O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), afirmou que Bolsonaro atrapalha as medidas tomadas pelos governadores para combater a Covid-19 em seus estados ao incitar a população a desobedecer a quarentena.
“Isso atrapalha. Isso aumenta um debate político e gera uma conflagração no enfrentamento à doença que não era para existir. O presidente Bolsonaro tem de aprender a construir consensos em uma hora de crise. Ele só sabe enfrentar a crise criando outra crise”, disse o governador em entrevista para o jornal Folha de S. Paulo.
O governador cobrou de Bolsonaro uma atuação na crise condizente com seu cargo, o que não está acontecendo.
“O Bolsonaro está falando para os seus seguidores, ele não está falando para a população brasileira. Bolsonaro não tem sido um líder do Brasil, ele tem sido um líder dos seus seguidores. É diferente dessa função nobre que tem que exercer um presidente da República”.
“A questão do vírus tem efeito na economia, na saúde, na assistência social. Então é importante que as pessoas compreendam que temos de ter um governo federal e um presidente que coordene as nossas ações, que lidere as nossas ações, não que seja um líder de uma facção política”, prosseguiu Casagrande.
O chefe do executivo capixaba rebateu a fala de Bolsonaro de que é mais importante cuidar da economia. Segundo Casagrande, isso “é um falso dilema”.
“Você não tem de fazer uma escolha. É lógico que a primeira escolha é sempre pela vida. Duvido que alguém vai escolher a economia pela vida se a sua família ou você estiver em perigo. Esse é um debate falso”.
“O que é verdadeiro é que todos nós deveríamos estar envolvidos em um esforço único e você tem um presidente que acaba trabalhando para dividir a população”, completou.
O governador também rebateu a fala de Bolsonaro de que os governos estaduais têm que pagar indenização aos trabalhadores pela paralisação. “Quem tem de pagar é o governo federal. Ele que tem a capacidade de emitir título, de aumentar déficit, o governo federal tem o poder de fazer essa indenização ao setor produtivo”.
Para ele, Jair Bolsonaro está perdendo apoios e os panelaços são um sinal disso. “Ele tem de tomar cuidado porque o presidente, independentemente da sua posição política, tem que ter apoio político no Congresso e na sociedade”, advertiu. Pela 15ª vez, na terça-feira (31), aconteceram intensos panelaços, em várias capitais, durante o pronunciamento de Bolsonaro na TV.
Casagrande afirmou que não vai relaxar as medidas de limitação da circulação em seu estado, apesar das pressões e da ação contrária de Bolsonaro.
“Não podemos pagar para ver. Na medida em que você incentiva a atividade econômica sem um preparo para o retorno da atividade econômica, sem respeitar o tempo de barreira desse vírus, do contágio, você pode estar, no futuro muito próximo, pagando uma conta com vidas”, disse. “Você pode estar caminhando em direção a perdas de vidas no Brasil com esse tipo de atitude, como aconteceu em outros países. A Itália é um exemplo. Hoje as autoridades reconhecem o erro”, prosseguiu.
Casagrande, que fechou escolas, comércios com exceção de restaurantes até as 16h e serviços essenciais até o dia 4 de abril, declarou que tem três objetivos com essa medidas:
“O primeiro é o trabalho de educação, de consciência, para que as pessoas saibam que a gente vai ter de mudar o comportamento. A educação evita a disseminação e a transmissão do vírus. Segundo: nós estamos, nesse tempo, estudando como o vírus está se comportando no estado. Em quais regiões ele está disseminando mais. Isso permitirá que em algumas regiões nós sejamos mais flexíveis. Terceira medida é que nesse tempo, de 14 a 21 dias, a gente está contendo o tempo, barrando a disseminação do vírus para preparar leitos de UTI [unidade de terapia intensiva] e de enfermaria para suportar a onda de contágio que pode vir”.
Ele frisa que não vai colocar a “polícia para ser violenta contra nenhum empreendedor capixaba. Mas cada empreendedor tem de ter responsabilidade com aquilo que está fazendo”.
Renato Casagrande elogiou o trabalho do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, mas ressalvou que ele adaptou o discurso com o de Bolsonaro.
“Eu acho que ele adaptou o discurso, mas acho bom que ele fique. Ele tem conduzido bem [as medidas de enfrentamento], mas fez adaptação do discurso para não ficar com orientação diferente do presidente, até porque ele tinha dado toda a orientação para nós governadores do jeito que a gente tinha que se comportar”, comentou.
Casagrande relatou as necessidades do estado no combate ao coronavírus. “A gente tem de ampliar o número de testes, nosso laboratório se preparou para isso, mas está faltando kit”.
“Fora os leitos de UTI que temos hoje, estamos em uma programação para abrir 300 novos leitos de UTI para tratamento de coronavírus. Não temos respiradores para todos ainda. Por isso é importante a gente barrar a velocidade da doença para que não haja de uma vez só a chegada de gente pressionando por leitos de UTI. Nosso objetivo é salvar vidas”, destacou.