidades”, afirmou.
Para Fux, corrupção e lavagem de dinheiro “não combinam com qualquer tipo de sigilo”. “Os direitos à intimidade não são absolutos a ponto de tutelar atos ilícitos”, declarou ao votar.
Ainda não se formou uma maioria que defina a extensão e os limites desse compartilhamento, mas a tendência é de que seja autorizado o compartilhamento irrestrito e detalhado de dados dos suspeitos de crimes como lavagem de dinheiro, corrupção, etc.
Alexandre de Moraes já havia votado para que todos os dados da Receita, incluindo extratos bancários, possam ser compartilhados com investigadores, sem restrições. O julgamento foi interrompido no final da tarde e será retomado na sessão desta quinta-feira (28). a discussão prossegue na quinta-feira (28).
LIMINAR PAROU TODAS AS INVESTIGAÇÕES DESDE JULHO
Aproveitando-se do plantão no recesso do Poder Judiciário, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu em 15 de julho, suspender todas as investigações sobre Flávio Bolsonaro e seu ex-funcionário Fabrício Queiroz, acusados de peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, quando Flávio ainda era deputado estadual no Rio de Janeiro.
O pretexto de Toffoli para interromper as investigações e acobertar os criminosos seria que as autoridades teriam se utilizado de informações oriundas de dados produzidos por órgãos de controle como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), sem prévia autorização judicial.
Dias Toffoli tentou justificar a sua decisão de suspender investigações criminais com a seguinte argumentação. “Só não quer o controle do Judiciário quem quer Estado fascista e policialesco, que escolhe suas vítimas”, disse Toffoli.
Ele minimizou o fato de que sua decisão paralisaria todas as apurações sobre lavagem de dinheiro. “Nenhuma investigação está proibida desde que haja prévia autorização da Justiça”, argumentou Toffol à época, para alegria dos ladrões.
Já existia decisão, do próprio STF, que não considerava quebra de sigilo o compartilhamento de informações entre o Coaf, a Receita Federal e o Ministério Público. Até porque, se o Conselho de Controle de Atividades Financeiras não pudesse fazer nada com os dados suspeitos que detecta, seria um órgão inútil.
O Coaf detectou movimentações financeiras suspeitas de Queiroz e Flávio Bolsonaro que chegaram a R$ 7 milhões entre 2014 e 2017. Só na conta de Flávio Bolsonaro, foram feitos 48 depósitos em dinheiro, no total de R$ 96 mil. Todos os depósitos eram iguais: R$ 2 mil.
A investigação que envolveu o filho de Jair Bolsonaro faz parte da Operação Furna da Onça, desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro, que prendeu dez deputados estaduais. A decisão de Toffoli paralisou por meses a investigação que está sendo realizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
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