“A violência não é nova. O fato novo é que invadiram um lugar que, para nós, é tido como lugar de segurança”, denunciou Lula. Ele defendeu que as plataformas digitais sejam reguladas para impedir a disseminação do ódio, da violência e do nazismo
O presidente Lula (PT) se reuniu nesta terça-feira (18) com autoridades de todos os poderes para discutir um grande mutirão nacional de combate à violência nas escolas. Ele defendeu a regulação das redes sociais e repetiu a frase dita por Alexandre de Moraes, segundo o qual o que não pode ser tolerado no mundo real também não pode ser aceito no mundo virtual.
ENVOLVIMENTO DAS FAMÍLIAS
O presidente Lula ainda chamou atenção para a necessidade de envolvimento das famílias e das igrejas no processo educacional das crianças e adolescentes. Ele reconheceu que “estamos diante de um fato que pouco de nós conhecemos” e que ainda não há orientações claras sobre o que fazer para cessar os ataques às escolas. “
“A violência existe desde que a gente nasceu, a periferia desse país é tomada de violência todo dia e morre muita criança e menor na periferia. O fato novo é que invadiram um lugar que, para nós, é tido como lugar de segurança”, denunciou Lula.
O presidente destacou que “toda mãe quando leva o filho para uma escola ela tem certeza que o filho está seguro. Isso ruiu. Ruiu porque temos um instrumento avassalador – não é o celular que é ruim, ele é ótimo. Agora, as redes – que nós não deveríamos chamar de rede social, deveríamos chamar de rede digital; e tem a rede digital do bem e rede digital do mal. E há uma predominância da rede digital do mal. As pessoas gostam de mentira, de fake news”.
PREGAÇÃO DA VIOLÊNCIA
Lula lembrou o que aconteceu nas eleições. “É só ver como foi a última eleição nesse país, como é que foi nos Estados Unidos, como foi a eleição de 2018. Há uma predominância na tentativa de divulgar o falso, a mentira. Nós plantamos jabuticaba e não vamos colher jaca, muito menos maçã. A gente vai colher o que a gente plantou, e estamos colhendo o que a gente plantou. É só ver os discursos que são feitos por esse país afora, que há uma predominância da pregação da violência. Quantos vocês já foram ofendidos em bares e restaurantes?”, indagou.
O chefe do Executivo apontou que as big techs seguem lucrando com a violência nas redes e afirmou que não será dinheiro ou força bruta que resolverão a questão da segurança das escolas. “As plataformas, grandes empresas que ganham dinheiro com a divulgação da violência, estão cada vez mais ricas. Alguns são os empresários mais ricos do planeta Terra. E continuam divulgando qualquer mentira, não tem critério. Por isso eu resumiria essa reunião na frase do Alexandre de Moraes: as pessoas não podem fazer na rede digital aquilo que é proibido na sociedade”.
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“Não é possível que eu possa pregar o ódio na rede digital, que eu possa ficar fazendo propaganda de arma, ensinando criança a atirar. É isso que a gente vê todo santo dia. E a verdade é que uma criança de seis, sete, oito ou nove anos repercute na escola o que ouve dentro de casa”, afirmou Lula. “Então não vamos resolver esse problema só com dinheiro, elevando o muro da escola, colocando detector de metais. Fico imaginando as crianças sendo revistadas nas escolas, como seria patético para os pais, para o prefeito, para o governador, para o presidente da República e para as instituições deste país uma criança de oito anos ter que mostrar a mochila”, prosseguiu.
LIBERDADE DE EXPRESSÃO E CRETINICE
“Vou confessar uma coisa que penso já muito tempo: ou nós temos coragem de discutir a diferença entre liberdade de expressão e cretinice, ou nós não vamos chegar muito à frente. Ou nós levamos em conta a necessidade de educar os pais – porque a família tem que estar envolvida nesse processo”, argumentou Lula.
Ele criticou a desumanização que está ocorrendo no mundo. “O que nós precisamos é ter em conta que a humanidade está mudando de padrão de comportamento e que nós, como governantes, temos a responsabilidade de tentar não permitir que a sociedade deixe de ser uma sociedade dotada de humanismo, que o ódio prevaleça sobre o bem”, apontou o presidente.
“Quando uma criança acha que uma arma é a solução, uma criança de oito ou nove anos, por que ela acha? Ela viu na Bíblia? Não. Ela viu no livro escolar? Não. Ela ouviu do pai ou da mãe dentro de casa”, apontou Lula.
“E é por isso que a gente precisa ter em conta de que sem a participação dos pais a gente não recupera um processo educacional correto nas nossas escolas. Não vamos transformar nossas escolas em uma prisão de segurança máxima que não tem solução. Nem tem dinheiro para isso e nem é politicamente, humanamente, socialmente correto. Se a gente tentar fazer isso, a gente está dando a demonstração de que não servimos para muita coisa, porque nós não sabemos resolver o problema real. O problema está no processo educacional dentro da própria família”, confessou o presidente da República.
O presidente Lula também fez um apelo pelo acompanhamento da saúde mental das crianças, submetidas a um ambiente já violento e reforçado por meio de jogos de videogame. “Temos que pensar em analisar a saúde mental dessas crianças dentro da escola. Por que a criança não pode ser seguida pelos médicos quando começa a entrar na escola, para ver o comportamento dela? Temos que esperar ter um crime para poder ver isso?”, indagou.
NINGUÉM PODE FICAR DE FORA
“Essa é uma tarefa que envolve a Saúde municipal, estadual e federal, que envolve todas as polícias – e quero agradecer ao trabalho que as polícias estão fazendo junto com o nosso Ministério da Justiça. É preciso envolver todo mundo, ninguém pode ficar fora, nem o pastor mais sectário que a gente tenha tem que ficar fora desse processo. Ele tem filho e tem que educar o filho dele. Eu tenho filho, tenho netos e tenho que educar meus netos”, disse Lula.
“Nós somos os primeiros culpados, temos que pensar ‘o que eu ensino para o meu filho dentro de casa?’. Quando meu filho tem quatro anos e chora o que eu faço para ele? Eu dou logo um tablet para ele, ensino logo um joguinho. Não tem jogo, não tem ‘game’ falando de amor, de educação. É ‘game’ ensinando a molecada a matar, e cada vez muito mais mortes que na Segunda Guerra Mundial”, denunciou.
“É meu filho e o filho de cada um de vocês, é meu neto e o neto de cada um de vocês. Duvido que tenha um moleque de dez ou doze anos que não esteja habituado a passar boa parte do tempo jogando essas porcarias. E hoje a molecada joga com gente de outro país, passam noites jogando. E tudo isso resulta nessa violência no meio de crianças. Nós estamos profundamente chocados pelo que aconteceu em Blumenau, mas a gente tem que estar consciente de que isso acontece fora da escola todo dia”, disse o presidente.
Falaram também os governadores e prefeitos, além de ministros de Estado.
DINO: 225 PRISÕES EM DEZ DIAS
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse que são necessárias “campanhas que envolvam as famílias”. Ele mostrou que 225 pessoas já foram presas ou apreendidas, no caso de menores de idade, em investigações sobre ameaças de ataques em escolas, com mais de mil casos sendo investigados. “Estamos fazendo, liderando, porque a dimensão institucional pode muita cosa mas não pode tudo. Maus valores ocuparam a internet”, denunciou.
Dino falou de um “fluxo terrível de discurso de ódio”. O presidente Lula pediu que nós tivéssemos foco na internet. “Regular a internet não tem nada com limitar a liberdade de expressão”, destacou Flávio Dino. São centenas de materiais apreendidos diariamente. “Vídeos com apologia à chacinas nas escolas. Incentivo ao nazismo. Isso não é liberdade de expressão. As redes criminosas se organizam”, observou o ministro.
Ele agradeceu às polícias de todo o país e apresentou os números da campanha contra a violência nas escolas. 225 pessoas presas. Adolescentes retidos. Nos últimos dez dias. “Uma verdadeira epidemia”, disse. Mais 694 intimações de adolescentes suspeitos. 1.224 casos em investigação em todo o território nacional e 756 remoções ou suspensão de perfis em plataformas digitais.
MORAES: PALTAFORMAS LUCRAM COM VIOLÊNCIA
O presidente do Tribunal Superior eleitoral Alexandre de Moraes disse que “as Redes sociais lucram com a violência – e isso precisa cessar imediatamente”. “Precisamos de uma vez por todas determinar que o que não pode ser feito no mundo real não pode ser feito no mundo virtual”, defendeu o presidente do TSE. Alexandre de Moraes fez um pronunciamento forte condenando as redes sociais por permitirem a propagação de discurso de ódio em seus ambientes.
O Ministro da Educação, Camilo Santana anunciou a criação do grupo interministerial para discutir soluções. Ele informou que já há mais de 50 propostas de especialistas. Ele falou do canal constante de diálogo com secretários estaduais e municipais, da criação do canal de denúncia e apresentou a cartilha com orientações de segurança escolar. Ele anunciou também R$ 150 milhões para apoio às rondas escolares e R$100 milhões para guardas municipais