A Polícia Federal enviou para o Supremo Tribunal Federal (STF), sob ordem do Ministério da Justiça, um pedido para abrir um inquérito contra os irmãos Luis Miranda (DEM-DF), deputado federal, e Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, por “denunciação caluniosa”.
O governo Bolsonaro não quer investigar a denúncia de corrupção da compra da vacina Covaxin, mas quer investigar os denunciantes para abafar o caso.
Os dois levaram o caso até Jair Bolsonaro e mostraram os documentos que indicavam a existência de um esquema de corrupção, mas Bolsonaro não acionou a Polícia Federal para investigar. Isso configura o crime de prevaricação.
Quando os irmãos Miranda falaram publicamente do esquema que tinham descoberto dentro do Ministério da Saúde e que denunciaram para Jair Bolsonaro, a reação do governo foi falar que os dois estavam mentindo, mas até Bolsonaro admitiu que a reunião aconteceu e que ele não denunciou o caso que sobre tinha sido alertado.
O que Bolsonaro alegou depois é que falou para o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, verificar. Mas, segundo ele, Pazuello não viu nada de mais.
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, realizaram uma coletiva de imprensa para passar uma versão fantasiosa sobre os fatos e ameaçar os dois irmãos.
A contratação de 20 milhões de doses da Covaxin aconteceu tendo a Precisa Medicamentos como atravessadora. A empresa-irmã da Precisa, a Global Saúde, deu um golpe de R$ 20 milhões no Ministério da Saúde em 2018, quando o ministro era Ricardo Barros (PP-PR), atual líder do governo Bolsonaro na Câmara.
BOLSONARO INTERCEDEU
O contrato de R$ 1,6 bilhão para a compra da vacina indiana Covaxin foi fechado com estranha rapidez pelo governo de Jair Bolsonaro por um preço 50% mais alto do que o valor inicial da oferta, que era de US$ 10 por dose.
O acordo, fechado em 25 de fevereiro deste ano, prevê pagamento de US$ 15 a unidade. Segundo informações divulgadas pela Agência Estado, documentos do Ministério da Saúde mostram que o preço subiu no meio das negociações.
O governo federal priorizou a vacina indiana Covaxin, com atuação direta de Bolsonaro, que telefonou para o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, em janeiro.
Levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) mostrou que o contrato da Covaxin foi o que teve um desfecho mais rápido. Ao todo, o Ministério da Saúde levou 97 dias para fechar o acordo, enquanto o contrato com a Pfizer, por exemplo, levou 330 dias.
O pagamento do negócio só não foi efetivado porque Luis Ricardo Miranda não aceitou e denunciou o caso, que veio parar na CPI da Pandemia. Também só na semana passada o governo suspendeu o contrato.
ATESTADO DE CULPA
Para o vice-presidente da CPI da Pandemia, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o governo Bolsonaro pediu para que os irmãos Miranda sejam investigados para fazer uma “abusiva pressão” sobre os dois.
É um “atestado de culpa”, afirmou.
“A CPI já está investigando as denúncias dos Miranda. O que não pode é o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro obstruir os trabalhos da comissão e confundir os papéis de investigador e investigado”, escreveu nas redes sociais.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) questionou “por que o governo não mostra a mesma agilidade e investiga o superfaturamento da Covaxin?”.
E mais: “se foi calúnia por que o presidente nunca desmentiu?”.
VERSÃO
A tese atual do governo é que o Ministério da Saúde só recebeu os invoices, que são pré-notas fiscais internacionais, com as irregularidades no dia 22 de março. Dessa forma, seria impossível que os irmãos Miranda mostrassem o documento para Bolsonaro na reunião que tiveram no dia 20 do mesmo mês.
Entretanto, além de Luis Ricardo Miranda, o consultor do Ministério da Saúde, William Amorim Santana confirma que viu o invoice na pasta que tinha sido enviada pela empresa ao Ministério no dia 18 de março.
Quando da coletiva de imprensa para ameaçar Luis Miranda, o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, também falou que o primeiro invoice tinha sido enviado no dia 18.
Na mesma ocasião, Onyx Lorenzoni falou que tinha sido no dia 19.
O governo só mudou a versão e começou a alegar que o documento tinha sido enviado no dia 22 depois que a denúncia de prevaricação caiu sobre a cabeça de Jair Bolsonaro.