A fraude foi feita a mando de Mauro Cid, o “faz-tudo” de Bolsonaro. O ex-ajudante de ordens está preso com advogado especialista em delação premiada
Jair Bolsonaro (PL) chegou à sede da Polícia Federal, em Brasília, por volta das 13h30 desta terça-feira (16), para prestar depoimento no inquérito que investiga o esquema de adulteração de cartões de vacinação que teria beneficiado o próprio Bolsonaro, a filha dele, além de um ex-ajudante e familiares desse auxiliar. Ele havia se negado a depor quando foi convocado, mas hoje teve que falar.
No depoimento à Polícia Federal, ele voltou a dizer que nunca determinou e nem soube da inserção de dados falsos no ConecteSUS. Disse, ainda, que nem teria razão de fazer isso. Ou seja, segue mentindo.
A Polícia Federal questionou Bolsonaro sobre cada um dos personagens envolvidos na fraude para saber a relação que tinham com ele. Foi perguntado também se tinha conhecimento do esquema e se partiu dele a ordem de acesso ao sistema do Ministério da Saúde, onde os dados sobre a vacinação contra a Covid-19 foram inseridos – e depois retirados. Ele negou.
Sobre a questão da falsificação da carteira de vacinação da filha, voltou a dizer que ela tinha 12 anos quando viajou aos EUA e, na ocasião, entrou se declarando como não vacinada. Disse, também, que ela tinha laudo médico que lhe permitia não tomar a vacina.
No dia em que a operação da Polícia Federal teve início, no dia 3 de maio, Bolsonaro reafirmou que não se vacinou contra a Covid e negou adulteração nos dados do cartão dele e da filha, Laura.
O tenente-coronel Mauro Cid, que está preso, faz parte do grupo ligado a Jair Bolsonaro que inseriu informações falsas no ConecteSUS para obter vantagens ilícitas e emitir certificados de vacinação contra a Covid-19. Além de Bolsonaro e da filha, foram emitidos certificados de vacinação com dados falsos em nome de Cid, da esposa dele e das três filhas do casal.
De acordo com a PF, os dados de vacinação do ex-presidente foram incluídos no sistema do Ministério da Saúde em Duque de Caxias, mesma cidade onde Cid teria conseguido o cartão de vacinação da esposa. Uma enfermeira da prefeitura de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, confirmou à Polícia Federal (PF) que emprestou a senha para o secretário municipal de Governo de Duque de Caxias (RJ), João Carlos de Sousa Brecha, que também está preso, apagar os registros de vacinação do ex-presidente Jair Bolsonaro.
As investigações apontam que o grupo incluiu dados falsos sobre vacinação contra Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde em dezembro do ano passado. Com isso, os suspeitos conseguiram emitir certificados de vacinação para burlar restrições sanitárias, de acordo com a PF. A primeira tentativa de burlar o certificado de vacinação teria acontecido em novembro de 2021, segundo a PF. À época, o coronel Mauro Cid queria obter um documento para a esposa, Gabriela Cid, conforme o inquérito.
Cid teria pedido ajuda para Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército que integrava a equipe do coronel. Reis, então, teria acionado o sobrinho Farley Vinicius Alcântara, que é médico, para conseguir o documento. O sargento teria encaminhado para Cid um documento digitalizado de um cartão físico de vacinação, que possui o carimbo e assinatura de Farley. A dose teria sido aplicada em Cabeceiras (GO).
A PF verificou com o Ministério da Saúde que não há registros de aplicação de doses no nome da mulher de Cid na unidade de saúde do município goiano.
Para inserir os dados no ConecteSUS, Cid teria pedido ajuda para o militar Eduardo Crespo Alves. As investigações apontam que Crespo tentou fazer a operação no Rio de Janeiro, mas teve dificuldades, já que o lote que Farley havia informado no cartão de vacinação não havia sido distribuído ao estado e o sistema do SUS entendeu como “fraude”.
Para contornar o problema, Cid e Reis teriam pedido a Farley um novo cartão de vacinação, em branco, para que eles conseguissem preencher com lotes de vacinas distribuídos no Rio de Janeiro. Cid também teria acionado Ailton Gonçalves Moraes Barros para pedir ajuda e conseguir um cartão de vacinação emitido por Duque de Caxias (RJ). Ailton teria feito uma conta na plataforma “GOV.BR” no nome da esposa de Cid.
Depois, segundo a PF, os dados de vacinação foram inseridos no sistema com o intermédio do ex-vereador Marcello Moraes Siciliano. Conforme as investigações, o sistema consta que os dados da esposa de Cid foram incluídos no sistema por Camila Paulino Alves Soares. A PF descobriu também que os nomes de Mauro Cid e de suas três filhas aparecem como vacinadas em Duque de Caxias, o que causou estranheza, já que a família mora em Brasília.
Segundo a PF, os dados foram incluídos no sistema por João Carlos de Sousa Brecha, então secretário municipal de Duque de Caxias, em dezembro de 2022. A inclusão dos dados falsos sobre a vacinação do ex-presidente e pessoas ligadas a ele aconteceram em dezembro do ano passado, segundo a PF. De acordo com a PF, os dados de vacinação do ex-presidente foram incluídos no sistema do Ministério da Saúde em Duque de Caxias, mesma cidade onde Cid teria conseguido o cartão de vacinação da esposa.
Além disso, o inquérito identificou que Max Guilherme Machado de Moura e Sergio Rocha Cordeiro, nomeados seguranças de Bolsonaro em 26 de dezembro do ano passado, também aparecem no sistema do Ministério da Saúde como vacinados no mesmo local em que Bolsonaro teria vacinado, em agosto e outubro de 2022. Todos os dados teriam sido preenchidos por Brecha no dia 22 de dezembro de 2022, portanto, meses depois das supostas aplicações das vacinas.
No dia 27 de dezembro de 2022, a servidora Claudia Helena Acosta Rodrigues da Silva excluiu do sistema os dados de vacinação de Bolsonaro e da filha do ex-presidente, segundo o inquérito.